sexta-feira, 4 de setembro de 2009

A Carta da Terra



O texto da Carta da Terra
Criada em 18/08/2009 17:47 por mmc Marcadores: fen geral
Leia o original em: http://www.cartadaterrabrasil.org/prt/text.html
PREÂMBULO
Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro reserva, ao mesmo tempo, grande perigo e grande esperança. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio de uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos nos juntar para gerar uma sociedade sustentável global fundada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade de vida e com as futuras gerações.
TERRA, NOSSO LAR
A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, é viva como uma comunidade de vida incomparável. As forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de recuperação da comunidade de vida e o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação comum de todos os povos. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da Terra é um dever sagrado.
A SITUAÇÃO GLOBAL
Os padrões dominantes de produção e consumo estão causando devastação ambiental, esgotamento dos recursos e uma massiva extinção de espécies. Comunidades estão sendo arruinadas. Os benefícios do desenvolvimento não estão sendo divididos eqüitativamente e a diferença entre ricos e pobres está aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância e os conflitos violentos têm aumentado e são causas de grande sofrimento. O crescimento sem precedentes da população humana tem sobrecarregado os sistemas ecológico e social. As bases da segurança global estão ameaçadas. Essas tendências são perigosas, mas não inevitáveis.
DESAFIOS FUTUROS
A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida. São necessárias mudanças fundamentais em nossos valores, instituições e modos de vida. Devemos entender que, quando as necessidades básicas forem supridas, o desenvolvimento humano será primariamente voltado a ser mais e não a ter mais. Temos o conhecimento e a tecnologia necessários para abastecer a todos e reduzir nossos impactos no meio ambiente. O surgimento de uma sociedade civil global está criando novas oportunidades para construir um mundo democrático e humano. Nossos desafios ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados e juntos podemos forjar soluções inclusivas.
RESPONSABILIDADE UNIVERSAL
Para realizar estas aspirações, devemos decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificando-nos com a comunidade terrestre como um todo, bem como com nossas comunidades locais. Somos, ao mesmo tempo, cidadãos de nações diferentes e de um mundo no qual as dimensões local e global estão ligadas. Cada um compartilha responsabilidade pelo presente e pelo futuro bem-estar da família humana e de todo o mundo dos seres vivos. O espírito de solidariedade humana e de parentesco com toda a vida é fortalecido quando vivemos com reverência o mistério da existência, com gratidão pelo dom da vida e com humildade em relação ao lugar que o ser humano ocupa na natureza.
Necessitamos com urgência de uma visão compartilhada de valores básicos para proporcionar um fundamento ético à comunidade mundial emergente. Portanto, juntos na esperança, afirmamos os seguintes princípios, interdependentes, visando a um modo de vida sustentável como padrão comum, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações, empresas, governos e instituições transnacionais será dirigida e avaliada.
PRINCÍPIOS
I. RESPEITAR E CUIDAR DA COMUNIDADE DE VIDA
1. Respeitar a Terra e a vida em toda sua diversidade.
Reconhecer que todos os seres são interdependentes e cada forma de vida tem valor, independentemente de sua utilidade para os seres humanos.
Afirmar a fé na dignidade inerente de todos os seres humanos e no potencial intelectual, artístico, ético e espiritual da humanidade.
2. Cuidar da comunidade da vida com compreensão, compaixão e amor.
Aceitar que, com o direito de possuir, administrar e usar os recursos naturais, vem o dever de prevenir os danos ao meio ambiente e de proteger os direitos das pessoas.
Assumir que, com o aumento da liberdade, dos conhecimentos e do poder, vem amaior responsabilidade de promover o bem comum.
3. Construir sociedades democráticas que sejam justas, participativas, sustentáveis e pacíficas.
Assegurar que as comunidades em todos os níveis garantam os direitos humanos e as liberdades fundamentais e proporcionem a cada pessoa a oportunidade de realizar seu pleno potencial.
Promover a justiça econômica e social, propiciando a todos a obtenção de uma condição de vida significativa e segura, que seja ecologicamente responsável.
4. Assegurar a generosidade e a beleza da Terra para as atuais e às futuras gerações.
Reconhecer que a liberdade de ação de cada geração é condicionada pelas necessidades das gerações futuras.
Transmitir às futuras gerações valores, tradições e instituições que apóiem a prosperidade das comunidades humanas e ecológicas da Terra a longo prazo.
II. INTEGRIDADE ECOLÓGICA
5. Proteger e restaurar a integridade dos sistemas ecológicos da Terra, com especial atenção à diversidade biológica e aos processos naturais que sustentam a vida.
Adotar, em todos os níveis, planos e regulamentações de desenvolvimento sustentável que façam com que a conservação e a reabilitação ambiental sejam parte integral de todas as iniciativas de desenvolvimento.
stabelecer e proteger reservas naturais e da biosfera viáveis, incluindo terras selvagens e áreas marinhas, para proteger os sistemas de sustento à vida da Terra, manter a biodiversidade e preservar nossa herança natural.
Promover a recuperação de espécies e ecossistemas ameaçados.
Controlar e erradicar organismos não-nativos ou modificados geneticamente quecausem dano às espécies nativas e ao meio ambiente e impedir a introdução dessesorganismos prejudiciais.
Administrar o uso de recursos renováveis como água, solo, produtos florestais e vida marinha de forma que não excedam às taxas de regeneração e que protejam a saúde dos ecossistemas.
Administrar a extração e o uso de recursos não-renováveis, como minerais e combustíveis fósseis de forma que minimizem o esgotamento e não causem dano ambiental grave.
6. Prevenir o dano ao ambiente como o melhor método de proteção ambiental e, quando o conhecimento for limitado, assumir uma postura de precaução.
Agir para evitar a possibilidade de danos ambientais sérios ou irreversíveis, mesmo quando o conhecimento científico for incompleto ou não-conclusivo.
Impor o ônus da prova naqueles que afirmarem que a atividade proposta não causará dano significativo e fazer com que as partes interessadas sejam responsabilizadas pelo dano ambiental.
Assegurar que as tomadas de decisão considerem as conseqüências cumulativas, a longo prazo, indiretas, de longo alcance e globais das atividades humanas.
Impedir a poluição de qualquer parte do meio ambiente e não permitir o aumento de substâncias radioativas, tóxicas ou outras substâncias perigosas.
Evitar atividades militares que causem dano ao meio ambiente.
7. Adotar padrões de produção, consumo e reprodução que protejam as capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem-estar comunitário.
Reduzir, reutilizar e reciclar materiais usados nos sistemas de produção e consumo e garantir que os resíduos possam ser assimilados pelos sistemas ecológicos.
Atuar com moderação e eficiência no uso de energia e contar cada vez mais com fontes energéticas renováveis, como a energia solar e do vento.
Promover o desenvolvimento, a adoção e a transferência eqüitativa de tecnologiasambientais seguras.
Incluir totalmente os custos ambientais e sociais de bens e serviços no preço de venda e habilitar os consumidores a identificar produtos que satisfaçam às mais altas normas sociais e ambientais.
Garantir acesso universal à assistência de saúde que fomente a saúde reprodutiva e a reprodução responsável.
Adotar estilos de vida que acentuem a qualidade de vida e subsistência material num mundo finito.
8. Avançar o estudo da sustentabilidade ecológica e promover o intercâmbio aberto e aplicação ampla do conhecimento adquirido.
Apoiar a cooperação científica e técnica internacional relacionada à sustentabilidade, com especial atenção às necessidades das nações em desenvolvimento.
Reconhecer e preservar os conhecimentos tradicionais e a sabedoria espiritual em todas as culturas que contribuem para a proteção ambiental e o bem-estar humano.
Garantir que informações de vital importância para a saúde humana e para a proteção ambiental, incluindo informação genética, permaneçam disponíveis ao domínio público.
III. JUSTIÇA SOCIAL E ECONÔMICA
9. Erradicar a pobreza como um imperativo ético, social e ambiental.
Garantir o direito à água potável, ao ar puro, à segurança alimentar, aos solos não contaminados, ao abrigo e saneamento seguro, alocando os recursos nacionais e internacionais demandados.
Prover cada ser humano de educação e recursos para assegurar uma condição de vida sustentável e proporcionar seguro social e segurança coletiva aos que não são capazes de se manter por conta própria.
Reconhecer os ignorados, proteger os vulneráveis, servir àqueles que sofrem e habilitá-los a desenvolverem suas capacidades e alcançarem suas aspirações.
10. Garantir que as atividades e instituições econômicas em todos os níveis promovam o desenvolvimento humano de forma eqüitativa e sustentável.
Promover a distribuição eqüitativa da riqueza dentro das e entre as nações.
Incrementar os recursos intelectuais, financeiros, técnicos e sociais das nações em desenvolvimento e liberá-las de dívidas internacionais onerosas.
Assegurar que todas as transações comerciais apóiem o uso de recursos sustentáveis, a proteção ambiental e normas trabalhistas progressistas.
Exigir que corporações multinacionais e organizações financeiras internacionaisatuem com transparência em benefício do bem comum e responsabilizá-las pelasconseqüências de suas atividades.
11. Afirmar a igualdade e a eqüidade dos gêneros como pré-requisitos para o desenvolvimento sustentável e assegurar o acesso universal à educação, assistência de saúde e às oportunidades econômicas.
Assegurar os direitos humanos das mulheres e das meninas e acabar com toda violência contra elas.
Promover a participação ativa das mulheres em todos os aspectos da vida econômica, política, civil, social e cultural como parceiras plenas e paritárias, tomadoras de decisão, líderes e beneficiárias.
Fortalecer as famílias e garantir a segurança e o carinho de todos os membros dafamília.
12. Defender, sem discriminação, os direitos de todas as pessoas a um ambiente natural e social capaz de assegurar a dignidade humana, a saúde corporal e o bem-estar espiritual, com especial atenção aos direitos dos povos indígenas e minorias.
Eliminar a discriminação em todas as suas formas, como as baseadas em raça, cor, gênero, orientação sexual, religião, idioma e origem nacional, étnica ou social.
Afirmar o direito dos povos indígenas à sua espiritualidade, conhecimentos, terras e recursos, assim como às suas práticas relacionadas com condições de vida sustentáveis.
Honrar e apoiar os jovens das nossas comunidades, habilitando-os a cumprir seupapel essencial na criação de sociedades sustentáveis.
Proteger e restaurar lugares notáveis pelo significado cultural e espiritual.
IV. DEMOCRACIA, NÃO-VIOLÊNCIA E PAZ
13. Fortalecer as instituições democráticas em todos os níveis e prover transparência e responsabilização no exercício do governo, participação inclusiva na tomada de decisões e acesso à justiça.
Defender o direito de todas as pessoas receberem informação clara e oportuna sobre assuntos ambientais e todos os planos de desenvolvimento e atividades que possam afetá-las ou nos quais tenham interesse.
Apoiar sociedades civis locais, regionais e globais e promover a participação significativa de todos os indivíduos e organizações interessados na tomada de decisões.
Proteger os direitos à liberdade de opinião, de expressão, de reunião pacífica, de associação e de oposição.
Instituir o acesso efetivo e eficiente a procedimentos judiciais administrativos e independentes, incluindo retificação e compensação por danos ambientais e pela ameaça de tais danos.
Eliminar a corrupção em todas as instituições públicas e privadas.
Fortalecer as comunidades locais, habilitando-as a cuidar dos seus próprios ambientes, e atribuir responsabilidades ambientais aos níveis governamentais onde possam ser cumpridas mais efetivamente.
14. Integrar, na educação formal e na aprendizagem ao longo da vida, os conhecimentos, valores e habilidades necessárias para um modo de vida sustentável.
Prover a todos, especialmente a crianças e jovens, oportunidades educativas que lhes permitam contribuir ativamente para o desenvolvimento sustentável.
Promover a contribuição das artes e humanidades, assim como das ciências, na educação para sustentabilidade.
Intensificar o papel dos meios de comunicação de massa no aumento da conscientização sobre os desafios ecológicos e sociais.
Reconhecer a importância da educação moral e espiritual para uma condição de vida sustentável.
15. Tratar todos os seres vivos com respeito e consideração.
Impedir crueldades aos animais mantidos em sociedades humanas e protegê-los de sofrimento.
Proteger animais selvagens de métodos de caça, armadilhas e pesca que causem sofrimento extremo, prolongado ou evitável.
Evitar ou eliminar ao máximo possível a captura ou destruição de espécies não visadas.
16. Promover uma cultura de tolerância, não-violência e paz.
Estimular e apoiar o entendimento mútuo, a solidariedade e a cooperação entre todas as pessoas, dentro das e entre as nações.
Implementar estratégias amplas para prevenir conflitos violentos e usar a colaboração na resolução de problemas para administrar e resolver conflitos ambientais e outras disputas.
Desmilitarizar os sistemas de segurança nacional até o nível de uma postura defensiva não-provocativa e converter os recursos militares para propósitos pacíficos, incluindo restauração ecológica.
Eliminar armas nucleares, biológicas e tóxicas e outras armas de destruição emmassa.
Assegurar que o uso do espaço orbital e cósmico ajude a proteção ambiental e a paz.
Reconhecer que a paz é a plenitude criada por relações corretas consigo mesmo, com outras pessoas, outras culturas, outras vidas, com a Terra e com a totalidade maior da qual somos parte.
O CAMINHO ADIANTE
Como nunca antes na História, o destino comum nos conclama a buscar um novo começo. Tal renovação é a promessa destes princípios da Carta da Terra. Para cumprir esta promessa, temos que nos comprometer a adotar e promover os valores e objetivos da Carta.
Isto requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal. Devemos desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida sustentável nos níveis local, nacional, regional e global. Nossa diversidade cultural é uma herança preciosa e diferentes culturas encontrarão suas próprias e distintas formas de realizar esta visão. Devemos aprofundar e expandir o diálogo global que gerou a Carta da Terra, porque temos muito que aprender a partir da busca conjunta em andamento por verdade e sabedoria.
A vida muitas vezes envolve tensões entre valores importantes. Isto pode significar escolhas difíceis. Entretanto, necessitamos encontrar caminhos para harmonizar a diversidade com a unidade, o exercício da liberdade com o bem comum, objetivos de curto prazo com metas de longo prazo. Todo indivíduo, família, organização e comunidade tem um papel vital a desempenhar. As artes, as ciências, as religiões, as instituições educativas, os meios de comunicação, as empresas, as organizações não-governamentais e os governos são todos chamados a oferecer uma liderança criativa. A parceria entre governo, sociedade civil e empresas é essencial para uma governabilidade efetiva.
Para construir uma comunidade global sustentável, as nações do mundo devem renovar seu compromisso com as Nações Unidas, cumprir com suas obrigações respeitando os acordos internacionais existentes e apoiar a implementação dos princípios da Carta da Terra com um instrumento internacionalmente legalizado e contratual sobre o ambiente e o desenvolvimento. Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação dos esforços pela justiça e pela paz e a alegre celebração da vida.
Fonte: http://www.cartadaterrabrasil.org

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

RIQUEZAS e LIXO

14/08/09 - O recente lançamento do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2008, realizado pela Abrelpe – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e de Resíduos Especiais, e a devolução dos 41 contêineres com 970 toneladas de lixo inglês descobertos no Porto do Santos parecem fatos isolados, a primeira vista, mas revelam a necessidade premente de uma lei nacional que estabeleça diretrizes, premissas e políticas públicas coordenadas entre União, Estados e Municípios sobre a melhor maneira de gerenciarmos o lixo.O caso do “presente de grego” de Governo Inglês, inclusive, ensejou-me a escrever um artigo em conjunto com o Ministro Carlos Minc e o deputado Paulo Teixeira, que foi posteriormente publicado pelo jornal Folha de São Paulo (clique e confira à íntegra), cobrando medidas enérgicas para solucionar o problema e evitar que este tipo de situação volte a acontecer. Já o Panorama da Abrelpe é uma iniciativa importante, pois os dados oficiais mais recentes acerca do tratamento e destinação dos resíduos sólidos são de um levantamento do IBGE do ano 2000 (?!). Diariamente, são coletados 150 mil toneladas de resíduos sólidos urbanos (0,950 kg/habitante/dia), a um custo de R$ 6.193 bilhões/ano, sem contar outros R$ 10.643 bilhões/ano com os demais serviços de limpeza urbana. Deste total, apenas 55% é encaminhado para aterros sanitários, ou seja, aproximadamente 67 mil toneladas/dia tem destinação inadequada, principalmente em lixões a céu aberto, contaminando rios, mares, solo, o que acaba por comprometer a saúde de milhares de pessoas. São quase 265 mil empregos gerados, entre públicos e privados. Dos 5.565 municípios brasileiros, apenas 3.109 (55%) dispõem de serviços de coleta seletiva. Todavia, muitos vezes as iniciativas resumem-se na implementação de pontos de entrega voluntária à população ou na simples disponibilização aos catadores (organizados ou não em cooperativas) para execução dos serviços. Esse emaranhado de números é importante por dois motivos: primeiro, para sabermos o tamanho do problema do lixo, que já se tornou uma preocupação global, diante da certeza que os recursos naturais são finitos e há necessidade premente de reduzirmos o ritmo da degradação do meio ambiente. Segundo, para combatermos o desperdício de dinheiro e de oportunidades de negócios e serviços a partir da destinação inadequada de um lixo que poderia ser reutilizado, reduzindo custos, estimulando a eficiência energética, gerando oportunidades de emprego e renda.O lixo é um problema crônico, silencioso, que não gera prestígio, muito menos votos. Talvez, por isso, já fazem quase vinte anos que o Congresso Nacional debate, elabora, mas não consegue apresentar a sociedade uma Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Após dois anos de audiências públicas, seminários, visitas técnicas, o Grupo de Trabalho suprapartidário formado na Câmara dos Deputados, finalmente, apresentou o relatório final, trazendo as diretrizes e premissas de uma PNRS exeqüível e compatível com a realidade brasileira.A proposta em questão, a partir da contribuição dos mais diversos segmentos da sociedade, trouxe uma visão pioneira ao desmembrar o problema do lixo em oportunidades de desenvolvimento de novos negócios e produtos, incentivando processos ecoeficientes, fomentando a inserção social e estabelecendo o princípio da responsabilidade compartilhada entre administração pública, setor produtivo e a sociedade civil organizada. Ela traz conceitos até aqui inéditos, como: a análise do ciclo de vida dos produtos, a criação de um inventário nacional de resíduos, a gestão compartilhada e integrada, planos de gestão (União, Estados e Municípios) e gerenciamento (setor empresarial), a inserção de cooperativas de catadores, previsão e atenção quanto aos resíduos perigosos, bem como, as determinações quanto à proibição expressa de destinações inadequadas e a logística reversa. Agora, o desafio é colocarmos em votação e aprovarmos o quanto antes essa proposta de Política Nacional de Resíduos Sólidos, por isso, peço o apoio de todos! Esta será um referencial para os Estados e municípios estabelecerem as suas políticas com maior consciência na preservação ambiental. Assim, propiciaremos mudanças de comportamento, reduziremos a geração de lixo, aumentaremos a reciclagem e impulsionaremos a reutilização de produtos que antes pereciam por séculos, contaminando nosso meio ambiente. Já comprometemos sobremaneira o nosso meio ambiente, perdemos muito tempo, dinheiro e oportunidades para criarmos riquezas a partir do problema do lixo.
Deputado Arnaldo JardimFonte: Assessoria de Comunicação do Dep. Arnaldo Jardim

Criar riquezas
O recente lançamento do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2008, realizado pela Abrelpe – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e de Resíduos Especiais, e a devolução dos 41 contêineres com 970 toneladas de lixo inglês descobertos no Porto do Santos parecem fatos isolados, a primeira vista, mas revelam a necessidade premente de uma lei nacional que estabeleça diretrizes, premissas e políticas públicas coordenadas entre União, Estados e Municípios sobre a melhor maneira de gerenciarmos o lixo.
O caso do “presente de grego” de Governo Inglês, inclusive, ensejou-me a escrever um artigo em conjunto com o Ministro Carlos Minc e o deputado Paulo Teixeira, que foi posteriormente publicado pelo jornal Folha de São Paulo (clique e confira à íntegra), cobrando medidas enérgicas para solucionar o problema e evitar que este tipo de situação volte a acontecer.
Já o Panorama da Abrelpe é uma iniciativa importante, pois os dados oficiais mais recentes acerca do tratamento e destinação dos resíduos sólidos são de um levantamento do IBGE do ano 2000 (?!). Diariamente, são coletados 150 mil toneladas de resíduos sólidos urbanos (0,950 kg/habitante/dia), a um custo de R$ 6.193 bilhões/ano, sem contar outros R$ 10.643 bilhões/ano com os demais serviços de limpeza urbana. Deste total, apenas 55% é encaminhado para aterros sanitários, ou seja, aproximadamente 67 mil toneladas/dia tem destinação inadequada, principalmente em lixões a céu aberto, contaminando rios, mares, solo, o que acaba por comprometer a saúde de milhares de pessoas. São quase 265 mil empregos gerados, entre públicos e privados.
Dos 5.565 municípios brasileiros, apenas 3.109 (55%) dispõem de serviços de coleta seletiva. Todavia, muitos vezes as iniciativas resumem-se na implementação de pontos de entrega voluntária à população ou na simples disponibilização aos catadores (organizados ou não em cooperativas) para execução dos serviços.
Esse emaranhado de números é importante por dois motivos: primeiro, para sabermos o tamanho do problema do lixo, que já se tornou uma preocupação global, diante da certeza que os recursos naturais são finitos e há necessidade premente de reduzirmos o ritmo da degradação do meio ambiente. Segundo, para combatermos o desperdício de dinheiro e de oportunidades de negócios e serviços a partir da destinação inadequada de um lixo que poderia ser reutilizado, reduzindo custos, estimulando a eficiência energética, gerando oportunidades de emprego e renda.
O lixo é um problema crônico, silencioso, que não gera prestígio, muito menos votos. Talvez, por isso, já fazem quase vinte anos que o Congresso Nacional debate, elabora, mas não consegue apresentar a sociedade uma Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Após dois anos de audiências públicas, seminários, visitas técnicas, o Grupo de Trabalho suprapartidário formado na Câmara dos Deputados, finalmente, apresentou o relatório final, trazendo as diretrizes e premissas de uma PNRS exeqüível e compatível com a realidade brasileira.
A proposta em questão, a partir da contribuição dos mais diversos segmentos da sociedade, trouxe uma visão pioneira ao desmembrar o problema do lixo em oportunidades de desenvolvimento de novos negócios e produtos, incentivando processos ecoeficientes, fomentando a inserção social e estabelecendo o princípio da responsabilidade compartilhada entre administração pública, setor produtivo e a sociedade civil organizada.
Ela traz conceitos até aqui inéditos, como: a análise do ciclo de vida dos produtos, a criação de um inventário nacional de resíduos, a gestão compartilhada e integrada, planos de gestão (União, Estados e Municípios) e gerenciamento (setor empresarial), a inserção de cooperativas de catadores, previsão e atenção quanto aos resíduos perigosos, bem como, as determinações quanto à proibição expressa de destinações inadequadas e a logística reversa.
Agora, o desafio é colocarmos em votação e aprovarmos o quanto antes essa proposta de Política Nacional de Resíduos Sólidos, por isso, peço o apoio de todos! Esta será um referencial para os Estados e municípios estabelecerem as suas políticas com maior consciência na preservação ambiental. Assim, propiciaremos mudanças de comportamento, reduziremos a geração de lixo, aumentaremos a reciclagem e impulsionaremos a reutilização de produtos que antes pereciam por séculos, contaminando nosso meio ambiente. Já comprometemos sobremaneira o nosso meio ambiente, perdemos muito tempo, dinheiro e oportunidades para criarmos riquezas a partir do problema do lixo.

14/08/09 - O recente lançamento do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2008, realizado pela Abrelpe – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e de Resíduos Especiais, e a devolução dos 41 contêineres com 970 toneladas de lixo inglês descobertos no Porto do Santos parecem fatos isolados, a primeira vista, mas revelam a necessidade premente de uma lei nacional que estabeleça diretrizes, premissas e políticas públicas coordenadas entre União, Estados e Municípios sobre a melhor maneira de gerenciarmos o lixo.O caso do “presente de grego” de Governo Inglês, inclusive, ensejou-me a escrever um artigo em conjunto com o Ministro Carlos Minc e o deputado Paulo Teixeira, que foi posteriormente publicado pelo jornal Folha de São Paulo (clique e confira à íntegra), cobrando medidas enérgicas para solucionar o problema e evitar que este tipo de situação volte a acontecer. Já o Panorama da Abrelpe é uma iniciativa importante, pois os dados oficiais mais recentes acerca do tratamento e destinação dos resíduos sólidos são de um levantamento do IBGE do ano 2000 (?!). Diariamente, são coletados 150 mil toneladas de resíduos sólidos urbanos (0,950 kg/habitante/dia), a um custo de R$ 6.193 bilhões/ano, sem contar outros R$ 10.643 bilhões/ano com os demais serviços de limpeza urbana. Deste total, apenas 55% é encaminhado para aterros sanitários, ou seja, aproximadamente 67 mil toneladas/dia tem destinação inadequada, principalmente em lixões a céu aberto, contaminando rios, mares, solo, o que acaba por comprometer a saúde de milhares de pessoas. São quase 265 mil empregos gerados, entre públicos e privados. Dos 5.565 municípios brasileiros, apenas 3.109 (55%) dispõem de serviços de coleta seletiva. Todavia, muitos vezes as iniciativas resumem-se na implementação de pontos de entrega voluntária à população ou na simples disponibilização aos catadores (organizados ou não em cooperativas) para execução dos serviços. Esse emaranhado de números é importante por dois motivos: primeiro, para sabermos o tamanho do problema do lixo, que já se tornou uma preocupação global, diante da certeza que os recursos naturais são finitos e há necessidade premente de reduzirmos o ritmo da degradação do meio ambiente. Segundo, para combatermos o desperdício de dinheiro e de oportunidades de negócios e serviços a partir da destinação inadequada de um lixo que poderia ser reutilizado, reduzindo custos, estimulando a eficiência energética, gerando oportunidades de emprego e renda.O lixo é um problema crônico, silencioso, que não gera prestígio, muito menos votos. Talvez, por isso, já fazem quase vinte anos que o Congresso Nacional debate, elabora, mas não consegue apresentar a sociedade uma Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Após dois anos de audiências públicas, seminários, visitas técnicas, o Grupo de Trabalho suprapartidário formado na Câmara dos Deputados, finalmente, apresentou o relatório final, trazendo as diretrizes e premissas de uma PNRS exeqüível e compatível com a realidade brasileira.A proposta em questão, a partir da contribuição dos mais diversos segmentos da sociedade, trouxe uma visão pioneira ao desmembrar o problema do lixo em oportunidades de desenvolvimento de novos negócios e produtos, incentivando processos ecoeficientes, fomentando a inserção social e estabelecendo o princípio da responsabilidade compartilhada entre administração pública, setor produtivo e a sociedade civil organizada. Ela traz conceitos até aqui inéditos, como: a análise do ciclo de vida dos produtos, a criação de um inventário nacional de resíduos, a gestão compartilhada e integrada, planos de gestão (União, Estados e Municípios) e gerenciamento (setor empresarial), a inserção de cooperativas de catadores, previsão e atenção quanto aos resíduos perigosos, bem como, as determinações quanto à proibição expressa de destinações inadequadas e a logística reversa. Agora, o desafio é colocarmos em votação e aprovarmos o quanto antes essa proposta de Política Nacional de Resíduos Sólidos, por isso, peço o apoio de todos! Esta será um referencial para os Estados e municípios estabelecerem as suas políticas com maior consciência na preservação ambiental. Assim, propiciaremos mudanças de comportamento, reduziremos a geração de lixo, aumentaremos a reciclagem e impulsionaremos a reutilização de produtos que antes pereciam por séculos, contaminando nosso meio ambiente. Já comprometemos sobremaneira o nosso meio ambiente, perdemos muito tempo, dinheiro e oportunidades para criarmos riquezas a partir do problema do lixo.
Deputado Arnaldo JardimFonte: Assessoria de Comunicação do Dep. Arnaldo Jardim
Riquezas do subsolo
Santa Catarina é responsável pela produção de 63% do carvão mineral bruto brasileiro – 7,8 milhões de toneladas – e por 43% da produção nacional de carvão mineral beneficiado, 2,5 milhões de toneladas. Entre as outras riquezas minerais estão a segunda maior reserva de quartzo do Brasil e grandes ocorrências de argila cerâmica, bauxita e pedras semipreciosas. Também está em Santa Catarina uma das maiores reservas de água subterrânea potável do mundo, a reserva Botucatu.
Como garantir uma Qualidade de Vida melhor no trabalho?

O que é Qualidade de Vida?
Em latim, a palavra "qualis" queria dizer "diferença". Desde sempre, qualidade são aqueles atributos que tornam um produto diferente do outro. Mas a expressão "qualidade de vida", aplicada a seres humanos, é bem mais recente. Ela começou a aparecer há uns 30 anos.
Atualmente, os empregados estão trabalhando mais do que trabalhavam há 30 anos. As empresas reduziram seus quadros de funcionários. Onde antes havia dois ou três, hoje existe um.

Segundo a psicóloga Susan Andrews, "A glândula supra-renal, que fica em cima dos rins como um chapeuzinho, secreta os famosos hormônios do estresse - adrenalina e cortisol. O cortisol é chamado de hormônio de agressividade. Cinco minutos pensando em alguém muito chato, que você não gosta, baixa o sistema imunológico por seis horas depois”.

Para produzir cada vez mais e cada vez melhor, o funcionário precisa de duas coisas. Mais energia física e mais equilíbrio mental.

“Nem todo mundo tem possibilidade de ir para uma academia, porque tem que pegar um ônibus, andar duas horas para chegar no trabalho”, esclarece o cardiologista Edson Romano.

“Só 30 segundos de respiração diafragmática, baixa os hormônios do estresse no sangue, especialmente o cortisol. Quando você está no escritório e a situação está ficando muito pesada, coloque a mão abaixo do umbigo, inspire e exale”, aconselha a psicóloga.

Um bom ambiente de trabalho faz a diferença em cada dia.

Mas o equilíbrio físico e emocional do empregado faz a diferença na vida.
Na vida dele e na vida da empresa.
(Reportagem do Fantástico de 04/05/2008 - Emprego de A a Z: Qualidade de Vida - Max Gehringer).

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

तेच्नोलोगिया: सिएंकिया ओऊ Malçdição

Tecnologia: contra ou a favor do ser humano?(*)

Sonia de Souza

Nos sistemas tecnológicos do amanhã - rápidos. fluidos e auto-regula­dores - as máquinas lidarão com o fluxo de materiais físicos: os ho­mens com o fluxo de informação e percepção. Máquinas irão cada vez mais realizaras tarefas rotineiras; os homens, as tarefas intelectuais e criativas. As máquinas, assim como os homens, em vez de ficarem con­centradas em fábricas gigantescas e cidades industriais, estarão espalhadas através do globo, ligadas por um sistema de comunicação, impressionantemente sensível, quase instantâneo. O trabalho humano sairá da fábrica e do escritório massificado, para a comunidade e o lar.

Alvin Toffler, O choque do futuro.



S
e você ainda não leu, certamente já ouviu falar dos li­vros Admirável mundo novo (Aldous Huxley), 1984 e A revolu­ção dos bichos (George Orwell), Fahrenheit 4~1 (Ray Bradbury) e lUalden II (Burrhus E. Skinncr). Todos desaevem sociedades futu­ras dominadas pela máquina e pela tecnologia, organizadas politi­camente sob a força de regimes totalitários, em que o homem é constantemente manipulado, condicionado e dirigido a pensar, agir e sentir como um autômato, sem vontade própria e sem liberdade.

Nesses livros os autores passam uma visão extremamente pessimista de um mundo que resultou de um processo inexorável do avanço tecnológico e é comandado e administrado por entidades abstratas e dominadoras, do tipo Big Brother (Grande Irmão), às quais os homens se submetem fanaticamente, docil­mente e zelosamente. Para exemplificar, eis um pequeno trecho do livro 1984, de George Orwell (1979: 9-10):
O Ministério da Verdade - ou Miniver. em Novilíngua - era completamente dife­rente de qualquer outro objeto visível. Era uma enorme pirâmide de ativíssimo cimen­to branco, erguendo-se, terraço sobre terraco, trezentos metros sohre o solo. De onde estava Winston conseguia ler, em letras elegantes colocadas na fachada os três lemas do partido:
GUERRA É PAZ LIBERDADE É ESCRAVIDÃO IGNORÂNCIA É FOR(;A
I...1 O D1inistério do Amor era realmente atemorizante. Não tinha janela alguma. ü'inston nunca estivera lá, nem a menos de um quilômetro daquele edifício. Era um prédio impossível de entrar, exceto em função oficial, e assim mesmo atravessando um labirinto de rolos de arame farpado, portas de aço c ninhos de metralhadoras. Até as rua.s que conduziam às suas barreiras extemas eram percorridas por guardas de cara de Gorila e fardas negras, armados de porretes articulados.
Alguns filmes de ficçào científica também veiculam uma visão sombria do mundo de amanhã. A sociedade parece ter-se tornado sucata de um tempo de opulência e de riqueza proporcionadas pela tecnologia. Esta mostra-se, no futuro, falida e desbaratada, fonte de miséria, fome, dor e mazelas para o gênero huma­no. Exemplos de tais filmes são: Blade Rumner, o caçador d~ andróides: a série Mad Max; The day, after, Apocalipse now,: O ovo da serpente: 1984: entre outros.
Por outro lado, não há como negar o fascínio que a tecnologia exerce sobre o ser humano, materializada em produtos caros e sofisticados, atualmente verdadeiros símbolos do mundo moderno. Quem, hoje, não nutre um desejo secreto de possuir um telefone celular e utilizá-lo dirigindo um veículo monitorado por um computador de bordo% Quem já não ficou sem dinheíro no final de sema­na e dirigiu-se confortavelmente à cabine de um Banco 24 Noras. aproveitando também para pagar algumas contas e efetuar aplicações financeiras? Quem não se sente bem ao passar um final de semana acampando no meio do mato e sabendo que todo e qualquer recado será registrado em sua secretária eletrônica e que seus

programas prediletos na tevê estarâo gravados no videocassete? Quem pode ne­gar a sensação prazerosa de andar pelas ruas ouvindo no walkman suas músicas preferidas? Quem pode negar a economia de tempo e de Iocomoção que se ob­tém com a utilização do Jax para enviar mensagens e documentos, especialmente em situaçôes de urgência? Quem ainda nâo experimentou a praticidade de uma agenda etetrônica e de um notebook, companheiros diários dos profissionais que atuam nas mais diferentes áreas? Esses sào apenas alguns poucos exemplos de inovações tecnológicas que fazem parte do cotidiano do homem moderno ­ampliadas a cada dia pelas novas possibilidades da informática.
No entanto. é necessário registrar o incômodo eausado nos bancos, quando se tem pressa e o sistema fica fora do ar; a dificuldade causada pelos inúmeros botões do controle remoto da televisào. do videorassete e do aparelho de som nos diferentes usuários de diferentes fai.~:as etárias: o desconforto provocado pelo uso inicial do computador, geralmente acompanhado de perdas de arquivos importantes.
E, nesse cenário no qual a tecnologia ocupa o lugar de destaque, surge a seguinte questão: a tecnologia escraviza ou liberta o ser humano? Atua contra ou a favor?

Ciência, técnica e tecnologia

Ciência, técnica e tecnologia são palavras relacionadas entre si; ao se fazer referência a uma delas, inevitavelmente as demais surgem em cena.
A ciência é uma das formas de conhecimento elaboradas pelo ser huma­no para compreender racional e objetivamente o mundo com a finalidade de nele poder intervir em seu próprio benefício. \osa tomar a natureza inteligível ao apreen­der as regularidades existentes em um conjunto de fenômenos; tais regularidades são expressas posteriormente em leis e teorias que traduzem o esforço do homem em conhecer e explicar tudo o que é - ou seja, tudo o que existe natural ou necessariamente. Técnica. assim como tecnologia. provém do grego techne, que significa "arte" ou "habilidade'. Embora procedam da mesma raiz etimológica, técnica e tecnologia têm sido empregadas em sentidos diversos.

Técnica

A parte material de uma arte ou ciência. Conjunto dos processas 21e uma arte ou ciência (Diz-se em geral do aproveitamento racional e prático dos recursos naturais, e especialmente da aplicação das leis da natureza pata satisfazer as necessidades humanas) (Caldas Aulete, 1958: 4887).

Tecnologia

Tratado das artes em geral. O conjunto dos processos especiais relativos a uma determinada arte ou indústria. Explicação dos termos próprios das artes, ofícios. Linguagem especial das ciências, indústrias, artes, etc. Ciência que trata dos méto­dos e do desenvolvimento das artes industriais (CaIdas Aulete, 1958: 4887).


Na verdade, nâo há consenso sobre o significado último de técnica e tecnologia entre os diferentes autores que tratam do assunto. Assim, toma-se opor­tuno relacionar os sentidós mais usuais de tais termos. procurando verificar as relações existentes entre os componentes da tríade ciência, técnica e ternologia.
Origem da ciéncia e da técnica
A origem remota da ciência e da técnica se encontra no medo que o ser humano sentiu no seu énfre~tamento com a natureza e no desejo de poder, a fim de submetê-la e utilizá-la a seu favor.
Aos primeiros seres humanos. diante das tempestades, dos raios e trovôes. diante do temor despertado pelos animais ferozes que os rondavam, só restava buscar poder para combater o poder maior e esmagador das forças naturais. Aos poucos, as soluçòes mágicas, as soluçôes míticas e os rituais religiosos foram substituídos por conhecimentos e hahilidades utilizados na busca do poder do homem sobre a natureza. Ironicamente. na visão de Regis de Morais (1988: 49), o maior problema que hoje o homem enfrenta é `'nâo ter poder sobre seu próprio poder: o homem perdeu o controle sobre suas possibílidades".
Para Severino, a origem da técnica também resulta da intervençâo do homem na natureza. Enquanto a adaptação dos demais seres vivos à natureza resulta de um código genético previamente determinado, o ser humano cria meios e instrumentos que prolongam. agilizam e versatilizam os seus órgãos de sentidos e os membros de seu corpo, para retirar da natureza o que é necessário à sua sobrevivência. provocando também uma adaptaçâo da natu­reza a si mesmo:
Essa é a origem da técnica. pela qual os homens criam ferramentas e instrumentos mediante os quais vâcr interferir na natureza para transfortná-la em seu benefício. Ao atuarem assim sobre a natureza. os homens vào transformando-a. fazendo com que ela se adapte. até cetto ponto. às suas necessidades. Enquanto os demais seres vivos u adaptam às condiÇ«es of~recidas pela natureza, os homens. emhora necessitem da mesma forma se aclequar a eln. vào conseguindo que ela também se adapte a eles (Severino. 1992: l ~3 ).
A ciëncia precede a técnica ou a técnica conduziu ao desenvolvimento das ciências? Para Vargas (199~: 3-12), a técnica como um simples saber-fazer manual é uma atividade humana tão antiga quanto a própria linguagem, surgindo juntamente com ela "na aurora da humanidade":
A térnica é assim uma atividade humana baseada num aprendizado simbólico; i.tto se dá quando na mente do fahricante forma-se a imagem do objeto fabricado. A paleoetnologia atual vem demonstrando euidéncias claras desse processo. Por isso é que ela pode aperfeicoar-se ao longo dos anos: pois traz consigo a propriedade dos símholos lingüísticos de. associando-se entre si. denotarem situaçòes e objetos nowos a serem im·entados (Vargas. 1990: ~).
A técnica evoluiu de um estado mítico, onde os segredos do saber-fazer instrumentos eram revelados aos homens pelos deuses, até o estado artesanal, onde o mestre. pessoa individual e autor dos processos técnicos, passou a ensiná­la aos aprendizes. de geraçào a geraçào:


categoria do saber, a térnica, à categoria do fazer. I~ào no sentido de que esta se reduza a uma pura ativ·idade mecànica, mas porque constituída de um conjunto de nomias destinadas a dirigir efiazmente a açào a uma determinada Fmalidade.
Esse sentido geral da térnica é restrito às normas que possibilitam e faéilitam o domínio do homem sobre a natureza, ou seja. às térnicas de produç~ào. Aí entram, por exemplo, as térnicas agrícolas, industriais, de automaç~ào, da cibemética, etc.
Tecnologia: ~ersão elaborada da técnica
Cabe agora um exame mais detalhado do terceiro elemento da tríade, a tecnologia, tema polêmico e recente, objeto de estudo e reflexão ndo só de cien­tistas, mas de filósofos particularmente interessados no assunto.
Quando se quer ampliar os conhecimentos relativos a um determinado tema, nada mais útil do que começar verificando como os especialistas conceituam o termo em questào.
Segundo Kneller ( 1980: 245-6):
A tecnolof;ia é essencialmente uma atividade prãtiCa, a qual consiste mais em alte­rar do que em compreender o mundo. Onde a ciéncia persegue a verdade. a ternolo­gia prega a eficiéncia. Enquanto a ciéncia procura formular as leis a que a natureza ohedece, a tecnologia utiliza essas formulaçìx~s par.~ criar implementos e aparelhos quc façam a naturezv of~edecer ao homem. Tal conw a ciéncia. entretanto. a tecnolcr gia é uma entidade imensamente complexa que consiste em fenómenos de muitas espécies - agentea. instituic8es. produtos, conhecimentos, técnicas. etc. I...] Analiso­a como uma atividade historicamente em desem~olvimento para a construcào de má­quinas e outros anefatos. im~ençào de técnicas e processos. cria~ão e transformacào de materiais e organizaçào de trahalho. dc modo a satisfazer necessidades hwnanas.
Para Medeiros e Medeiros (1993: ~-S) `a tecnologia é o conhecimento utilizado na criaçào ou aperfeiçoamento de produtos e sen,iços, ou melhor, a tecnologia é o conjunto de conhecimentos, práticos ou científicos, aplicados à obtençào. distribuiçâo e comercializaçào de bens e sen,iços".
Segundo esses autores, a tecnolo~ia está presente em todos os setores da vida humana, permeando as diversas atividades humanas, com o intuito de satisfazer desejos e necessidades, substituir, aliviar ou simplificar o esfor­ço físico e mental despendidos na realizaçào das mais diferentes tarefas, bem como liberar energias para tarefas mais criativas e interessantes. No entanto, alertam para os possíveis danos resultantes do mau uso da tecnologia, como o desemprego e a destruiÇào do meio ambiente. Técnica e.tecnologia, na visâo desses autores, não sâo sinônimos, embora mantenham entre si um certo parentesco:
A técnica está as.sociada à nopo do `fazew, isto é. habilidade ou arte inata ao homem. A tecnologia une essa habilidade natural aos conhecimentos - práticos ou científicos - que foram sendo acumulados ao longo dos anos. Os estudiosos afimaam que a técnica resolve os prohlemas fundamentais do homem. A tecnologia satisfaz tamhém seus deseios le sonhos). [...] .A tecnologia possui significado próprio. Ela nào é o estudo da técnica. mas sim sua versão mais elahorada. [...J .A tecnologia não se confunde (...] com os prcxlutos que aiuda a fahricar. Ela é maís ahstrata (ou menos palpável) e incorpora a arte, a cultura, os conhecimentos e as térnicas do país que investiu' muito tempo e dinheiro para chegar a um determinado estágio de desenvol­vimento intelectual e material (Medeiros e Medeiros, 1993: 9, 12, 32 e 33).
A ciência, por sua vez, tem sido a grande aliada do desenvolvimento tecnológico:
É o conhecimento científico que está na base da fabricação de artigos mais refina­dos e no deserivolvimento de métodos e processos avançados em áreas como saúde, agricultura e transporte. [...1 A maioria dos cientistas tem os pés solidamente fincados no chào de universidades e centros de pesquisa, onde se investem bilhões de dólares na criaçào de produtos que vào ser amplamente consumidos. A tecnologia não é mais fruto de sonhos'ou delírios individuais. como bem demonstra o exemplo dos criativos
~ japoneses: resulta de políticas defmidas e de programas de trabalho muito bem-estru­turados (Ibidem: 18).
A tecnologia é hoje um produto submetido às leis do mercado e à aprova­cão de consumidores cada vez mais exigentes. É uma mercadoria especial, nem sempre disponível nas prateleiras, e sua comercialização ou transferência, muitas vezes, é fruto de demoradas negociações e transações.
Vargas (1990: 3) faz uma séria crítica à concepção da tecnologia como mercadoria que se vende e/ou se compra. A seu ver, a tecnologia é cultura que se adquire à medida que os homens evoluem:
[A tecnologial não poderá ser entendida como mercadoria que se vende ou compra, mas sim como saber que se aprende: isto é, cultura. Note-se que cultura é constituída pelo acervo de saberes, anes e aenças de um povo, quando esse acervo é subordinado à unidade de ponto de vista que o caracteri~a como tal. Assim, a ternolog'ta é cultura quando unificada a todas as outras manifestaçì~es sapienciais e anística-s de um determinado povo. Mas, quando ela é entendida como objeto ~solado de transaçòes comerciais. não pode mais ser considerada cultura.
Para Mammana (1990: 13), "hoje há uma crença generalizada de que a tecnologia é uma espécie de poçâo mágica que pode ser engarrafada e transpor­tada de um lado para outro e, quando inàlada por uma naçào subdesenvolvida, é capaz de libertar-lhe o espírito do desenvolvimento econômico ".
Segundo esse autor, tecnologia deveria nomear a ciência que estuda a técnica. Sendó a técnica arte ou ofício, tecnologia deveria ser uma das ciências antropológicas. No entanto, hoje confunde-se a ciência com o seu objeto de estudo e tal confusão "beneficia somente aqueles que fazem, como na Idade Média se fez com as indulgências, do místico intangível um comér­cio rentável" (Mammana, 1990: 14).
Na verdade, a tecnologia em si mesma não é boa nem má. 0 uso que se faz dela, no entanto, pode trazer benefícios ou prejuízos para a humanida­de. Diversos autores concordam com a concepção da técnica como um re­curso do qual os homens se utilizam para um aproveitamento mais benéfico, eficaz e eficiente da natureza para sua sobrevivência e subsistência. Sob essa óptica, a técnica é vista como uma extensão do processo de adaptaçâo do ser humano à natureza: a relação do homem com a natureza é mediada pela técnica, relaçào essa geralmente revestida de um aspecto harmonioso, graças à intervençâo positiv a ,da técnica.

No entanto, a tecnologia tem sido alvo de críticas, por ser considerada dominação inconseqüente da natureza, a setviço de interesses comerciais, indus­ttiais, militares, entre outros, muitas vezes inescrupulosos, cujos resultados podem ser prejudiciais ao homem. A esse respeito, sào muito oportunas as afirmaçòes de Buzzi e Severino. O primeiro (1987: 84-7) escreve:
A térnica é, pois, uma modalidade de verdade, a revelaçào de aspeaos escondidos da velha natureza que vivemos. Nela se manifestam os entes que nos cercam, que andam junto a nós desde sempre no escondimento.
Conseqüentemente, a técnica nào só produz uma revelaçào fantástica da nature~a. Produz também nossa maneira de morar. Produz a nossa habitação, o nosso aconche­go na tetra, a nossa compreensào da natureza.
A modemidade, porém, está mais na tecnologia que na térnica. [...)
A tecnologia é o Leviatà da modemidade. Levtatà que comanda. Quem dirige e encomenda a pesquisa científica é hoje a tecnolog'ta. Por isso, as universidades perde­ram em grande pane o senso da ciéncia. Perdeu-o também o próprio cientista, que está encarregado de pesquisar dentro de amplos programas cuja finalidade ele desco­nhece. Quer dizer, pesquisa sem ver a finalidade da pesquisa. Hà pesquisas encomen­dadas por centros de tecnologia e feitas sem que os cientistas jamais saibam de sua finalidade.
A ternologia plasmou a sociedade modema como indus~rial. I...l
O que a tecnologia vai fazer com a energia acumulada, armazenada e controlada? Vai produzir arlefatos, máguimrs e produ~os químicos que a natureza nem sequer produz. E nesta produçào está a diferenCa maior entre a técnica e a ternologia. Esta se vale da ciéncia para inspecionar e dominar a natureza, para constrangé-la a compor­tar-se segundo o programa da vontade de dominaçào.
Severino (1992: 184), ao mesmo tempo que destaca a importância do desenvolvimento da ciência e da técnica para o progresso da humanidade, adver­te para os perigos advindos da "instrumentalizacão da razâo":
E a ciéncia, que pretendia lihertar os homens dos determinismos da natureza, das doenças. da miséria. acabou se transformando numa nova fomta de opressào para os mesmos homens! A razào que construía a ciéncia. de razào libertadora, como queriam os pensadores modemos, acabou se transformando em razào instrumental que, por meio de seu controle lógico-tecnológico. implantou uma tecnocracia: toda a vida humana é coriduzida e detemtinada pelos padròes térnicos impostos pela ciéncia. E o que é pior, o poder da ciéncia e da técnica passa a ser controlado e usado por grupos humanos na defesa de seus interesses particulares. Ele se transformou num instru­mento fone e adequado para a dominação e a exploraçào políticaa? A vida das pes­soas nào é mais referida a critérios éticos e políticos. mas a critérios puramente térni­cos! 1...] Como se tudo se submetesse às regras da produçào industrial.
No que diz respeito à tríade ciência, técnica e tecnologia, é possível perce­ber três posicionamentos distintos: otimismo e entusiasmo crescentes: pessimismo sombrio; e uma atitude de moderação, que convida à utffização das três quando 0 resultado é proveitoso; e recomenda cautela e prudência, quando prejudicial ao homem e ao meio ambiente.

A ternologia é um fenômeno recente na história da humanidade. Surge a partir da primeira revoluçào industrial, ocorüda entre o final do século XVIII e início do século ~X e seu mérito reside na substituição da força fisica do homem pela energia da máquina (inicialmente pela utilização do vapor e posteriormente pela utilizapo da eletricidade) no processo de produçâo.
Tecnologiá: um salto libertador
Atualmente se presencia a ocorrência da segunda revolução industrial, apoiada em uma 'tríade revolucionária - microeletrônica, microbiologia e ener­gia nuclear" - e que tem como característica fundamental a ampliação das capa­cidades intelectuais do homem, substituídos por autômatos, além da eliminação bem-sucedida do trabalho humano na produção e nos serviços.
Segundo Adam Schaff, pensador maraista polonês, a primeira e a segunda revoluçâo industrial se assemelham no que diz respeito à ocorrência de um "salto qualitativo operado no desenvolvimento da tecnologia da produção°. No entanto, se a primeira revolução facilitou e incrementou o rendimento do trabalho huma­no, a segunda tem como finalidade a elimina~ào total desse trabalho.
Na visâo desse autor (1993: 22-3):
Isso significa, por um lado. a liberta~ào do homem da maldiçào divina do Velho Testamento, segundo a qual ele deveria ganhar o pão de cada dia com o suor do seu rosto: por outro lado. todavia. esta nova revoluçào coloca uma série de problemas sociais ligados à necessidade de se encontrar uma instituiçào que possa substituir o trabalho humano tradicional, seja como fonte de renda que permita ao homem satis­fazer suas necessidades materiais, seja como fonte tradicional de "sentido de vida', entendido como fundamental para a saàsfaçào das suas necessidades não-materiais, isto é. das suas necessidades espirituais.
Schaff companilha com outros autores a visào otimista acerca da ternologia. Embora o desemprego estrutural (perda do emprego em decorrência da automação e da robotizaÇâo da produção e dos serviços produzidas pela revoluçào da microeletrônica) seja um fenômeno inerente à efetivaçào da segunda revoluçào industrial, ela-'conduzirá a uma sociedade em que haverá um bem-estar sem precedentes para o conjunto da populaçào (incluindo as pessoas afetadas pelo desemprego estrutural) como também alcançará um nível sem precedentes do conhecimento humano do mundo" (Schaff, 1993: 1~3).
Para os otimistas, é através da tecnologia que o homem recuperará a felicidade e a soberania sobre a natureza tal como havia antes da expulsâo do Paraíso.
Enguita f 1991: 230-1) relata de uma forma extremamente bem-humorada o entusiasmo e o afà daqueles que vëem na tecnologia um recurso quase mágico para libertar o homem moderno de tudo aquilo que é desagradável, rotineiro, estressante, em especial o trabalho:

Para os moderados, a saída está no meio-tetmo, isto é, no encontro de soluções que permitam prever e minimizar as diFculdades, os problemas e os riscos próprios de tudo aquilo que é novo, em especial do que se denomina inovaçâo tecnológica.
~ Talvez não seja possível voltar a beber das águas de um rio como 0 Tietê, em virtude da poluição: no entanto, seria bastante t'azoável se os pei~:es pudessem voltar a viver em suas águas.
v Talvez nào seja possível estancar o processo de automaçâo e robotiza­Ção das indústrias e dos escritórios: no entanto, é necessário controlar a velocida­de de introdução de novas tecnologias para que o homem se adapte a essas mudanças e sejam a\,aliados criteriosamente os impactos de tais transformaçôes sobre o meio ambiente.
~ Talvez nào seja possível evitar o "desemprego estrutural", porém, pode­se pensar na redução da jornada de trabalho como altemativa para manter grande parte da população no sistema produtivo.
~ Talvez nào seja possí\'el recuperar o que se perdeu da camada de ozônio. mas é importante e necessário encontrar saídas para a eliminaçâo dos gases poluentes.
Esses sào apenas alguns esemplos de posturas assumidas pelos modera­dos diante da tecnolol;ia. Na \'erdade, nào se trata de impedir o advento da modernidade. mas de se saber em que medida aderir às maravilhas da "terceira onda" trazidas no hojo da tecnologia. responsabilidade individual e social dos homens e das diyersas instituiçòes sociais que compartilham hoje a existência de um mundo transformado pela segunda revolução industrial:
A tecnologia alimenta a engenharia. a indústria e a agricultura. c é alimentada pelas ci~ncias aplicadas e estas pclas ciéncias hásicas. nlas nào há um contato direto entre essas várias instàncias. Entre elas há o que se ¡x~de chamar de "filtros sociais". consti­tuídos ¡~or órgàos de educacào. de gerenciamento e orientacào científicos e tecnoló~i­cos. comunidades científicav e profissionais. e. tamhém. a opiniào púhlica e os gover­nos. Sào tais "filtros- que apressam ou retrasam o desem~olvimento tecnológico e julgam a com~eniW cia ou adaptahilidade das tecnologias. Enfim. sà~ esses tamhém que atuam como instânciaç éticas para julgar o perigo ou a monlidade de uma deter­minada~açào tecnológica l\'argas, 1990: 8).
Norhert ü%iener (1970: 1~9). o "pai da cihemética". embora ciente das dificuldades e emharaços que possam advir da tecnologia. deposìta confiança e esperança na lucidez humana capaz de encaminhar o desenvolvimento tecnológico de modo a heneficiar a humanidade de forma positiva e satisfatória:
A nova rwoluçào industrial é. ¡x~is. uma espada de dois gumes. I'ode ser usada para o henefício da humanidade. mas somente se a humanidade sohreviver o hastante para ingressar num perícxlo em que tal hcnefício seja ~Ossível. I'ode ser tamhém usada para destruir a humanidade. e. se nào for empreFcida inteligentemente, pcxle avançar muito nesse caminho. Há. contudo. sinais esper.tyasos no horizonte.


No reino dos chips
A revolução microeletrõnica, a revolução da microbiologia e a revoluçâo energética, denominadas `tríade revolucionária", são os componentes básicos da segunda revolução industrial. Como tudo que faz parte do mundo, apresentam efeitos positivos e negativos.
Relógios de quartzo, calculadoras de bolso (nas suas mais variadas e incrementadas versões), agendas eletrônicas, televisão em cores, televisào a cabo, toca-discos laser, os diversos utensílios domésticos (microondas. geladeira, freezer. máquinas de lavar roupa e lou~a).,jaa. noteboo~t:s. computadores (dos mais dife­rentes portes) sào produtos da revolu~ão da microeletrônica.
As conquistas espaciais, a automação das indústrias e escritórios. a utiliza­çào de robôs nas linhas de montagem (especialmente da indústria automobilísti­ca ), a moderna tecnologia militar apoiada na energia termonuclear, tamhém resul­tam do avanco da microeletrônica.
Sào inegáveis, sem dúvida, os benefícios dessas inovações tecnológicas: economia de tempo e esforço na realização de inúmeras atividades: maior produ­tividade com mais qualidade: maior conforto e bem-estar. seja no lar ou no am­biente de trabalho: indivíduos mais esclarecidos e universalmente instruídos pela abundância de informações e acúmulo de conhecimentos à disposiÇâo de todos na moderna sociedade informatizada.
Por outro lado. o mundo e a humanidade podem ser destruídos em pou­cos segundos; o aumento desconfortável do desemprego estrutural lança milhares de seres humanos a uma situaÇào de ócio forçado e não-planejado: a possibilida­de de armazenamento de informaçves nos computadores torna o indivíduo mais vulnerável e ameaÇa sua liberdade pessoal e sua privacidade: a manipulaçào de toda uma sociedade por regimes totalitários, bem como a massificação e uniformi­zaçào de padròes de conduta, capazes de romper os limites geográficos de cada nação. transformando o mundo numa imensa `aldeia global". são riscos que ame­açam cotidianamente a eaistência do homem.
A clonagem dos seres
~o limiar do século J~, a descoberta e gradual decifraçào do código genético dos seres vivos e a possibilidade de o homem interferir e dominar a natureza orgânica em geral. e inclusive o seu próprio `eu". determinou uma revo­luçâo no campo da biologia, especialmente da microbiologia. da qua) resultou a engenharia genética.
Taís avanços permitem ao homem modifìcar o código genético inato de plantas e animais, bem como desenvolver novos códigos. Tornam possível a pro­duçào de novas variedades de plantas e animais mais resistentes às doenças, mais adaptadas às condições naturais desfavoráveis e mais ricas em componentes ne­cessários à subsistência do homem.

Dessa maneira, o combate à fome e à desnutrição encontra um grande aliado no progresso da engenharia genética, que de modo bastante eficaz também pode auxiliar o homem na luta contra as doenças congênitas. Por outro lado, a revolução microbiológica pode tomar realidade os pesadelos registrados nos li­vros e filmes de ficçào científica:
Ingeréncia na personalidade humana, produção artificial de seres humanos com diversas cancterísticas `encomendadas' com antecedéncia (imaginemos, por exem­plo, a -encomenda' de seres "obedientes" a este ou àquele regime totalitário), ou também a produçào de um ceno número de indivíduos idênticos no que se refere às caraaerísticas físicas e mentais (através da utilização da térnica do clone) (Schaff, 1993: ? W .
A revoluçào energética caracteriza-se pela descobetta de novas fontes de energia, como a energia solar, a geotérmica e a energia das marés (mares e ocea­nos), bem como pela otimização das fontes tradicionais (eletricidade e petróleo) e das fontes subaproveitadas, como a energia dos ventos e a das correntes fluviais.
Na verdade, o progresso da humanidade depende em grande parte do sucesso na busca de novos recursos energéticos, em face da insuficiência e esgo­tamento dos atuais. No entanto, a energia nuclear, a despeito de seus benefícios, não deixa de ser uma constante ameaça à sobrevivência da espécie humana e do próprio globo terrestre.
Sem dúvida. nào há como negar os efeitos positivos da tecnologia, tanto quanto é preciso atentar para seus efeitos negativos:
É estranho como tantas ìnovaçi~es bem-intencionadas acarretam conseqüéncias variáveis. Por um lado. a medicina dobrou o tempo médio de vida, eliminou numero­sas doencas. aholiu muitas formas de dor e forneceu os meios de efetivo controle da natalidade. Por outro lado, ao controlar o número de mones, criou uma explosão demográfica. a qual continua porque os meios de controle da natalidade sào larga­mente ignorados. Na agricultura, a `revolução verde" possibilita a aboliçào da fome; entretanto. os alimentos nào sào distrihuídos igualmente, e muita gente está morrendo de fome. ~os transportes, na construçào e no suprimento de energia, as invenções melhoram a qualidade de vida; contudo. a produpo energética e o motor de combus­tão intema poluem o ar e a água. A energia nuclear toma possível um holocausto nuclear: mas pode fomecer energia quando se esgotarem as reservas de combustíveis fósseis. O computador ameaça convener-se no Big Brother; no entanto, ele nos ajuda a controlar complexos processos sociais. A hiologia molecular acena com a esperança de aholir as doenças e criar um suprimento permanente de alimentos, mas existe a possihilidade de que. algum dia. seja usada para criar uma elite de génios maléficos e uma multidão de seguidores embrutecidos (Futeller, 1980: 265).
Nem todo mundo vê na tecnologia a soluçâo para as dificuldades que o homem enfrenta. Dluito pelo contrário, ela tem sido apontada como a vilã da história da humanidade que caminha para um futuro sombrio, egoísta e constan­temente ameaçado pela destruição engendrada pelas próprias inovações ternológicas.
Nesse cenário pessimista, o homem aparece como a primeira vítima de sua própria criação. A tecnologia escapa ao seu controle, cai nas mãos de gru­pos minoritários, movidos por interesses particulares, que a utilizam muitas ve­zes de forma inescrupulosa para favorecer e beneficiar apenas um número res­trito de pessoas, em detrimento de uma maioria ingênua, iludida e facilmente manipulável, seduzida por uns poucos atrativos exercidos pelos produtos da moderna tecnologia.
Fala-se atualmente na cultura do ter em substituiÇão à cultura do ser, como conseqüência direta do desenvolvimento tecnológico. As necessidades essenciais dos homens sào substituídas por desejos imediatos e efêmeros, sendo o homem avaliado não mais em função do que ele é, mas em função do que tem ou possui.
Comenta-se a respeito do "vazio existencial°, como resultado da perda do sentido da vida em conseqüência da gradual extinção de um de seus mais fortes referenciais, a saber, o trabalho. Mas quem compartilha dessa visâo desalentadora acerca da tecnologia esquece, em última instância, que ela é um produto do homem e, como tal, está nas mãos de seus criadores e operadores, e nào o inverso.
Nesse sentido, podemos concordar com Regis de Morais ( 1988: 166) quando afirma que "o grande problema da civilização científico-tecnológica não é de ciên­cia nem de técnica. É um problema filosófico".
Cabe ao homem rever e reavaliar o encaminhamento do desenvolvimento tecnológico, seguindo adiante com todas as inovaçòes que lhe possam ser úteis e examinando os riscos que ameaçam despersonalizar a si mesmo e descaraaerizar o ambiente em que vive. Essa reflexâo em busca de uma humanizaçâo da ternologia deve e pode ser mediada pela filosofia, que fornecerá ao homem os subsídios necessários para o estabelecimento de um novo modus r,,ivendi diante de um processo de transformação irreversível.
Mais do que nunca a nova sociedade tecnólogica necessita de homens críticos e criativos capazes de entender e direcionar de forma responsável o pro­cesso de mudanças que ocorrem em ritmo cada vez mais acelerado:
A ternologia do amanhà requer não milhòes de homens levemente alfabetizados, prontos para trabalhar em uní.~.sono em tarefas infinitamente rtpetitivas, nem homens que recebem ordens sem piscar. con.scientes de que o pào se consegue com a submi.s­sào mecànica à autoridade, mas sim de homens que possam fazer julgamentos críti­cos, que possam abrir caminho através dos ambientes novos, que sejam rápidos na identificaçào de novos relacionamentos numa sociedade em rápida mutaçào (Toffler, 1970: 323-4).
A despeito das dificuldades que deverâo ser superadas em função da gt~adual extinção do trabalho humano, em sua fomla tradicional. e o conseqüente desemprego estrutural, é necessário perceber nesse processo uma oportunidade de um homem com mais tempo livre para investir em si mesmo, em busca de mais

conhecimento, autonotnia e criatividade, elementos imprescindíveis na reconstru­ção de uma cultura novamente embasada no ser e não mais no ter.
Quanto à automação propriamente dita, .ela representa o f m do trabalho como necessidade de sobrevivéncia. Fecha-se. assim, um ciclo hiscórico que durou dez mil anos e se irticiou com a agricultura muscular. Com o término do trabalho finda-se, também. a alienaçào dos frutos desse trabalho. Inicia-se a Civilizaçào do Lazer. Pela primeira vez. em seu todo. a humanidade vence a carência e conquista a abundància. É o pleno domínio da natureza. Doravante todos os homens - teoricamente ­podem ter acesso à reflexào, ao mundo da cultura e à plena gratificaçâo (Muraro, 1974: 63).
A humanização da ternologia se fundamenta na ação livre e responsável do homem na tomada de decisões para o redirecionamento do seu próprio futuro. Está nas mãos de cada homem em particular, e da sociedade como um todo. o destino da humanidade e a possibilidade de uma existência pacífica e hatmoniosa:
A sociedade informática proporcionar.í os pressupostos para uma vida humana mais feliz: eliminaní aquilo que tem sido a principal fonte da má qualidade de vida das massas na ordenaçào do cotidiano: a miséria ou. pelo menos. a privaçào. Ahrird possibilidades pact a plena auto-realizaçào da personalidade humana. seja liberando o homem do árduo trabalho manual e do monótono e repetitivo trahalho intelectual. seja lhe oferecendo tempo livre necessário e um imenso progresso do conhecimento disponível. suficientes para garantìr seu desenvolvimento. Desse modo. o homem receberá tudo o que constitui o fundamento de uma vida mais feliz. Todo o restante dependerá dele. de sua atividade individual e social (Schaff. 199.i: l~-t-~).
1. [Tecnologia: um risco inevitávef]
A seguir. um texto didático de George üneller, que mostra a interdependéncia entre ciëncia e tecnologia.
Hoje. ciência e tecnologia sào interdependentes. Da ciência. a tecnologia deriva conhecimentos básicos. instrumentais e técnicas. Da tecnologia a ciência' recebe instrumentos e problemas para soluçâo. A ciência e a tecnologia interatuam no domínio da ciência aplicada que é a investigaçào de problemas cujas soluções se espera sejam tecnologicamente aplicáveis.
A tecnologia expressa e desenvolve os i·alores culturais existentes. Pa­droniza até as vidas e os valores de seus usuários, como no caso do relógio. da máquina a vapor. da linha de montagem e do computador. Através de sua dinâ­mica interna. a tecnologia faz exigências aos que a desenvolvem. Para a organi­zaçào de seus maiores projetos cria burocracias. A tecnologia habilita as pessoas a fazerem coisas que elas não poderiam ter feito de outro modo. embora certas escolhas tecnológicas excluam inevitavelmente outras. (Uma sociedade que pre­feriu o automóvel particular ao transporte público terá dificuldade em voltar atrás.) I~ào obstante, a tecnologia como tal não é autônoma: ela é criada por seres humanos e está suhordinada essencialmente aos valores culturais e deci­sões govemamentais. [...]


O caminho mais sensato é almejar um progresso limitado e manter seus inevitáveis custos em nível mínimo.
Alguma inovação tecnológica é essencial e desejável. Ela tem sido neces­sária à modernização de todas as sociedades, e habilitará a nossa a sobreviver e melhorar. O desenvolvimento de novas ternologias deve ser encorajado e o trei­namento de tecnólogos imaginativos, promovido. (...]
A tecnologia não ficará sob controle social enquanto os partidos po­líticos nâo propuserem diretrizes específicas para tal. Com vistas à acelera­çâo desse processo, deverá haver o debate mais amplo possível e a difusào de informa~ões.
Toda e qualquer faculdade humana pode ser mal usada. O homem pode usar sua inteligência para escravizar um outro, sua imaginação para ludibriar, sua eloqüência para trair. Mas, se nào usasse essas faculdades, onde estaria% Usando seus poderes, o homem amplia continuamente o âmbito de suas realiza~òes. A tecnologia aumenta sua capacidade para fazê-lo.
A tecnologia pode criar ou destruir, tornar o homem mais humano ou menos. Mas as civilizaçôes. como os indivíduos, devem correr riscos se quise­rem progredir. Se exercermos prudência para minimizar os danos da tecnologia e incentivar ao máximo seus benefícios, certamente valerá a pena aceitar o risco.
I:x~a, G.F. A ciência como atir~idade humana. TraduÇào de Antonio José de Souzt. Rio de laneiro.~São Paulo: Zahar;'Edusp, 1980. p. 269-'0.
2. [Conversando com as máquinas]
Para Schaff. há necessidade de uma renovaCão da `filosofia do homem- ante os desafios da crise econômica e do desenvolvimento tecnológico. Os meios de comunicação. videotea-tos. computadores, hanco de dados, informações via satélite ou fibra óptica. etc.. estão a serviço do homem, e não o contrário.
Ao falar de influência da sociedade informática sobre o desenvolvimento da cultura, referimo-nos principalmente às novas possibilidades criadas para sua difusão.
É óbvio que o advento das novas técnicas de transmissão de informações ­que é o traço mais característico da sociedade informática - terá repercussões sobre a cultura. entendida no sentido mais amplo do terma. A invençào do rádio promoveu a cultura porque tornou possível - em especial com o advento dos transístores - chegar aos lugares mais remotos e praticamente inacessíveis. nào apenas com a difusão de notícia.s da atualidade. mas também com programaç cultu­rais de literatura. música e teatro. A televisão uouxe uma mudanÇa ainda mais profunda a esse respeito; as palavnas sâo acompanhadas de imagens, o que não apenas amplia os efeitos da palavra falada. como, além disso. permite a transmissão de outros efeitos estéticos não-verbais (obras de arte, paisagens de outros países. dança. etcJ e de novos valore.s educativos (filmes científicos, culturais. etc.).


Essas duas fontes de informação (denominadas corretamente de meios de comunicação de massa) viram-se recentemente completadas por uma invenção nova e muito surpreendente, que certamente revolucionará o ensino, em especial o autodidatismo. Refiro-me à didática propiciada pelos "autômatos falantes" que transmitem conhecimentos em diversos campos e estão programados de forma a estabelecer um "diálogo" com o estudante, fazendo-lhe perguntas e corrigindo as respostas equivocadas. [...J
Se a educação contínua há de ser um dos métodos (talvez o principal) capazes de garantir ocupações criativas às pessoas estruturalmente desemprega­das, então é fácil compreender a extraordinária importância da difusão do conhe­cimento (que constitui a base do processo social de aculturamento) por meio de novas técnicas de ensino. Atualmente, todavia, tais técnicas ainda estão no primei­ro estágio de desenvolvimento, mas já é possível intuir suas possibilidades futuras.
Apesar disso, esses professores autômatos são apenas um produto se­cundário de algo que é muito mais importante nesse campo: a tecnologia da informática. [...]
O computador é um produto do homem, portanto é parte da sua cultura. Essa tecnologia está destinada a revolucionar o processo de formação de cultura e hoje já testemunhamos o início dessa revoluçâo. O computador servirá a muitos fins: como supermemória artificial que aliviará bastante a carga de memória huma­na hoje necessária, tomando assim muito mais fácil o processo de ensino; como executor, com uma rapidez surpreendente, de operaçôes combinatórias; como idealizador de novos métodos de conhecimento humano em muitas disciplinas, incluindo aquelas que no início se acreditava estarem fechadas às técnicas informáticas (investigação histórica, jurisprudência, etc.); como fator de um pro­cesso mais ágil de aprendizado e de verificação dos conhecimentos do aluno
, também por meio do método da "conversação" com a máquina, etc.
ScruFr, Adam. A sociedade injorn~ática; as conseqüências sociais da segunda revoluçào indus­trial. Traduçào de Carlos Eduardo )ordào Machado e Luiz Arturo Obojes. 4. ed. São Paulo: Bcasiliense/Unesp, 1993. p. 72-4.
3. Do Japão
O poeta Gilberto Gil mos~tra aqui uma visào romántica da ternolog'ta.
Do Japão
quero uma câmera de filmar sonhos pra registrar nas noites de verão meu corpo astral, leve, feliz, risonho voando alto como um gavião;
que filme dentro da minha cabeça todo pensamento raro que eu mereça, toda ilusão a cores que apareça,
toda beleza de sonhar em vão.


Do Japão
quero também um trem-bala de coco pra atravessar túneis do dissabor; quero um microcomputador barroco que seja louco e desprograme a dor; visitar um templo zen-disbundista, conversar com um samurai futurista que me dê pistas sobre o sol-nascente, que me oriente sobre o novo amor.
Do Japão
quero uma gueixa que em poucos minutos da minha queixa faça uma paixão, descubra novos sentimentos brutos
e enfeiti~ada tome um avião
e a gente vá viver num oütro mundo,
pra lá do terceiro ou quano ou quinto mundo, onde a rainha seja uma açucena
e a divindade a pena do pavâo.
Gn, Gilbeno. "Do )apão.' In: Ga. Gilberto. O etenw Deus. .Nludança. Sào Yaulo: ~'EA, 1989.

PARA REFLETIR E RESPONDER
1. Comente a epígrafe do capítulo.
2. Estabeteça as possíveis relações entre ciência, técnica e tecnologia.
3. A ciência, a térnica e a tecnologia, com suas armadilhas, vão deswir o homèm~ O qüe você pensa sòbiè o tema.~ Faça uma redação a respeito. 4. Identifique em seu grupó de trabalho.a tendêncìa predominante: a fa­
vor; còntcá oti yin ressaivás ém fetàçà~'ao piog,resso ternológico: Faça uma síntese dos diferentes pontos de vista. Utílize também as idéias do capítúlo e das Leituras Complementares.
5. Discuta: "No futuro, o professor será substituído por um engenho auto­mato .
6. Homem ou computador: quem vence a partida de xadrez.? Discuta as possibilidades.
7. É possível humanizar a ternologia? EXplique.
8. Numa sociedade como a de hoje, dominada pela tecnologia e pela sofisticação dos inswmentos à disposiçâo do homem, ainda há lugar para a filosofia? Justifique sua resposta.

SUGESTÕES DE ATIVIDADES

l. A classe se divide em três grupos: o primeiro elaborará argumentos que reforçam a visão otimista em relaÇào à tecnologia; o segundo faz o mesmo em relaçàe à visào pessimísta: e o terceiro. o mesmo com a visâo moderada. O professor atuará como mediador do debate.
2. Recorte fotos de jornais e revistas e ilustre as principais idéias evpostas no texto de hneller (Leituras Complementares>.
3. Discuta com os colegas o tema: "Tecno(ogia como sinónimo de cultu­ra". L'til'sze como apoio o texto de Vargas citado ao longo do capitulo e o texto de Schaff (Leìturas Complementares ).
y. Assista ao filme Invasão de privacidade (Philip T~ovce, 1994 > e discuta-o em classe. consìderando o que foi exposto no capítulo.
~. .Analise e comente a composiçâo Do,Japàv. de Gilberto Gil.
(. Selecione em um jornal ou revista a notícia sobre algum avanço tecno­lógico. Depois. comente os benefícios e riscos dessa inovaçào.
". Em um livro lancado em 1990, ~fegateüdências 2000. os analistas norte­americanos Iohn \aisbitt e Patricia Aburdene enfocam as tendências de mudanÇa. Existe um daro tom otimista apontando para o início de uma nova conscientizaçâo em que as pessoas se preocuparào mais com a qualidade de vida. Discuta isso com seus colegas.


(*) SOUZA, Sonia Maria Ribeiro de. Um outro olhar: filosofia. São Paulo, FTD, 1995.


FACED/UFBA
Educação e Tecnologias
Contemporâneas
Prof. Menandro Ramos

Tecnologia: contra ou a favor do ser humano?(*)

Sonia de Souza

Nos sistemas tecnológicos do amanhã - rápidos. fluidos e auto-regula­dores - as máquinas lidarão com o fluxo de materiais físicos: os ho­mens com o fluxo de informação e percepção. Máquinas irão cada vez mais realizaras tarefas rotineiras; os homens, as tarefas intelectuais e criativas. As máquinas, assim como os homens, em vez de ficarem con­centradas em fábricas gigantescas e cidades industriais, estarão espalhadas através do globo, ligadas por um sistema de comunicação, impressionantemente sensível, quase instantâneo. O trabalho humano sairá da fábrica e do escritório massificado, para a comunidade e o lar.

Alvin Toffler, O choque do futuro.



S
e você ainda não leu, certamente já ouviu falar dos li­vros Admirável mundo novo (Aldous Huxley), 1984 e A revolu­ção dos bichos (George Orwell), Fahrenheit 4~1 (Ray Bradbury) e lUalden II (Burrhus E. Skinncr). Todos desaevem sociedades futu­ras dominadas pela máquina e pela tecnologia, organizadas politi­camente sob a força de regimes totalitários, em que o homem é constantemente manipulado, condicionado e dirigido a pensar, agir e sentir como um autômato, sem vontade própria e sem liberdade.

Nesses livros os autores passam uma visão extremamente pessimista de um mundo que resultou de um processo inexorável do avanço tecnológico e é comandado e administrado por entidades abstratas e dominadoras, do tipo Big Brother (Grande Irmão), às quais os homens se submetem fanaticamente, docil­mente e zelosamente. Para exemplificar, eis um pequeno trecho do livro 1984, de George Orwell (1979: 9-10):
O Ministério da Verdade - ou Miniver. em Novilíngua - era completamente dife­rente de qualquer outro objeto visível. Era uma enorme pirâmide de ativíssimo cimen­to branco, erguendo-se, terraço sobre terraco, trezentos metros sohre o solo. De onde estava Winston conseguia ler, em letras elegantes colocadas na fachada os três lemas do partido:
GUERRA É PAZ LIBERDADE É ESCRAVIDÃO IGNORÂNCIA É FOR(;A
I...1 O D1inistério do Amor era realmente atemorizante. Não tinha janela alguma. ü'inston nunca estivera lá, nem a menos de um quilômetro daquele edifício. Era um prédio impossível de entrar, exceto em função oficial, e assim mesmo atravessando um labirinto de rolos de arame farpado, portas de aço c ninhos de metralhadoras. Até as rua.s que conduziam às suas barreiras extemas eram percorridas por guardas de cara de Gorila e fardas negras, armados de porretes articulados.
Alguns filmes de ficçào científica também veiculam uma visão sombria do mundo de amanhã. A sociedade parece ter-se tornado sucata de um tempo de opulência e de riqueza proporcionadas pela tecnologia. Esta mostra-se, no futuro, falida e desbaratada, fonte de miséria, fome, dor e mazelas para o gênero huma­no. Exemplos de tais filmes são: Blade Rumner, o caçador d~ andróides: a série Mad Max; The day, after, Apocalipse now,: O ovo da serpente: 1984: entre outros.
Por outro lado, não há como negar o fascínio que a tecnologia exerce sobre o ser humano, materializada em produtos caros e sofisticados, atualmente verdadeiros símbolos do mundo moderno. Quem, hoje, não nutre um desejo secreto de possuir um telefone celular e utilizá-lo dirigindo um veículo monitorado por um computador de bordo% Quem já não ficou sem dinheíro no final de sema­na e dirigiu-se confortavelmente à cabine de um Banco 24 Noras. aproveitando também para pagar algumas contas e efetuar aplicações financeiras? Quem não se sente bem ao passar um final de semana acampando no meio do mato e sabendo que todo e qualquer recado será registrado em sua secretária eletrônica e que seus

programas prediletos na tevê estarâo gravados no videocassete? Quem pode ne­gar a sensação prazerosa de andar pelas ruas ouvindo no walkman suas músicas preferidas? Quem pode negar a economia de tempo e de Iocomoção que se ob­tém com a utilização do Jax para enviar mensagens e documentos, especialmente em situaçôes de urgência? Quem ainda nâo experimentou a praticidade de uma agenda etetrônica e de um notebook, companheiros diários dos profissionais que atuam nas mais diferentes áreas? Esses sào apenas alguns poucos exemplos de inovações tecnológicas que fazem parte do cotidiano do homem moderno ­ampliadas a cada dia pelas novas possibilidades da informática.
No entanto. é necessário registrar o incômodo eausado nos bancos, quando se tem pressa e o sistema fica fora do ar; a dificuldade causada pelos inúmeros botões do controle remoto da televisào. do videorassete e do aparelho de som nos diferentes usuários de diferentes fai.~:as etárias: o desconforto provocado pelo uso inicial do computador, geralmente acompanhado de perdas de arquivos importantes.
E, nesse cenário no qual a tecnologia ocupa o lugar de destaque, surge a seguinte questão: a tecnologia escraviza ou liberta o ser humano? Atua contra ou a favor?

Ciência, técnica e tecnologia

Ciência, técnica e tecnologia são palavras relacionadas entre si; ao se fazer referência a uma delas, inevitavelmente as demais surgem em cena.
A ciência é uma das formas de conhecimento elaboradas pelo ser huma­no para compreender racional e objetivamente o mundo com a finalidade de nele poder intervir em seu próprio benefício. \osa tomar a natureza inteligível ao apreen­der as regularidades existentes em um conjunto de fenômenos; tais regularidades são expressas posteriormente em leis e teorias que traduzem o esforço do homem em conhecer e explicar tudo o que é - ou seja, tudo o que existe natural ou necessariamente. Técnica. assim como tecnologia. provém do grego techne, que significa "arte" ou "habilidade'. Embora procedam da mesma raiz etimológica, técnica e tecnologia têm sido empregadas em sentidos diversos.

Técnica

A parte material de uma arte ou ciência. Conjunto dos processas 21e uma arte ou ciência (Diz-se em geral do aproveitamento racional e prático dos recursos naturais, e especialmente da aplicação das leis da natureza pata satisfazer as necessidades humanas) (Caldas Aulete, 1958: 4887).

Tecnologia

Tratado das artes em geral. O conjunto dos processos especiais relativos a uma determinada arte ou indústria. Explicação dos termos próprios das artes, ofícios. Linguagem especial das ciências, indústrias, artes, etc. Ciência que trata dos méto­dos e do desenvolvimento das artes industriais (CaIdas Aulete, 1958: 4887).


Na verdade, nâo há consenso sobre o significado último de técnica e tecnologia entre os diferentes autores que tratam do assunto. Assim, toma-se opor­tuno relacionar os sentidós mais usuais de tais termos. procurando verificar as relações existentes entre os componentes da tríade ciência, técnica e ternologia.
Origem da ciéncia e da técnica
A origem remota da ciência e da técnica se encontra no medo que o ser humano sentiu no seu énfre~tamento com a natureza e no desejo de poder, a fim de submetê-la e utilizá-la a seu favor.
Aos primeiros seres humanos. diante das tempestades, dos raios e trovôes. diante do temor despertado pelos animais ferozes que os rondavam, só restava buscar poder para combater o poder maior e esmagador das forças naturais. Aos poucos, as soluçòes mágicas, as soluçôes míticas e os rituais religiosos foram substituídos por conhecimentos e hahilidades utilizados na busca do poder do homem sobre a natureza. Ironicamente. na visão de Regis de Morais (1988: 49), o maior problema que hoje o homem enfrenta é `'nâo ter poder sobre seu próprio poder: o homem perdeu o controle sobre suas possibílidades".
Para Severino, a origem da técnica também resulta da intervençâo do homem na natureza. Enquanto a adaptação dos demais seres vivos à natureza resulta de um código genético previamente determinado, o ser humano cria meios e instrumentos que prolongam. agilizam e versatilizam os seus órgãos de sentidos e os membros de seu corpo, para retirar da natureza o que é necessário à sua sobrevivência. provocando também uma adaptaçâo da natu­reza a si mesmo:
Essa é a origem da técnica. pela qual os homens criam ferramentas e instrumentos mediante os quais vâcr interferir na natureza para transfortná-la em seu benefício. Ao atuarem assim sobre a natureza. os homens vào transformando-a. fazendo com que ela se adapte. até cetto ponto. às suas necessidades. Enquanto os demais seres vivos u adaptam às condiÇ«es of~recidas pela natureza, os homens. emhora necessitem da mesma forma se aclequar a eln. vào conseguindo que ela também se adapte a eles (Severino. 1992: l ~3 ).
A ciëncia precede a técnica ou a técnica conduziu ao desenvolvimento das ciências? Para Vargas (199~: 3-12), a técnica como um simples saber-fazer manual é uma atividade humana tão antiga quanto a própria linguagem, surgindo juntamente com ela "na aurora da humanidade":
A térnica é assim uma atividade humana baseada num aprendizado simbólico; i.tto se dá quando na mente do fahricante forma-se a imagem do objeto fabricado. A paleoetnologia atual vem demonstrando euidéncias claras desse processo. Por isso é que ela pode aperfeicoar-se ao longo dos anos: pois traz consigo a propriedade dos símholos lingüísticos de. associando-se entre si. denotarem situaçòes e objetos nowos a serem im·entados (Vargas. 1990: ~).
A técnica evoluiu de um estado mítico, onde os segredos do saber-fazer instrumentos eram revelados aos homens pelos deuses, até o estado artesanal, onde o mestre. pessoa individual e autor dos processos técnicos, passou a ensiná­la aos aprendizes. de geraçào a geraçào:


categoria do saber, a térnica, à categoria do fazer. I~ào no sentido de que esta se reduza a uma pura ativ·idade mecànica, mas porque constituída de um conjunto de nomias destinadas a dirigir efiazmente a açào a uma determinada Fmalidade.
Esse sentido geral da térnica é restrito às normas que possibilitam e faéilitam o domínio do homem sobre a natureza, ou seja. às térnicas de produç~ào. Aí entram, por exemplo, as térnicas agrícolas, industriais, de automaç~ào, da cibemética, etc.
Tecnologia: ~ersão elaborada da técnica
Cabe agora um exame mais detalhado do terceiro elemento da tríade, a tecnologia, tema polêmico e recente, objeto de estudo e reflexão ndo só de cien­tistas, mas de filósofos particularmente interessados no assunto.
Quando se quer ampliar os conhecimentos relativos a um determinado tema, nada mais útil do que começar verificando como os especialistas conceituam o termo em questào.
Segundo Kneller ( 1980: 245-6):
A tecnolof;ia é essencialmente uma atividade prãtiCa, a qual consiste mais em alte­rar do que em compreender o mundo. Onde a ciéncia persegue a verdade. a ternolo­gia prega a eficiéncia. Enquanto a ciéncia procura formular as leis a que a natureza ohedece, a tecnologia utiliza essas formulaçìx~s par.~ criar implementos e aparelhos quc façam a naturezv of~edecer ao homem. Tal conw a ciéncia. entretanto. a tecnolcr gia é uma entidade imensamente complexa que consiste em fenómenos de muitas espécies - agentea. instituic8es. produtos, conhecimentos, técnicas. etc. I...] Analiso­a como uma atividade historicamente em desem~olvimento para a construcào de má­quinas e outros anefatos. im~ençào de técnicas e processos. cria~ão e transformacào de materiais e organizaçào de trahalho. dc modo a satisfazer necessidades hwnanas.
Para Medeiros e Medeiros (1993: ~-S) `a tecnologia é o conhecimento utilizado na criaçào ou aperfeiçoamento de produtos e sen,iços, ou melhor, a tecnologia é o conjunto de conhecimentos, práticos ou científicos, aplicados à obtençào. distribuiçâo e comercializaçào de bens e sen,iços".
Segundo esses autores, a tecnolo~ia está presente em todos os setores da vida humana, permeando as diversas atividades humanas, com o intuito de satisfazer desejos e necessidades, substituir, aliviar ou simplificar o esfor­ço físico e mental despendidos na realizaçào das mais diferentes tarefas, bem como liberar energias para tarefas mais criativas e interessantes. No entanto, alertam para os possíveis danos resultantes do mau uso da tecnologia, como o desemprego e a destruiÇào do meio ambiente. Técnica e.tecnologia, na visâo desses autores, não sâo sinônimos, embora mantenham entre si um certo parentesco:
A técnica está as.sociada à nopo do `fazew, isto é. habilidade ou arte inata ao homem. A tecnologia une essa habilidade natural aos conhecimentos - práticos ou científicos - que foram sendo acumulados ao longo dos anos. Os estudiosos afimaam que a técnica resolve os prohlemas fundamentais do homem. A tecnologia satisfaz tamhém seus deseios le sonhos). [...] .A tecnologia possui significado próprio. Ela nào é o estudo da técnica. mas sim sua versão mais elahorada. [...J .A tecnologia não se confunde (...] com os prcxlutos que aiuda a fahricar. Ela é maís ahstrata (ou menos palpável) e incorpora a arte, a cultura, os conhecimentos e as térnicas do país que investiu' muito tempo e dinheiro para chegar a um determinado estágio de desenvol­vimento intelectual e material (Medeiros e Medeiros, 1993: 9, 12, 32 e 33).
A ciência, por sua vez, tem sido a grande aliada do desenvolvimento tecnológico:
É o conhecimento científico que está na base da fabricação de artigos mais refina­dos e no deserivolvimento de métodos e processos avançados em áreas como saúde, agricultura e transporte. [...1 A maioria dos cientistas tem os pés solidamente fincados no chào de universidades e centros de pesquisa, onde se investem bilhões de dólares na criaçào de produtos que vào ser amplamente consumidos. A tecnologia não é mais fruto de sonhos'ou delírios individuais. como bem demonstra o exemplo dos criativos
~ japoneses: resulta de políticas defmidas e de programas de trabalho muito bem-estru­turados (Ibidem: 18).
A tecnologia é hoje um produto submetido às leis do mercado e à aprova­cão de consumidores cada vez mais exigentes. É uma mercadoria especial, nem sempre disponível nas prateleiras, e sua comercialização ou transferência, muitas vezes, é fruto de demoradas negociações e transações.
Vargas (1990: 3) faz uma séria crítica à concepção da tecnologia como mercadoria que se vende e/ou se compra. A seu ver, a tecnologia é cultura que se adquire à medida que os homens evoluem:
[A tecnologial não poderá ser entendida como mercadoria que se vende ou compra, mas sim como saber que se aprende: isto é, cultura. Note-se que cultura é constituída pelo acervo de saberes, anes e aenças de um povo, quando esse acervo é subordinado à unidade de ponto de vista que o caracteri~a como tal. Assim, a ternolog'ta é cultura quando unificada a todas as outras manifestaçì~es sapienciais e anística-s de um determinado povo. Mas, quando ela é entendida como objeto ~solado de transaçòes comerciais. não pode mais ser considerada cultura.
Para Mammana (1990: 13), "hoje há uma crença generalizada de que a tecnologia é uma espécie de poçâo mágica que pode ser engarrafada e transpor­tada de um lado para outro e, quando inàlada por uma naçào subdesenvolvida, é capaz de libertar-lhe o espírito do desenvolvimento econômico ".
Segundo esse autor, tecnologia deveria nomear a ciência que estuda a técnica. Sendó a técnica arte ou ofício, tecnologia deveria ser uma das ciências antropológicas. No entanto, hoje confunde-se a ciência com o seu objeto de estudo e tal confusão "beneficia somente aqueles que fazem, como na Idade Média se fez com as indulgências, do místico intangível um comér­cio rentável" (Mammana, 1990: 14).
Na verdade, a tecnologia em si mesma não é boa nem má. 0 uso que se faz dela, no entanto, pode trazer benefícios ou prejuízos para a humanida­de. Diversos autores concordam com a concepção da técnica como um re­curso do qual os homens se utilizam para um aproveitamento mais benéfico, eficaz e eficiente da natureza para sua sobrevivência e subsistência. Sob essa óptica, a técnica é vista como uma extensão do processo de adaptaçâo do ser humano à natureza: a relação do homem com a natureza é mediada pela técnica, relaçào essa geralmente revestida de um aspecto harmonioso, graças à intervençâo positiv a ,da técnica.

No entanto, a tecnologia tem sido alvo de críticas, por ser considerada dominação inconseqüente da natureza, a setviço de interesses comerciais, indus­ttiais, militares, entre outros, muitas vezes inescrupulosos, cujos resultados podem ser prejudiciais ao homem. A esse respeito, sào muito oportunas as afirmaçòes de Buzzi e Severino. O primeiro (1987: 84-7) escreve:
A térnica é, pois, uma modalidade de verdade, a revelaçào de aspeaos escondidos da velha natureza que vivemos. Nela se manifestam os entes que nos cercam, que andam junto a nós desde sempre no escondimento.
Conseqüentemente, a técnica nào só produz uma revelaçào fantástica da nature~a. Produz também nossa maneira de morar. Produz a nossa habitação, o nosso aconche­go na tetra, a nossa compreensào da natureza.
A modemidade, porém, está mais na tecnologia que na térnica. [...)
A tecnologia é o Leviatà da modemidade. Levtatà que comanda. Quem dirige e encomenda a pesquisa científica é hoje a tecnolog'ta. Por isso, as universidades perde­ram em grande pane o senso da ciéncia. Perdeu-o também o próprio cientista, que está encarregado de pesquisar dentro de amplos programas cuja finalidade ele desco­nhece. Quer dizer, pesquisa sem ver a finalidade da pesquisa. Hà pesquisas encomen­dadas por centros de tecnologia e feitas sem que os cientistas jamais saibam de sua finalidade.
A ternologia plasmou a sociedade modema como indus~rial. I...l
O que a tecnologia vai fazer com a energia acumulada, armazenada e controlada? Vai produzir arlefatos, máguimrs e produ~os químicos que a natureza nem sequer produz. E nesta produçào está a diferenCa maior entre a técnica e a ternologia. Esta se vale da ciéncia para inspecionar e dominar a natureza, para constrangé-la a compor­tar-se segundo o programa da vontade de dominaçào.
Severino (1992: 184), ao mesmo tempo que destaca a importância do desenvolvimento da ciência e da técnica para o progresso da humanidade, adver­te para os perigos advindos da "instrumentalizacão da razâo":
E a ciéncia, que pretendia lihertar os homens dos determinismos da natureza, das doenças. da miséria. acabou se transformando numa nova fomta de opressào para os mesmos homens! A razào que construía a ciéncia. de razào libertadora, como queriam os pensadores modemos, acabou se transformando em razào instrumental que, por meio de seu controle lógico-tecnológico. implantou uma tecnocracia: toda a vida humana é coriduzida e detemtinada pelos padròes térnicos impostos pela ciéncia. E o que é pior, o poder da ciéncia e da técnica passa a ser controlado e usado por grupos humanos na defesa de seus interesses particulares. Ele se transformou num instru­mento fone e adequado para a dominação e a exploraçào políticaa? A vida das pes­soas nào é mais referida a critérios éticos e políticos. mas a critérios puramente térni­cos! 1...] Como se tudo se submetesse às regras da produçào industrial.
No que diz respeito à tríade ciência, técnica e tecnologia, é possível perce­ber três posicionamentos distintos: otimismo e entusiasmo crescentes: pessimismo sombrio; e uma atitude de moderação, que convida à utffização das três quando 0 resultado é proveitoso; e recomenda cautela e prudência, quando prejudicial ao homem e ao meio ambiente.

A ternologia é um fenômeno recente na história da humanidade. Surge a partir da primeira revoluçào industrial, ocorüda entre o final do século XVIII e início do século ~X e seu mérito reside na substituição da força fisica do homem pela energia da máquina (inicialmente pela utilização do vapor e posteriormente pela utilizapo da eletricidade) no processo de produçâo.
Tecnologiá: um salto libertador
Atualmente se presencia a ocorrência da segunda revolução industrial, apoiada em uma 'tríade revolucionária - microeletrônica, microbiologia e ener­gia nuclear" - e que tem como característica fundamental a ampliação das capa­cidades intelectuais do homem, substituídos por autômatos, além da eliminação bem-sucedida do trabalho humano na produção e nos serviços.
Segundo Adam Schaff, pensador maraista polonês, a primeira e a segunda revoluçâo industrial se assemelham no que diz respeito à ocorrência de um "salto qualitativo operado no desenvolvimento da tecnologia da produção°. No entanto, se a primeira revolução facilitou e incrementou o rendimento do trabalho huma­no, a segunda tem como finalidade a elimina~ào total desse trabalho.
Na visâo desse autor (1993: 22-3):
Isso significa, por um lado. a liberta~ào do homem da maldiçào divina do Velho Testamento, segundo a qual ele deveria ganhar o pão de cada dia com o suor do seu rosto: por outro lado. todavia. esta nova revoluçào coloca uma série de problemas sociais ligados à necessidade de se encontrar uma instituiçào que possa substituir o trabalho humano tradicional, seja como fonte de renda que permita ao homem satis­fazer suas necessidades materiais, seja como fonte tradicional de "sentido de vida', entendido como fundamental para a saàsfaçào das suas necessidades não-materiais, isto é. das suas necessidades espirituais.
Schaff companilha com outros autores a visào otimista acerca da ternologia. Embora o desemprego estrutural (perda do emprego em decorrência da automação e da robotizaÇâo da produção e dos serviços produzidas pela revoluçào da microeletrônica) seja um fenômeno inerente à efetivaçào da segunda revoluçào industrial, ela-'conduzirá a uma sociedade em que haverá um bem-estar sem precedentes para o conjunto da populaçào (incluindo as pessoas afetadas pelo desemprego estrutural) como também alcançará um nível sem precedentes do conhecimento humano do mundo" (Schaff, 1993: 1~3).
Para os otimistas, é através da tecnologia que o homem recuperará a felicidade e a soberania sobre a natureza tal como havia antes da expulsâo do Paraíso.
Enguita f 1991: 230-1) relata de uma forma extremamente bem-humorada o entusiasmo e o afà daqueles que vëem na tecnologia um recurso quase mágico para libertar o homem moderno de tudo aquilo que é desagradável, rotineiro, estressante, em especial o trabalho:

Para os moderados, a saída está no meio-tetmo, isto é, no encontro de soluções que permitam prever e minimizar as diFculdades, os problemas e os riscos próprios de tudo aquilo que é novo, em especial do que se denomina inovaçâo tecnológica.
~ Talvez não seja possível voltar a beber das águas de um rio como 0 Tietê, em virtude da poluição: no entanto, seria bastante t'azoável se os pei~:es pudessem voltar a viver em suas águas.
v Talvez nào seja possível estancar o processo de automaçâo e robotiza­Ção das indústrias e dos escritórios: no entanto, é necessário controlar a velocida­de de introdução de novas tecnologias para que o homem se adapte a essas mudanças e sejam a\,aliados criteriosamente os impactos de tais transformaçôes sobre o meio ambiente.
~ Talvez nào seja possível evitar o "desemprego estrutural", porém, pode­se pensar na redução da jornada de trabalho como altemativa para manter grande parte da população no sistema produtivo.
~ Talvez nào seja possí\'el recuperar o que se perdeu da camada de ozônio. mas é importante e necessário encontrar saídas para a eliminaçâo dos gases poluentes.
Esses sào apenas alguns esemplos de posturas assumidas pelos modera­dos diante da tecnolol;ia. Na \'erdade, nào se trata de impedir o advento da modernidade. mas de se saber em que medida aderir às maravilhas da "terceira onda" trazidas no hojo da tecnologia. responsabilidade individual e social dos homens e das diyersas instituiçòes sociais que compartilham hoje a existência de um mundo transformado pela segunda revolução industrial:
A tecnologia alimenta a engenharia. a indústria e a agricultura. c é alimentada pelas ci~ncias aplicadas e estas pclas ciéncias hásicas. nlas nào há um contato direto entre essas várias instàncias. Entre elas há o que se ¡x~de chamar de "filtros sociais". consti­tuídos ¡~or órgàos de educacào. de gerenciamento e orientacào científicos e tecnoló~i­cos. comunidades científicav e profissionais. e. tamhém. a opiniào púhlica e os gover­nos. Sào tais "filtros- que apressam ou retrasam o desem~olvimento tecnológico e julgam a com~eniW cia ou adaptahilidade das tecnologias. Enfim. sà~ esses tamhém que atuam como instânciaç éticas para julgar o perigo ou a monlidade de uma deter­minada~açào tecnológica l\'argas, 1990: 8).
Norhert ü%iener (1970: 1~9). o "pai da cihemética". embora ciente das dificuldades e emharaços que possam advir da tecnologia. deposìta confiança e esperança na lucidez humana capaz de encaminhar o desenvolvimento tecnológico de modo a heneficiar a humanidade de forma positiva e satisfatória:
A nova rwoluçào industrial é. ¡x~is. uma espada de dois gumes. I'ode ser usada para o henefício da humanidade. mas somente se a humanidade sohreviver o hastante para ingressar num perícxlo em que tal hcnefício seja ~Ossível. I'ode ser tamhém usada para destruir a humanidade. e. se nào for empreFcida inteligentemente, pcxle avançar muito nesse caminho. Há. contudo. sinais esper.tyasos no horizonte.


No reino dos chips
A revolução microeletrõnica, a revolução da microbiologia e a revoluçâo energética, denominadas `tríade revolucionária", são os componentes básicos da segunda revolução industrial. Como tudo que faz parte do mundo, apresentam efeitos positivos e negativos.
Relógios de quartzo, calculadoras de bolso (nas suas mais variadas e incrementadas versões), agendas eletrônicas, televisão em cores, televisào a cabo, toca-discos laser, os diversos utensílios domésticos (microondas. geladeira, freezer. máquinas de lavar roupa e lou~a).,jaa. noteboo~t:s. computadores (dos mais dife­rentes portes) sào produtos da revolu~ão da microeletrônica.
As conquistas espaciais, a automação das indústrias e escritórios. a utiliza­çào de robôs nas linhas de montagem (especialmente da indústria automobilísti­ca ), a moderna tecnologia militar apoiada na energia termonuclear, tamhém resul­tam do avanco da microeletrônica.
Sào inegáveis, sem dúvida, os benefícios dessas inovações tecnológicas: economia de tempo e esforço na realização de inúmeras atividades: maior produ­tividade com mais qualidade: maior conforto e bem-estar. seja no lar ou no am­biente de trabalho: indivíduos mais esclarecidos e universalmente instruídos pela abundância de informações e acúmulo de conhecimentos à disposiÇâo de todos na moderna sociedade informatizada.
Por outro lado. o mundo e a humanidade podem ser destruídos em pou­cos segundos; o aumento desconfortável do desemprego estrutural lança milhares de seres humanos a uma situaÇào de ócio forçado e não-planejado: a possibilida­de de armazenamento de informaçves nos computadores torna o indivíduo mais vulnerável e ameaÇa sua liberdade pessoal e sua privacidade: a manipulaçào de toda uma sociedade por regimes totalitários, bem como a massificação e uniformi­zaçào de padròes de conduta, capazes de romper os limites geográficos de cada nação. transformando o mundo numa imensa `aldeia global". são riscos que ame­açam cotidianamente a eaistência do homem.
A clonagem dos seres
~o limiar do século J~, a descoberta e gradual decifraçào do código genético dos seres vivos e a possibilidade de o homem interferir e dominar a natureza orgânica em geral. e inclusive o seu próprio `eu". determinou uma revo­luçâo no campo da biologia, especialmente da microbiologia. da qua) resultou a engenharia genética.
Taís avanços permitem ao homem modifìcar o código genético inato de plantas e animais, bem como desenvolver novos códigos. Tornam possível a pro­duçào de novas variedades de plantas e animais mais resistentes às doenças, mais adaptadas às condições naturais desfavoráveis e mais ricas em componentes ne­cessários à subsistência do homem.

Dessa maneira, o combate à fome e à desnutrição encontra um grande aliado no progresso da engenharia genética, que de modo bastante eficaz também pode auxiliar o homem na luta contra as doenças congênitas. Por outro lado, a revolução microbiológica pode tomar realidade os pesadelos registrados nos li­vros e filmes de ficçào científica:
Ingeréncia na personalidade humana, produção artificial de seres humanos com diversas cancterísticas `encomendadas' com antecedéncia (imaginemos, por exem­plo, a -encomenda' de seres "obedientes" a este ou àquele regime totalitário), ou também a produçào de um ceno número de indivíduos idênticos no que se refere às caraaerísticas físicas e mentais (através da utilização da térnica do clone) (Schaff, 1993: ? W .
A revoluçào energética caracteriza-se pela descobetta de novas fontes de energia, como a energia solar, a geotérmica e a energia das marés (mares e ocea­nos), bem como pela otimização das fontes tradicionais (eletricidade e petróleo) e das fontes subaproveitadas, como a energia dos ventos e a das correntes fluviais.
Na verdade, o progresso da humanidade depende em grande parte do sucesso na busca de novos recursos energéticos, em face da insuficiência e esgo­tamento dos atuais. No entanto, a energia nuclear, a despeito de seus benefícios, não deixa de ser uma constante ameaça à sobrevivência da espécie humana e do próprio globo terrestre.
Sem dúvida. nào há como negar os efeitos positivos da tecnologia, tanto quanto é preciso atentar para seus efeitos negativos:
É estranho como tantas ìnovaçi~es bem-intencionadas acarretam conseqüéncias variáveis. Por um lado. a medicina dobrou o tempo médio de vida, eliminou numero­sas doencas. aholiu muitas formas de dor e forneceu os meios de efetivo controle da natalidade. Por outro lado, ao controlar o número de mones, criou uma explosão demográfica. a qual continua porque os meios de controle da natalidade sào larga­mente ignorados. Na agricultura, a `revolução verde" possibilita a aboliçào da fome; entretanto. os alimentos nào sào distrihuídos igualmente, e muita gente está morrendo de fome. ~os transportes, na construçào e no suprimento de energia, as invenções melhoram a qualidade de vida; contudo. a produpo energética e o motor de combus­tão intema poluem o ar e a água. A energia nuclear toma possível um holocausto nuclear: mas pode fomecer energia quando se esgotarem as reservas de combustíveis fósseis. O computador ameaça convener-se no Big Brother; no entanto, ele nos ajuda a controlar complexos processos sociais. A hiologia molecular acena com a esperança de aholir as doenças e criar um suprimento permanente de alimentos, mas existe a possihilidade de que. algum dia. seja usada para criar uma elite de génios maléficos e uma multidão de seguidores embrutecidos (Futeller, 1980: 265).
Nem todo mundo vê na tecnologia a soluçâo para as dificuldades que o homem enfrenta. Dluito pelo contrário, ela tem sido apontada como a vilã da história da humanidade que caminha para um futuro sombrio, egoísta e constan­temente ameaçado pela destruição engendrada pelas próprias inovações ternológicas.
Nesse cenário pessimista, o homem aparece como a primeira vítima de sua própria criação. A tecnologia escapa ao seu controle, cai nas mãos de gru­pos minoritários, movidos por interesses particulares, que a utilizam muitas ve­zes de forma inescrupulosa para favorecer e beneficiar apenas um número res­trito de pessoas, em detrimento de uma maioria ingênua, iludida e facilmente manipulável, seduzida por uns poucos atrativos exercidos pelos produtos da moderna tecnologia.
Fala-se atualmente na cultura do ter em substituiÇão à cultura do ser, como conseqüência direta do desenvolvimento tecnológico. As necessidades essenciais dos homens sào substituídas por desejos imediatos e efêmeros, sendo o homem avaliado não mais em função do que ele é, mas em função do que tem ou possui.
Comenta-se a respeito do "vazio existencial°, como resultado da perda do sentido da vida em conseqüência da gradual extinção de um de seus mais fortes referenciais, a saber, o trabalho. Mas quem compartilha dessa visâo desalentadora acerca da tecnologia esquece, em última instância, que ela é um produto do homem e, como tal, está nas mãos de seus criadores e operadores, e nào o inverso.
Nesse sentido, podemos concordar com Regis de Morais ( 1988: 166) quando afirma que "o grande problema da civilização científico-tecnológica não é de ciên­cia nem de técnica. É um problema filosófico".
Cabe ao homem rever e reavaliar o encaminhamento do desenvolvimento tecnológico, seguindo adiante com todas as inovaçòes que lhe possam ser úteis e examinando os riscos que ameaçam despersonalizar a si mesmo e descaraaerizar o ambiente em que vive. Essa reflexâo em busca de uma humanizaçâo da ternologia deve e pode ser mediada pela filosofia, que fornecerá ao homem os subsídios necessários para o estabelecimento de um novo modus r,,ivendi diante de um processo de transformação irreversível.
Mais do que nunca a nova sociedade tecnólogica necessita de homens críticos e criativos capazes de entender e direcionar de forma responsável o pro­cesso de mudanças que ocorrem em ritmo cada vez mais acelerado:
A ternologia do amanhà requer não milhòes de homens levemente alfabetizados, prontos para trabalhar em uní.~.sono em tarefas infinitamente rtpetitivas, nem homens que recebem ordens sem piscar. con.scientes de que o pào se consegue com a submi.s­sào mecànica à autoridade, mas sim de homens que possam fazer julgamentos críti­cos, que possam abrir caminho através dos ambientes novos, que sejam rápidos na identificaçào de novos relacionamentos numa sociedade em rápida mutaçào (Toffler, 1970: 323-4).
A despeito das dificuldades que deverâo ser superadas em função da gt~adual extinção do trabalho humano, em sua fomla tradicional. e o conseqüente desemprego estrutural, é necessário perceber nesse processo uma oportunidade de um homem com mais tempo livre para investir em si mesmo, em busca de mais

conhecimento, autonotnia e criatividade, elementos imprescindíveis na reconstru­ção de uma cultura novamente embasada no ser e não mais no ter.
Quanto à automação propriamente dita, .ela representa o f m do trabalho como necessidade de sobrevivéncia. Fecha-se. assim, um ciclo hiscórico que durou dez mil anos e se irticiou com a agricultura muscular. Com o término do trabalho finda-se, também. a alienaçào dos frutos desse trabalho. Inicia-se a Civilizaçào do Lazer. Pela primeira vez. em seu todo. a humanidade vence a carência e conquista a abundància. É o pleno domínio da natureza. Doravante todos os homens - teoricamente ­podem ter acesso à reflexào, ao mundo da cultura e à plena gratificaçâo (Muraro, 1974: 63).
A humanização da ternologia se fundamenta na ação livre e responsável do homem na tomada de decisões para o redirecionamento do seu próprio futuro. Está nas mãos de cada homem em particular, e da sociedade como um todo. o destino da humanidade e a possibilidade de uma existência pacífica e hatmoniosa:
A sociedade informática proporcionar.í os pressupostos para uma vida humana mais feliz: eliminaní aquilo que tem sido a principal fonte da má qualidade de vida das massas na ordenaçào do cotidiano: a miséria ou. pelo menos. a privaçào. Ahrird possibilidades pact a plena auto-realizaçào da personalidade humana. seja liberando o homem do árduo trabalho manual e do monótono e repetitivo trahalho intelectual. seja lhe oferecendo tempo livre necessário e um imenso progresso do conhecimento disponível. suficientes para garantìr seu desenvolvimento. Desse modo. o homem receberá tudo o que constitui o fundamento de uma vida mais feliz. Todo o restante dependerá dele. de sua atividade individual e social (Schaff. 199.i: l~-t-~).
1. [Tecnologia: um risco inevitávef]
A seguir. um texto didático de George üneller, que mostra a interdependéncia entre ciëncia e tecnologia.
Hoje. ciência e tecnologia sào interdependentes. Da ciência. a tecnologia deriva conhecimentos básicos. instrumentais e técnicas. Da tecnologia a ciência' recebe instrumentos e problemas para soluçâo. A ciência e a tecnologia interatuam no domínio da ciência aplicada que é a investigaçào de problemas cujas soluções se espera sejam tecnologicamente aplicáveis.
A tecnologia expressa e desenvolve os i·alores culturais existentes. Pa­droniza até as vidas e os valores de seus usuários, como no caso do relógio. da máquina a vapor. da linha de montagem e do computador. Através de sua dinâ­mica interna. a tecnologia faz exigências aos que a desenvolvem. Para a organi­zaçào de seus maiores projetos cria burocracias. A tecnologia habilita as pessoas a fazerem coisas que elas não poderiam ter feito de outro modo. embora certas escolhas tecnológicas excluam inevitavelmente outras. (Uma sociedade que pre­feriu o automóvel particular ao transporte público terá dificuldade em voltar atrás.) I~ào obstante, a tecnologia como tal não é autônoma: ela é criada por seres humanos e está suhordinada essencialmente aos valores culturais e deci­sões govemamentais. [...]


O caminho mais sensato é almejar um progresso limitado e manter seus inevitáveis custos em nível mínimo.
Alguma inovação tecnológica é essencial e desejável. Ela tem sido neces­sária à modernização de todas as sociedades, e habilitará a nossa a sobreviver e melhorar. O desenvolvimento de novas ternologias deve ser encorajado e o trei­namento de tecnólogos imaginativos, promovido. (...]
A tecnologia não ficará sob controle social enquanto os partidos po­líticos nâo propuserem diretrizes específicas para tal. Com vistas à acelera­çâo desse processo, deverá haver o debate mais amplo possível e a difusào de informa~ões.
Toda e qualquer faculdade humana pode ser mal usada. O homem pode usar sua inteligência para escravizar um outro, sua imaginação para ludibriar, sua eloqüência para trair. Mas, se nào usasse essas faculdades, onde estaria% Usando seus poderes, o homem amplia continuamente o âmbito de suas realiza~òes. A tecnologia aumenta sua capacidade para fazê-lo.
A tecnologia pode criar ou destruir, tornar o homem mais humano ou menos. Mas as civilizaçôes. como os indivíduos, devem correr riscos se quise­rem progredir. Se exercermos prudência para minimizar os danos da tecnologia e incentivar ao máximo seus benefícios, certamente valerá a pena aceitar o risco.
I:x~a, G.F. A ciência como atir~idade humana. TraduÇào de Antonio José de Souzt. Rio de laneiro.~São Paulo: Zahar;'Edusp, 1980. p. 269-'0.
2. [Conversando com as máquinas]
Para Schaff. há necessidade de uma renovaCão da `filosofia do homem- ante os desafios da crise econômica e do desenvolvimento tecnológico. Os meios de comunicação. videotea-tos. computadores, hanco de dados, informações via satélite ou fibra óptica. etc.. estão a serviço do homem, e não o contrário.
Ao falar de influência da sociedade informática sobre o desenvolvimento da cultura, referimo-nos principalmente às novas possibilidades criadas para sua difusão.
É óbvio que o advento das novas técnicas de transmissão de informações ­que é o traço mais característico da sociedade informática - terá repercussões sobre a cultura. entendida no sentido mais amplo do terma. A invençào do rádio promoveu a cultura porque tornou possível - em especial com o advento dos transístores - chegar aos lugares mais remotos e praticamente inacessíveis. nào apenas com a difusão de notícia.s da atualidade. mas também com programaç cultu­rais de literatura. música e teatro. A televisão uouxe uma mudanÇa ainda mais profunda a esse respeito; as palavnas sâo acompanhadas de imagens, o que não apenas amplia os efeitos da palavra falada. como, além disso. permite a transmissão de outros efeitos estéticos não-verbais (obras de arte, paisagens de outros países. dança. etcJ e de novos valore.s educativos (filmes científicos, culturais. etc.).


Essas duas fontes de informação (denominadas corretamente de meios de comunicação de massa) viram-se recentemente completadas por uma invenção nova e muito surpreendente, que certamente revolucionará o ensino, em especial o autodidatismo. Refiro-me à didática propiciada pelos "autômatos falantes" que transmitem conhecimentos em diversos campos e estão programados de forma a estabelecer um "diálogo" com o estudante, fazendo-lhe perguntas e corrigindo as respostas equivocadas. [...J
Se a educação contínua há de ser um dos métodos (talvez o principal) capazes de garantir ocupações criativas às pessoas estruturalmente desemprega­das, então é fácil compreender a extraordinária importância da difusão do conhe­cimento (que constitui a base do processo social de aculturamento) por meio de novas técnicas de ensino. Atualmente, todavia, tais técnicas ainda estão no primei­ro estágio de desenvolvimento, mas já é possível intuir suas possibilidades futuras.
Apesar disso, esses professores autômatos são apenas um produto se­cundário de algo que é muito mais importante nesse campo: a tecnologia da informática. [...]
O computador é um produto do homem, portanto é parte da sua cultura. Essa tecnologia está destinada a revolucionar o processo de formação de cultura e hoje já testemunhamos o início dessa revoluçâo. O computador servirá a muitos fins: como supermemória artificial que aliviará bastante a carga de memória huma­na hoje necessária, tomando assim muito mais fácil o processo de ensino; como executor, com uma rapidez surpreendente, de operaçôes combinatórias; como idealizador de novos métodos de conhecimento humano em muitas disciplinas, incluindo aquelas que no início se acreditava estarem fechadas às técnicas informáticas (investigação histórica, jurisprudência, etc.); como fator de um pro­cesso mais ágil de aprendizado e de verificação dos conhecimentos do aluno
, também por meio do método da "conversação" com a máquina, etc.
ScruFr, Adam. A sociedade injorn~ática; as conseqüências sociais da segunda revoluçào indus­trial. Traduçào de Carlos Eduardo )ordào Machado e Luiz Arturo Obojes. 4. ed. São Paulo: Bcasiliense/Unesp, 1993. p. 72-4.
3. Do Japão
O poeta Gilberto Gil mos~tra aqui uma visào romántica da ternolog'ta.
Do Japão
quero uma câmera de filmar sonhos pra registrar nas noites de verão meu corpo astral, leve, feliz, risonho voando alto como um gavião;
que filme dentro da minha cabeça todo pensamento raro que eu mereça, toda ilusão a cores que apareça,
toda beleza de sonhar em vão.


Do Japão
quero também um trem-bala de coco pra atravessar túneis do dissabor; quero um microcomputador barroco que seja louco e desprograme a dor; visitar um templo zen-disbundista, conversar com um samurai futurista que me dê pistas sobre o sol-nascente, que me oriente sobre o novo amor.
Do Japão
quero uma gueixa que em poucos minutos da minha queixa faça uma paixão, descubra novos sentimentos brutos
e enfeiti~ada tome um avião
e a gente vá viver num oütro mundo,
pra lá do terceiro ou quano ou quinto mundo, onde a rainha seja uma açucena
e a divindade a pena do pavâo.
Gn, Gilbeno. "Do )apão.' In: Ga. Gilberto. O etenw Deus. .Nludança. Sào Yaulo: ~'EA, 1989.

PARA REFLETIR E RESPONDER
1. Comente a epígrafe do capítulo.
2. Estabeteça as possíveis relações entre ciência, técnica e tecnologia.
3. A ciência, a térnica e a tecnologia, com suas armadilhas, vão deswir o homèm~ O qüe você pensa sòbiè o tema.~ Faça uma redação a respeito. 4. Identifique em seu grupó de trabalho.a tendêncìa predominante: a fa­
vor; còntcá oti yin ressaivás ém fetàçà~'ao piog,resso ternológico: Faça uma síntese dos diferentes pontos de vista. Utílize também as idéias do capítúlo e das Leituras Complementares.
5. Discuta: "No futuro, o professor será substituído por um engenho auto­mato .
6. Homem ou computador: quem vence a partida de xadrez.? Discuta as possibilidades.
7. É possível humanizar a ternologia? EXplique.
8. Numa sociedade como a de hoje, dominada pela tecnologia e pela sofisticação dos inswmentos à disposiçâo do homem, ainda há lugar para a filosofia? Justifique sua resposta.

SUGESTÕES DE ATIVIDADES

l. A classe se divide em três grupos: o primeiro elaborará argumentos que reforçam a visão otimista em relaÇào à tecnologia; o segundo faz o mesmo em relaçàe à visào pessimísta: e o terceiro. o mesmo com a visâo moderada. O professor atuará como mediador do debate.
2. Recorte fotos de jornais e revistas e ilustre as principais idéias evpostas no texto de hneller (Leituras Complementares>.
3. Discuta com os colegas o tema: "Tecno(ogia como sinónimo de cultu­ra". L'til'sze como apoio o texto de Vargas citado ao longo do capitulo e o texto de Schaff (Leìturas Complementares ).
y. Assista ao filme Invasão de privacidade (Philip T~ovce, 1994 > e discuta-o em classe. consìderando o que foi exposto no capítulo.
~. .Analise e comente a composiçâo Do,Japàv. de Gilberto Gil.
(. Selecione em um jornal ou revista a notícia sobre algum avanço tecno­lógico. Depois. comente os benefícios e riscos dessa inovaçào.
". Em um livro lancado em 1990, ~fegateüdências 2000. os analistas norte­americanos Iohn \aisbitt e Patricia Aburdene enfocam as tendências de mudanÇa. Existe um daro tom otimista apontando para o início de uma nova conscientizaçâo em que as pessoas se preocuparào mais com a qualidade de vida. Discuta isso com seus colegas.


(*) SOUZA, Sonia Maria Ribeiro de. Um outro olhar: filosofia. São Paulo, FTD, 1995.


FACED/UFBA
Educação e Tecnologias
Contemporâneas
Prof. Menandro Ramos




Tecnologia: contra ou a favor do ser humano?(*)

Sonia de Souza

Nos sistemas tecnológicos do amanhã - rápidos. fluidos e auto-regula­dores - as máquinas lidarão com o fluxo de materiais físicos: os ho­mens com o fluxo de informação e percepção. Máquinas irão cada vez mais realizaras tarefas rotineiras; os homens, as tarefas intelectuais e criativas. As máquinas, assim como os homens, em vez de ficarem con­centradas em fábricas gigantescas e cidades industriais, estarão espalhadas através do globo, ligadas por um sistema de comunicação, impressionantemente sensível, quase instantâneo. O trabalho humano sairá da fábrica e do escritório massificado, para a comunidade e o lar.

Alvin Toffler, O choque do futuro.



S
e você ainda não leu, certamente já ouviu falar dos li­vros Admirável mundo novo (Aldous Huxley), 1984 e A revolu­ção dos bichos (George Orwell), Fahrenheit 4~1 (Ray Bradbury) e lUalden II (Burrhus E. Skinncr). Todos desaevem sociedades futu­ras dominadas pela máquina e pela tecnologia, organizadas politi­camente sob a força de regimes totalitários, em que o homem é constantemente manipulado, condicionado e dirigido a pensar, agir e sentir como um autômato, sem vontade própria e sem liberdade.

Nesses livros os autores passam uma visão extremamente pessimista de um mundo que resultou de um processo inexorável do avanço tecnológico e é comandado e administrado por entidades abstratas e dominadoras, do tipo Big Brother (Grande Irmão), às quais os homens se submetem fanaticamente, docil­mente e zelosamente. Para exemplificar, eis um pequeno trecho do livro 1984, de George Orwell (1979: 9-10):
O Ministério da Verdade - ou Miniver. em Novilíngua - era completamente dife­rente de qualquer outro objeto visível. Era uma enorme pirâmide de ativíssimo cimen­to branco, erguendo-se, terraço sobre terraco, trezentos metros sohre o solo. De onde estava Winston conseguia ler, em letras elegantes colocadas na fachada os três lemas do partido:
GUERRA É PAZ LIBERDADE É ESCRAVIDÃO IGNORÂNCIA É FOR(;A
I...1 O D1inistério do Amor era realmente atemorizante. Não tinha janela alguma. ü'inston nunca estivera lá, nem a menos de um quilômetro daquele edifício. Era um prédio impossível de entrar, exceto em função oficial, e assim mesmo atravessando um labirinto de rolos de arame farpado, portas de aço c ninhos de metralhadoras. Até as rua.s que conduziam às suas barreiras extemas eram percorridas por guardas de cara de Gorila e fardas negras, armados de porretes articulados.
Alguns filmes de ficçào científica também veiculam uma visão sombria do mundo de amanhã. A sociedade parece ter-se tornado sucata de um tempo de opulência e de riqueza proporcionadas pela tecnologia. Esta mostra-se, no futuro, falida e desbaratada, fonte de miséria, fome, dor e mazelas para o gênero huma­no. Exemplos de tais filmes são: Blade Rumner, o caçador d~ andróides: a série Mad Max; The day, after, Apocalipse now,: O ovo da serpente: 1984: entre outros.
Por outro lado, não há como negar o fascínio que a tecnologia exerce sobre o ser humano, materializada em produtos caros e sofisticados, atualmente verdadeiros símbolos do mundo moderno. Quem, hoje, não nutre um desejo secreto de possuir um telefone celular e utilizá-lo dirigindo um veículo monitorado por um computador de bordo% Quem já não ficou sem dinheíro no final de sema­na e dirigiu-se confortavelmente à cabine de um Banco 24 Noras. aproveitando também para pagar algumas contas e efetuar aplicações financeiras? Quem não se sente bem ao passar um final de semana acampando no meio do mato e sabendo que todo e qualquer recado será registrado em sua secretária eletrônica e que seus

programas prediletos na tevê estarâo gravados no videocassete? Quem pode ne­gar a sensação prazerosa de andar pelas ruas ouvindo no walkman suas músicas preferidas? Quem pode negar a economia de tempo e de Iocomoção que se ob­tém com a utilização do Jax para enviar mensagens e documentos, especialmente em situaçôes de urgência? Quem ainda nâo experimentou a praticidade de uma agenda etetrônica e de um notebook, companheiros diários dos profissionais que atuam nas mais diferentes áreas? Esses sào apenas alguns poucos exemplos de inovações tecnológicas que fazem parte do cotidiano do homem moderno ­ampliadas a cada dia pelas novas possibilidades da informática.
No entanto. é necessário registrar o incômodo eausado nos bancos, quando se tem pressa e o sistema fica fora do ar; a dificuldade causada pelos inúmeros botões do controle remoto da televisào. do videorassete e do aparelho de som nos diferentes usuários de diferentes fai.~:as etárias: o desconforto provocado pelo uso inicial do computador, geralmente acompanhado de perdas de arquivos importantes.
E, nesse cenário no qual a tecnologia ocupa o lugar de destaque, surge a seguinte questão: a tecnologia escraviza ou liberta o ser humano? Atua contra ou a favor?

Ciência, técnica e tecnologia

Ciência, técnica e tecnologia são palavras relacionadas entre si; ao se fazer referência a uma delas, inevitavelmente as demais surgem em cena.
A ciência é uma das formas de conhecimento elaboradas pelo ser huma­no para compreender racional e objetivamente o mundo com a finalidade de nele poder intervir em seu próprio benefício. \osa tomar a natureza inteligível ao apreen­der as regularidades existentes em um conjunto de fenômenos; tais regularidades são expressas posteriormente em leis e teorias que traduzem o esforço do homem em conhecer e explicar tudo o que é - ou seja, tudo o que existe natural ou necessariamente. Técnica. assim como tecnologia. provém do grego techne, que significa "arte" ou "habilidade'. Embora procedam da mesma raiz etimológica, técnica e tecnologia têm sido empregadas em sentidos diversos.

Técnica

A parte material de uma arte ou ciência. Conjunto dos processas 21e uma arte ou ciência (Diz-se em geral do aproveitamento racional e prático dos recursos naturais, e especialmente da aplicação das leis da natureza pata satisfazer as necessidades humanas) (Caldas Aulete, 1958: 4887).

Tecnologia

Tratado das artes em geral. O conjunto dos processos especiais relativos a uma determinada arte ou indústria. Explicação dos termos próprios das artes, ofícios. Linguagem especial das ciências, indústrias, artes, etc. Ciência que trata dos méto­dos e do desenvolvimento das artes industriais (CaIdas Aulete, 1958: 4887).


Na verdade, nâo há consenso sobre o significado último de técnica e tecnologia entre os diferentes autores que tratam do assunto. Assim, toma-se opor­tuno relacionar os sentidós mais usuais de tais termos. procurando verificar as relações existentes entre os componentes da tríade ciência, técnica e ternologia.
Origem da ciéncia e da técnica
A origem remota da ciência e da técnica se encontra no medo que o ser humano sentiu no seu énfre~tamento com a natureza e no desejo de poder, a fim de submetê-la e utilizá-la a seu favor.
Aos primeiros seres humanos. diante das tempestades, dos raios e trovôes. diante do temor despertado pelos animais ferozes que os rondavam, só restava buscar poder para combater o poder maior e esmagador das forças naturais. Aos poucos, as soluçòes mágicas, as soluçôes míticas e os rituais religiosos foram substituídos por conhecimentos e hahilidades utilizados na busca do poder do homem sobre a natureza. Ironicamente. na visão de Regis de Morais (1988: 49), o maior problema que hoje o homem enfrenta é `'nâo ter poder sobre seu próprio poder: o homem perdeu o controle sobre suas possibílidades".
Para Severino, a origem da técnica também resulta da intervençâo do homem na natureza. Enquanto a adaptação dos demais seres vivos à natureza resulta de um código genético previamente determinado, o ser humano cria meios e instrumentos que prolongam. agilizam e versatilizam os seus órgãos de sentidos e os membros de seu corpo, para retirar da natureza o que é necessário à sua sobrevivência. provocando também uma adaptaçâo da natu­reza a si mesmo:
Essa é a origem da técnica. pela qual os homens criam ferramentas e instrumentos mediante os quais vâcr interferir na natureza para transfortná-la em seu benefício. Ao atuarem assim sobre a natureza. os homens vào transformando-a. fazendo com que ela se adapte. até cetto ponto. às suas necessidades. Enquanto os demais seres vivos u adaptam às condiÇ«es of~recidas pela natureza, os homens. emhora necessitem da mesma forma se aclequar a eln. vào conseguindo que ela também se adapte a eles (Severino. 1992: l ~3 ).
A ciëncia precede a técnica ou a técnica conduziu ao desenvolvimento das ciências? Para Vargas (199~: 3-12), a técnica como um simples saber-fazer manual é uma atividade humana tão antiga quanto a própria linguagem, surgindo juntamente com ela "na aurora da humanidade":
A térnica é assim uma atividade humana baseada num aprendizado simbólico; i.tto se dá quando na mente do fahricante forma-se a imagem do objeto fabricado. A paleoetnologia atual vem demonstrando euidéncias claras desse processo. Por isso é que ela pode aperfeicoar-se ao longo dos anos: pois traz consigo a propriedade dos símholos lingüísticos de. associando-se entre si. denotarem situaçòes e objetos nowos a serem im·entados (Vargas. 1990: ~).
A técnica evoluiu de um estado mítico, onde os segredos do saber-fazer instrumentos eram revelados aos homens pelos deuses, até o estado artesanal, onde o mestre. pessoa individual e autor dos processos técnicos, passou a ensiná­la aos aprendizes. de geraçào a geraçào:


categoria do saber, a térnica, à categoria do fazer. I~ào no sentido de que esta se reduza a uma pura ativ·idade mecànica, mas porque constituída de um conjunto de nomias destinadas a dirigir efiazmente a açào a uma determinada Fmalidade.
Esse sentido geral da térnica é restrito às normas que possibilitam e faéilitam o domínio do homem sobre a natureza, ou seja. às térnicas de produç~ào. Aí entram, por exemplo, as térnicas agrícolas, industriais, de automaç~ào, da cibemética, etc.
Tecnologia: ~ersão elaborada da técnica
Cabe agora um exame mais detalhado do terceiro elemento da tríade, a tecnologia, tema polêmico e recente, objeto de estudo e reflexão ndo só de cien­tistas, mas de filósofos particularmente interessados no assunto.
Quando se quer ampliar os conhecimentos relativos a um determinado tema, nada mais útil do que começar verificando como os especialistas conceituam o termo em questào.
Segundo Kneller ( 1980: 245-6):
A tecnolof;ia é essencialmente uma atividade prãtiCa, a qual consiste mais em alte­rar do que em compreender o mundo. Onde a ciéncia persegue a verdade. a ternolo­gia prega a eficiéncia. Enquanto a ciéncia procura formular as leis a que a natureza ohedece, a tecnologia utiliza essas formulaçìx~s par.~ criar implementos e aparelhos quc façam a naturezv of~edecer ao homem. Tal conw a ciéncia. entretanto. a tecnolcr gia é uma entidade imensamente complexa que consiste em fenómenos de muitas espécies - agentea. instituic8es. produtos, conhecimentos, técnicas. etc. I...] Analiso­a como uma atividade historicamente em desem~olvimento para a construcào de má­quinas e outros anefatos. im~ençào de técnicas e processos. cria~ão e transformacào de materiais e organizaçào de trahalho. dc modo a satisfazer necessidades hwnanas.
Para Medeiros e Medeiros (1993: ~-S) `a tecnologia é o conhecimento utilizado na criaçào ou aperfeiçoamento de produtos e sen,iços, ou melhor, a tecnologia é o conjunto de conhecimentos, práticos ou científicos, aplicados à obtençào. distribuiçâo e comercializaçào de bens e sen,iços".
Segundo esses autores, a tecnolo~ia está presente em todos os setores da vida humana, permeando as diversas atividades humanas, com o intuito de satisfazer desejos e necessidades, substituir, aliviar ou simplificar o esfor­ço físico e mental despendidos na realizaçào das mais diferentes tarefas, bem como liberar energias para tarefas mais criativas e interessantes. No entanto, alertam para os possíveis danos resultantes do mau uso da tecnologia, como o desemprego e a destruiÇào do meio ambiente. Técnica e.tecnologia, na visâo desses autores, não sâo sinônimos, embora mantenham entre si um certo parentesco:
A técnica está as.sociada à nopo do `fazew, isto é. habilidade ou arte inata ao homem. A tecnologia une essa habilidade natural aos conhecimentos - práticos ou científicos - que foram sendo acumulados ao longo dos anos. Os estudiosos afimaam que a técnica resolve os prohlemas fundamentais do homem. A tecnologia satisfaz tamhém seus deseios le sonhos). [...] .A tecnologia possui significado próprio. Ela nào é o estudo da técnica. mas sim sua versão mais elahorada. [...J .A tecnologia não se confunde (...] com os prcxlutos que aiuda a fahricar. Ela é maís ahstrata (ou menos palpável) e incorpora a arte, a cultura, os conhecimentos e as térnicas do país que investiu' muito tempo e dinheiro para chegar a um determinado estágio de desenvol­vimento intelectual e material (Medeiros e Medeiros, 1993: 9, 12, 32 e 33).
A ciência, por sua vez, tem sido a grande aliada do desenvolvimento tecnológico:
É o conhecimento científico que está na base da fabricação de artigos mais refina­dos e no deserivolvimento de métodos e processos avançados em áreas como saúde, agricultura e transporte. [...1 A maioria dos cientistas tem os pés solidamente fincados no chào de universidades e centros de pesquisa, onde se investem bilhões de dólares na criaçào de produtos que vào ser amplamente consumidos. A tecnologia não é mais fruto de sonhos'ou delírios individuais. como bem demonstra o exemplo dos criativos
~ japoneses: resulta de políticas defmidas e de programas de trabalho muito bem-estru­turados (Ibidem: 18).
A tecnologia é hoje um produto submetido às leis do mercado e à aprova­cão de consumidores cada vez mais exigentes. É uma mercadoria especial, nem sempre disponível nas prateleiras, e sua comercialização ou transferência, muitas vezes, é fruto de demoradas negociações e transações.
Vargas (1990: 3) faz uma séria crítica à concepção da tecnologia como mercadoria que se vende e/ou se compra. A seu ver, a tecnologia é cultura que se adquire à medida que os homens evoluem:
[A tecnologial não poderá ser entendida como mercadoria que se vende ou compra, mas sim como saber que se aprende: isto é, cultura. Note-se que cultura é constituída pelo acervo de saberes, anes e aenças de um povo, quando esse acervo é subordinado à unidade de ponto de vista que o caracteri~a como tal. Assim, a ternolog'ta é cultura quando unificada a todas as outras manifestaçì~es sapienciais e anística-s de um determinado povo. Mas, quando ela é entendida como objeto ~solado de transaçòes comerciais. não pode mais ser considerada cultura.
Para Mammana (1990: 13), "hoje há uma crença generalizada de que a tecnologia é uma espécie de poçâo mágica que pode ser engarrafada e transpor­tada de um lado para outro e, quando inàlada por uma naçào subdesenvolvida, é capaz de libertar-lhe o espírito do desenvolvimento econômico ".
Segundo esse autor, tecnologia deveria nomear a ciência que estuda a técnica. Sendó a técnica arte ou ofício, tecnologia deveria ser uma das ciências antropológicas. No entanto, hoje confunde-se a ciência com o seu objeto de estudo e tal confusão "beneficia somente aqueles que fazem, como na Idade Média se fez com as indulgências, do místico intangível um comér­cio rentável" (Mammana, 1990: 14).
Na verdade, a tecnologia em si mesma não é boa nem má. 0 uso que se faz dela, no entanto, pode trazer benefícios ou prejuízos para a humanida­de. Diversos autores concordam com a concepção da técnica como um re­curso do qual os homens se utilizam para um aproveitamento mais benéfico, eficaz e eficiente da natureza para sua sobrevivência e subsistência. Sob essa óptica, a técnica é vista como uma extensão do processo de adaptaçâo do ser humano à natureza: a relação do homem com a natureza é mediada pela técnica, relaçào essa geralmente revestida de um aspecto harmonioso, graças à intervençâo positiv a ,da técnica.

No entanto, a tecnologia tem sido alvo de críticas, por ser considerada dominação inconseqüente da natureza, a setviço de interesses comerciais, indus­ttiais, militares, entre outros, muitas vezes inescrupulosos, cujos resultados podem ser prejudiciais ao homem. A esse respeito, sào muito oportunas as afirmaçòes de Buzzi e Severino. O primeiro (1987: 84-7) escreve:
A térnica é, pois, uma modalidade de verdade, a revelaçào de aspeaos escondidos da velha natureza que vivemos. Nela se manifestam os entes que nos cercam, que andam junto a nós desde sempre no escondimento.
Conseqüentemente, a técnica nào só produz uma revelaçào fantástica da nature~a. Produz também nossa maneira de morar. Produz a nossa habitação, o nosso aconche­go na tetra, a nossa compreensào da natureza.
A modemidade, porém, está mais na tecnologia que na térnica. [...)
A tecnologia é o Leviatà da modemidade. Levtatà que comanda. Quem dirige e encomenda a pesquisa científica é hoje a tecnolog'ta. Por isso, as universidades perde­ram em grande pane o senso da ciéncia. Perdeu-o também o próprio cientista, que está encarregado de pesquisar dentro de amplos programas cuja finalidade ele desco­nhece. Quer dizer, pesquisa sem ver a finalidade da pesquisa. Hà pesquisas encomen­dadas por centros de tecnologia e feitas sem que os cientistas jamais saibam de sua finalidade.
A ternologia plasmou a sociedade modema como indus~rial. I...l
O que a tecnologia vai fazer com a energia acumulada, armazenada e controlada? Vai produzir arlefatos, máguimrs e produ~os químicos que a natureza nem sequer produz. E nesta produçào está a diferenCa maior entre a técnica e a ternologia. Esta se vale da ciéncia para inspecionar e dominar a natureza, para constrangé-la a compor­tar-se segundo o programa da vontade de dominaçào.
Severino (1992: 184), ao mesmo tempo que destaca a importância do desenvolvimento da ciência e da técnica para o progresso da humanidade, adver­te para os perigos advindos da "instrumentalizacão da razâo":
E a ciéncia, que pretendia lihertar os homens dos determinismos da natureza, das doenças. da miséria. acabou se transformando numa nova fomta de opressào para os mesmos homens! A razào que construía a ciéncia. de razào libertadora, como queriam os pensadores modemos, acabou se transformando em razào instrumental que, por meio de seu controle lógico-tecnológico. implantou uma tecnocracia: toda a vida humana é coriduzida e detemtinada pelos padròes térnicos impostos pela ciéncia. E o que é pior, o poder da ciéncia e da técnica passa a ser controlado e usado por grupos humanos na defesa de seus interesses particulares. Ele se transformou num instru­mento fone e adequado para a dominação e a exploraçào políticaa? A vida das pes­soas nào é mais referida a critérios éticos e políticos. mas a critérios puramente térni­cos! 1...] Como se tudo se submetesse às regras da produçào industrial.
No que diz respeito à tríade ciência, técnica e tecnologia, é possível perce­ber três posicionamentos distintos: otimismo e entusiasmo crescentes: pessimismo sombrio; e uma atitude de moderação, que convida à utffização das três quando 0 resultado é proveitoso; e recomenda cautela e prudência, quando prejudicial ao homem e ao meio ambiente.

A ternologia é um fenômeno recente na história da humanidade. Surge a partir da primeira revoluçào industrial, ocorüda entre o final do século XVIII e início do século ~X e seu mérito reside na substituição da força fisica do homem pela energia da máquina (inicialmente pela utilização do vapor e posteriormente pela utilizapo da eletricidade) no processo de produçâo.
Tecnologiá: um salto libertador
Atualmente se presencia a ocorrência da segunda revolução industrial, apoiada em uma 'tríade revolucionária - microeletrônica, microbiologia e ener­gia nuclear" - e que tem como característica fundamental a ampliação das capa­cidades intelectuais do homem, substituídos por autômatos, além da eliminação bem-sucedida do trabalho humano na produção e nos serviços.
Segundo Adam Schaff, pensador maraista polonês, a primeira e a segunda revoluçâo industrial se assemelham no que diz respeito à ocorrência de um "salto qualitativo operado no desenvolvimento da tecnologia da produção°. No entanto, se a primeira revolução facilitou e incrementou o rendimento do trabalho huma­no, a segunda tem como finalidade a elimina~ào total desse trabalho.
Na visâo desse autor (1993: 22-3):
Isso significa, por um lado. a liberta~ào do homem da maldiçào divina do Velho Testamento, segundo a qual ele deveria ganhar o pão de cada dia com o suor do seu rosto: por outro lado. todavia. esta nova revoluçào coloca uma série de problemas sociais ligados à necessidade de se encontrar uma instituiçào que possa substituir o trabalho humano tradicional, seja como fonte de renda que permita ao homem satis­fazer suas necessidades materiais, seja como fonte tradicional de "sentido de vida', entendido como fundamental para a saàsfaçào das suas necessidades não-materiais, isto é. das suas necessidades espirituais.
Schaff companilha com outros autores a visào otimista acerca da ternologia. Embora o desemprego estrutural (perda do emprego em decorrência da automação e da robotizaÇâo da produção e dos serviços produzidas pela revoluçào da microeletrônica) seja um fenômeno inerente à efetivaçào da segunda revoluçào industrial, ela-'conduzirá a uma sociedade em que haverá um bem-estar sem precedentes para o conjunto da populaçào (incluindo as pessoas afetadas pelo desemprego estrutural) como também alcançará um nível sem precedentes do conhecimento humano do mundo" (Schaff, 1993: 1~3).
Para os otimistas, é através da tecnologia que o homem recuperará a felicidade e a soberania sobre a natureza tal como havia antes da expulsâo do Paraíso.
Enguita f 1991: 230-1) relata de uma forma extremamente bem-humorada o entusiasmo e o afà daqueles que vëem na tecnologia um recurso quase mágico para libertar o homem moderno de tudo aquilo que é desagradável, rotineiro, estressante, em especial o trabalho:

Para os moderados, a saída está no meio-tetmo, isto é, no encontro de soluções que permitam prever e minimizar as diFculdades, os problemas e os riscos próprios de tudo aquilo que é novo, em especial do que se denomina inovaçâo tecnológica.
~ Talvez não seja possível voltar a beber das águas de um rio como 0 Tietê, em virtude da poluição: no entanto, seria bastante t'azoável se os pei~:es pudessem voltar a viver em suas águas.
v Talvez nào seja possível estancar o processo de automaçâo e robotiza­Ção das indústrias e dos escritórios: no entanto, é necessário controlar a velocida­de de introdução de novas tecnologias para que o homem se adapte a essas mudanças e sejam a\,aliados criteriosamente os impactos de tais transformaçôes sobre o meio ambiente.
~ Talvez nào seja possível evitar o "desemprego estrutural", porém, pode­se pensar na redução da jornada de trabalho como altemativa para manter grande parte da população no sistema produtivo.
~ Talvez nào seja possí\'el recuperar o que se perdeu da camada de ozônio. mas é importante e necessário encontrar saídas para a eliminaçâo dos gases poluentes.
Esses sào apenas alguns esemplos de posturas assumidas pelos modera­dos diante da tecnolol;ia. Na \'erdade, nào se trata de impedir o advento da modernidade. mas de se saber em que medida aderir às maravilhas da "terceira onda" trazidas no hojo da tecnologia. responsabilidade individual e social dos homens e das diyersas instituiçòes sociais que compartilham hoje a existência de um mundo transformado pela segunda revolução industrial:
A tecnologia alimenta a engenharia. a indústria e a agricultura. c é alimentada pelas ci~ncias aplicadas e estas pclas ciéncias hásicas. nlas nào há um contato direto entre essas várias instàncias. Entre elas há o que se ¡x~de chamar de "filtros sociais". consti­tuídos ¡~or órgàos de educacào. de gerenciamento e orientacào científicos e tecnoló~i­cos. comunidades científicav e profissionais. e. tamhém. a opiniào púhlica e os gover­nos. Sào tais "filtros- que apressam ou retrasam o desem~olvimento tecnológico e julgam a com~eniW cia ou adaptahilidade das tecnologias. Enfim. sà~ esses tamhém que atuam como instânciaç éticas para julgar o perigo ou a monlidade de uma deter­minada~açào tecnológica l\'argas, 1990: 8).
Norhert ü%iener (1970: 1~9). o "pai da cihemética". embora ciente das dificuldades e emharaços que possam advir da tecnologia. deposìta confiança e esperança na lucidez humana capaz de encaminhar o desenvolvimento tecnológico de modo a heneficiar a humanidade de forma positiva e satisfatória:
A nova rwoluçào industrial é. ¡x~is. uma espada de dois gumes. I'ode ser usada para o henefício da humanidade. mas somente se a humanidade sohreviver o hastante para ingressar num perícxlo em que tal hcnefício seja ~Ossível. I'ode ser tamhém usada para destruir a humanidade. e. se nào for empreFcida inteligentemente, pcxle avançar muito nesse caminho. Há. contudo. sinais esper.tyasos no horizonte.


No reino dos chips
A revolução microeletrõnica, a revolução da microbiologia e a revoluçâo energética, denominadas `tríade revolucionária", são os componentes básicos da segunda revolução industrial. Como tudo que faz parte do mundo, apresentam efeitos positivos e negativos.
Relógios de quartzo, calculadoras de bolso (nas suas mais variadas e incrementadas versões), agendas eletrônicas, televisão em cores, televisào a cabo, toca-discos laser, os diversos utensílios domésticos (microondas. geladeira, freezer. máquinas de lavar roupa e lou~a).,jaa. noteboo~t:s. computadores (dos mais dife­rentes portes) sào produtos da revolu~ão da microeletrônica.
As conquistas espaciais, a automação das indústrias e escritórios. a utiliza­çào de robôs nas linhas de montagem (especialmente da indústria automobilísti­ca ), a moderna tecnologia militar apoiada na energia termonuclear, tamhém resul­tam do avanco da microeletrônica.
Sào inegáveis, sem dúvida, os benefícios dessas inovações tecnológicas: economia de tempo e esforço na realização de inúmeras atividades: maior produ­tividade com mais qualidade: maior conforto e bem-estar. seja no lar ou no am­biente de trabalho: indivíduos mais esclarecidos e universalmente instruídos pela abundância de informações e acúmulo de conhecimentos à disposiÇâo de todos na moderna sociedade informatizada.
Por outro lado. o mundo e a humanidade podem ser destruídos em pou­cos segundos; o aumento desconfortável do desemprego estrutural lança milhares de seres humanos a uma situaÇào de ócio forçado e não-planejado: a possibilida­de de armazenamento de informaçves nos computadores torna o indivíduo mais vulnerável e ameaÇa sua liberdade pessoal e sua privacidade: a manipulaçào de toda uma sociedade por regimes totalitários, bem como a massificação e uniformi­zaçào de padròes de conduta, capazes de romper os limites geográficos de cada nação. transformando o mundo numa imensa `aldeia global". são riscos que ame­açam cotidianamente a eaistência do homem.
A clonagem dos seres
~o limiar do século J~, a descoberta e gradual decifraçào do código genético dos seres vivos e a possibilidade de o homem interferir e dominar a natureza orgânica em geral. e inclusive o seu próprio `eu". determinou uma revo­luçâo no campo da biologia, especialmente da microbiologia. da qua) resultou a engenharia genética.
Taís avanços permitem ao homem modifìcar o código genético inato de plantas e animais, bem como desenvolver novos códigos. Tornam possível a pro­duçào de novas variedades de plantas e animais mais resistentes às doenças, mais adaptadas às condições naturais desfavoráveis e mais ricas em componentes ne­cessários à subsistência do homem.

Dessa maneira, o combate à fome e à desnutrição encontra um grande aliado no progresso da engenharia genética, que de modo bastante eficaz também pode auxiliar o homem na luta contra as doenças congênitas. Por outro lado, a revolução microbiológica pode tomar realidade os pesadelos registrados nos li­vros e filmes de ficçào científica:
Ingeréncia na personalidade humana, produção artificial de seres humanos com diversas cancterísticas `encomendadas' com antecedéncia (imaginemos, por exem­plo, a -encomenda' de seres "obedientes" a este ou àquele regime totalitário), ou também a produçào de um ceno número de indivíduos idênticos no que se refere às caraaerísticas físicas e mentais (através da utilização da térnica do clone) (Schaff, 1993: ? W .
A revoluçào energética caracteriza-se pela descobetta de novas fontes de energia, como a energia solar, a geotérmica e a energia das marés (mares e ocea­nos), bem como pela otimização das fontes tradicionais (eletricidade e petróleo) e das fontes subaproveitadas, como a energia dos ventos e a das correntes fluviais.
Na verdade, o progresso da humanidade depende em grande parte do sucesso na busca de novos recursos energéticos, em face da insuficiência e esgo­tamento dos atuais. No entanto, a energia nuclear, a despeito de seus benefícios, não deixa de ser uma constante ameaça à sobrevivência da espécie humana e do próprio globo terrestre.
Sem dúvida. nào há como negar os efeitos positivos da tecnologia, tanto quanto é preciso atentar para seus efeitos negativos:
É estranho como tantas ìnovaçi~es bem-intencionadas acarretam conseqüéncias variáveis. Por um lado. a medicina dobrou o tempo médio de vida, eliminou numero­sas doencas. aholiu muitas formas de dor e forneceu os meios de efetivo controle da natalidade. Por outro lado, ao controlar o número de mones, criou uma explosão demográfica. a qual continua porque os meios de controle da natalidade sào larga­mente ignorados. Na agricultura, a `revolução verde" possibilita a aboliçào da fome; entretanto. os alimentos nào sào distrihuídos igualmente, e muita gente está morrendo de fome. ~os transportes, na construçào e no suprimento de energia, as invenções melhoram a qualidade de vida; contudo. a produpo energética e o motor de combus­tão intema poluem o ar e a água. A energia nuclear toma possível um holocausto nuclear: mas pode fomecer energia quando se esgotarem as reservas de combustíveis fósseis. O computador ameaça convener-se no Big Brother; no entanto, ele nos ajuda a controlar complexos processos sociais. A hiologia molecular acena com a esperança de aholir as doenças e criar um suprimento permanente de alimentos, mas existe a possihilidade de que. algum dia. seja usada para criar uma elite de génios maléficos e uma multidão de seguidores embrutecidos (Futeller, 1980: 265).
Nem todo mundo vê na tecnologia a soluçâo para as dificuldades que o homem enfrenta. Dluito pelo contrário, ela tem sido apontada como a vilã da história da humanidade que caminha para um futuro sombrio, egoísta e constan­temente ameaçado pela destruição engendrada pelas próprias inovações ternológicas.
Nesse cenário pessimista, o homem aparece como a primeira vítima de sua própria criação. A tecnologia escapa ao seu controle, cai nas mãos de gru­pos minoritários, movidos por interesses particulares, que a utilizam muitas ve­zes de forma inescrupulosa para favorecer e beneficiar apenas um número res­trito de pessoas, em detrimento de uma maioria ingênua, iludida e facilmente manipulável, seduzida por uns poucos atrativos exercidos pelos produtos da moderna tecnologia.
Fala-se atualmente na cultura do ter em substituiÇão à cultura do ser, como conseqüência direta do desenvolvimento tecnológico. As necessidades essenciais dos homens sào substituídas por desejos imediatos e efêmeros, sendo o homem avaliado não mais em função do que ele é, mas em função do que tem ou possui.
Comenta-se a respeito do "vazio existencial°, como resultado da perda do sentido da vida em conseqüência da gradual extinção de um de seus mais fortes referenciais, a saber, o trabalho. Mas quem compartilha dessa visâo desalentadora acerca da tecnologia esquece, em última instância, que ela é um produto do homem e, como tal, está nas mãos de seus criadores e operadores, e nào o inverso.
Nesse sentido, podemos concordar com Regis de Morais ( 1988: 166) quando afirma que "o grande problema da civilização científico-tecnológica não é de ciên­cia nem de técnica. É um problema filosófico".
Cabe ao homem rever e reavaliar o encaminhamento do desenvolvimento tecnológico, seguindo adiante com todas as inovaçòes que lhe possam ser úteis e examinando os riscos que ameaçam despersonalizar a si mesmo e descaraaerizar o ambiente em que vive. Essa reflexâo em busca de uma humanizaçâo da ternologia deve e pode ser mediada pela filosofia, que fornecerá ao homem os subsídios necessários para o estabelecimento de um novo modus r,,ivendi diante de um processo de transformação irreversível.
Mais do que nunca a nova sociedade tecnólogica necessita de homens críticos e criativos capazes de entender e direcionar de forma responsável o pro­cesso de mudanças que ocorrem em ritmo cada vez mais acelerado:
A ternologia do amanhà requer não milhòes de homens levemente alfabetizados, prontos para trabalhar em uní.~.sono em tarefas infinitamente rtpetitivas, nem homens que recebem ordens sem piscar. con.scientes de que o pào se consegue com a submi.s­sào mecànica à autoridade, mas sim de homens que possam fazer julgamentos críti­cos, que possam abrir caminho através dos ambientes novos, que sejam rápidos na identificaçào de novos relacionamentos numa sociedade em rápida mutaçào (Toffler, 1970: 323-4).
A despeito das dificuldades que deverâo ser superadas em função da gt~adual extinção do trabalho humano, em sua fomla tradicional. e o conseqüente desemprego estrutural, é necessário perceber nesse processo uma oportunidade de um homem com mais tempo livre para investir em si mesmo, em busca de mais

conhecimento, autonotnia e criatividade, elementos imprescindíveis na reconstru­ção de uma cultura novamente embasada no ser e não mais no ter.
Quanto à automação propriamente dita, .ela representa o f m do trabalho como necessidade de sobrevivéncia. Fecha-se. assim, um ciclo hiscórico que durou dez mil anos e se irticiou com a agricultura muscular. Com o término do trabalho finda-se, também. a alienaçào dos frutos desse trabalho. Inicia-se a Civilizaçào do Lazer. Pela primeira vez. em seu todo. a humanidade vence a carência e conquista a abundància. É o pleno domínio da natureza. Doravante todos os homens - teoricamente ­podem ter acesso à reflexào, ao mundo da cultura e à plena gratificaçâo (Muraro, 1974: 63).
A humanização da ternologia se fundamenta na ação livre e responsável do homem na tomada de decisões para o redirecionamento do seu próprio futuro. Está nas mãos de cada homem em particular, e da sociedade como um todo. o destino da humanidade e a possibilidade de uma existência pacífica e hatmoniosa:
A sociedade informática proporcionar.í os pressupostos para uma vida humana mais feliz: eliminaní aquilo que tem sido a principal fonte da má qualidade de vida das massas na ordenaçào do cotidiano: a miséria ou. pelo menos. a privaçào. Ahrird possibilidades pact a plena auto-realizaçào da personalidade humana. seja liberando o homem do árduo trabalho manual e do monótono e repetitivo trahalho intelectual. seja lhe oferecendo tempo livre necessário e um imenso progresso do conhecimento disponível. suficientes para garantìr seu desenvolvimento. Desse modo. o homem receberá tudo o que constitui o fundamento de uma vida mais feliz. Todo o restante dependerá dele. de sua atividade individual e social (Schaff. 199.i: l~-t-~).
1. [Tecnologia: um risco inevitávef]
A seguir. um texto didático de George üneller, que mostra a interdependéncia entre ciëncia e tecnologia.
Hoje. ciência e tecnologia sào interdependentes. Da ciência. a tecnologia deriva conhecimentos básicos. instrumentais e técnicas. Da tecnologia a ciência' recebe instrumentos e problemas para soluçâo. A ciência e a tecnologia interatuam no domínio da ciência aplicada que é a investigaçào de problemas cujas soluções se espera sejam tecnologicamente aplicáveis.
A tecnologia expressa e desenvolve os i·alores culturais existentes. Pa­droniza até as vidas e os valores de seus usuários, como no caso do relógio. da máquina a vapor. da linha de montagem e do computador. Através de sua dinâ­mica interna. a tecnologia faz exigências aos que a desenvolvem. Para a organi­zaçào de seus maiores projetos cria burocracias. A tecnologia habilita as pessoas a fazerem coisas que elas não poderiam ter feito de outro modo. embora certas escolhas tecnológicas excluam inevitavelmente outras. (Uma sociedade que pre­feriu o automóvel particular ao transporte público terá dificuldade em voltar atrás.) I~ào obstante, a tecnologia como tal não é autônoma: ela é criada por seres humanos e está suhordinada essencialmente aos valores culturais e deci­sões govemamentais. [...]


O caminho mais sensato é almejar um progresso limitado e manter seus inevitáveis custos em nível mínimo.
Alguma inovação tecnológica é essencial e desejável. Ela tem sido neces­sária à modernização de todas as sociedades, e habilitará a nossa a sobreviver e melhorar. O desenvolvimento de novas ternologias deve ser encorajado e o trei­namento de tecnólogos imaginativos, promovido. (...]
A tecnologia não ficará sob controle social enquanto os partidos po­líticos nâo propuserem diretrizes específicas para tal. Com vistas à acelera­çâo desse processo, deverá haver o debate mais amplo possível e a difusào de informa~ões.
Toda e qualquer faculdade humana pode ser mal usada. O homem pode usar sua inteligência para escravizar um outro, sua imaginação para ludibriar, sua eloqüência para trair. Mas, se nào usasse essas faculdades, onde estaria% Usando seus poderes, o homem amplia continuamente o âmbito de suas realiza~òes. A tecnologia aumenta sua capacidade para fazê-lo.
A tecnologia pode criar ou destruir, tornar o homem mais humano ou menos. Mas as civilizaçôes. como os indivíduos, devem correr riscos se quise­rem progredir. Se exercermos prudência para minimizar os danos da tecnologia e incentivar ao máximo seus benefícios, certamente valerá a pena aceitar o risco.
I:x~a, G.F. A ciência como atir~idade humana. TraduÇào de Antonio José de Souzt. Rio de laneiro.~São Paulo: Zahar;'Edusp, 1980. p. 269-'0.
2. [Conversando com as máquinas]
Para Schaff. há necessidade de uma renovaCão da `filosofia do homem- ante os desafios da crise econômica e do desenvolvimento tecnológico. Os meios de comunicação. videotea-tos. computadores, hanco de dados, informações via satélite ou fibra óptica. etc.. estão a serviço do homem, e não o contrário.
Ao falar de influência da sociedade informática sobre o desenvolvimento da cultura, referimo-nos principalmente às novas possibilidades criadas para sua difusão.
É óbvio que o advento das novas técnicas de transmissão de informações ­que é o traço mais característico da sociedade informática - terá repercussões sobre a cultura. entendida no sentido mais amplo do terma. A invençào do rádio promoveu a cultura porque tornou possível - em especial com o advento dos transístores - chegar aos lugares mais remotos e praticamente inacessíveis. nào apenas com a difusão de notícia.s da atualidade. mas também com programaç cultu­rais de literatura. música e teatro. A televisão uouxe uma mudanÇa ainda mais profunda a esse respeito; as palavnas sâo acompanhadas de imagens, o que não apenas amplia os efeitos da palavra falada. como, além disso. permite a transmissão de outros efeitos estéticos não-verbais (obras de arte, paisagens de outros países. dança. etcJ e de novos valore.s educativos (filmes científicos, culturais. etc.).


Essas duas fontes de informação (denominadas corretamente de meios de comunicação de massa) viram-se recentemente completadas por uma invenção nova e muito surpreendente, que certamente revolucionará o ensino, em especial o autodidatismo. Refiro-me à didática propiciada pelos "autômatos falantes" que transmitem conhecimentos em diversos campos e estão programados de forma a estabelecer um "diálogo" com o estudante, fazendo-lhe perguntas e corrigindo as respostas equivocadas. [...J
Se a educação contínua há de ser um dos métodos (talvez o principal) capazes de garantir ocupações criativas às pessoas estruturalmente desemprega­das, então é fácil compreender a extraordinária importância da difusão do conhe­cimento (que constitui a base do processo social de aculturamento) por meio de novas técnicas de ensino. Atualmente, todavia, tais técnicas ainda estão no primei­ro estágio de desenvolvimento, mas já é possível intuir suas possibilidades futuras.
Apesar disso, esses professores autômatos são apenas um produto se­cundário de algo que é muito mais importante nesse campo: a tecnologia da informática. [...]
O computador é um produto do homem, portanto é parte da sua cultura. Essa tecnologia está destinada a revolucionar o processo de formação de cultura e hoje já testemunhamos o início dessa revoluçâo. O computador servirá a muitos fins: como supermemória artificial que aliviará bastante a carga de memória huma­na hoje necessária, tomando assim muito mais fácil o processo de ensino; como executor, com uma rapidez surpreendente, de operaçôes combinatórias; como idealizador de novos métodos de conhecimento humano em muitas disciplinas, incluindo aquelas que no início se acreditava estarem fechadas às técnicas informáticas (investigação histórica, jurisprudência, etc.); como fator de um pro­cesso mais ágil de aprendizado e de verificação dos conhecimentos do aluno
, também por meio do método da "conversação" com a máquina, etc.
ScruFr, Adam. A sociedade injorn~ática; as conseqüências sociais da segunda revoluçào indus­trial. Traduçào de Carlos Eduardo )ordào Machado e Luiz Arturo Obojes. 4. ed. São Paulo: Bcasiliense/Unesp, 1993. p. 72-4.
3. Do Japão
O poeta Gilberto Gil mos~tra aqui uma visào romántica da ternolog'ta.
Do Japão
quero uma câmera de filmar sonhos pra registrar nas noites de verão meu corpo astral, leve, feliz, risonho voando alto como um gavião;
que filme dentro da minha cabeça todo pensamento raro que eu mereça, toda ilusão a cores que apareça,
toda beleza de sonhar em vão.


Do Japão
quero também um trem-bala de coco pra atravessar túneis do dissabor; quero um microcomputador barroco que seja louco e desprograme a dor; visitar um templo zen-disbundista, conversar com um samurai futurista que me dê pistas sobre o sol-nascente, que me oriente sobre o novo amor.
Do Japão
quero uma gueixa que em poucos minutos da minha queixa faça uma paixão, descubra novos sentimentos brutos
e enfeiti~ada tome um avião
e a gente vá viver num oütro mundo,
pra lá do terceiro ou quano ou quinto mundo, onde a rainha seja uma açucena
e a divindade a pena do pavâo.
Gn, Gilbeno. "Do )apão.' In: Ga. Gilberto. O etenw Deus. .Nludança. Sào Yaulo: ~'EA, 1989.

PARA REFLETIR E RESPONDER
1. Comente a epígrafe do capítulo.
2. Estabeteça as possíveis relações entre ciência, técnica e tecnologia.
3. A ciência, a térnica e a tecnologia, com suas armadilhas, vão deswir o homèm~ O qüe você pensa sòbiè o tema.~ Faça uma redação a respeito. 4. Identifique em seu grupó de trabalho.a tendêncìa predominante: a fa­
vor; còntcá oti yin ressaivás ém fetàçà~'ao piog,resso ternológico: Faça uma síntese dos diferentes pontos de vista. Utílize também as idéias do capítúlo e das Leituras Complementares.
5. Discuta: "No futuro, o professor será substituído por um engenho auto­mato .
6. Homem ou computador: quem vence a partida de xadrez.? Discuta as possibilidades.
7. É possível humanizar a ternologia? EXplique.
8. Numa sociedade como a de hoje, dominada pela tecnologia e pela sofisticação dos inswmentos à disposiçâo do homem, ainda há lugar para a filosofia? Justifique sua resposta.

SUGESTÕES DE ATIVIDADES

l. A classe se divide em três grupos: o primeiro elaborará argumentos que reforçam a visão otimista em relaÇào à tecnologia; o segundo faz o mesmo em relaçàe à visào pessimísta: e o terceiro. o mesmo com a visâo moderada. O professor atuará como mediador do debate.
2. Recorte fotos de jornais e revistas e ilustre as principais idéias evpostas no texto de hneller (Leituras Complementares>.
3. Discuta com os colegas o tema: "Tecno(ogia como sinónimo de cultu­ra". L'til'sze como apoio o texto de Vargas citado ao longo do capitulo e o texto de Schaff (Leìturas Complementares ).
y. Assista ao filme Invasão de privacidade (Philip T~ovce, 1994 > e discuta-o em classe. consìderando o que foi exposto no capítulo.
~. .Analise e comente a composiçâo Do,Japàv. de Gilberto Gil.
(. Selecione em um jornal ou revista a notícia sobre algum avanço tecno­lógico. Depois. comente os benefícios e riscos dessa inovaçào.
". Em um livro lancado em 1990, ~fegateüdências 2000. os analistas norte­americanos Iohn \aisbitt e Patricia Aburdene enfocam as tendências de mudanÇa. Existe um daro tom otimista apontando para o início de uma nova conscientizaçâo em que as pessoas se preocuparào mais com a qualidade de vida. Discuta isso com seus colegas.


(*) SOUZA, Sonia Maria Ribeiro de. Um outro olhar: filosofia. São Paulo, FTD, 1995.


FACED/UFBA
Educação e Tecnologias
Contemporâneas
Prof. Menandro Ramos

Tecnologia: contra ou a favor do ser humano?(*)

Sonia de Souza

Nos sistemas tecnológicos do amanhã - rápidos. fluidos e auto-regula­dores - as máquinas lidarão com o fluxo de materiais físicos: os ho­mens com o fluxo de informação e percepção. Máquinas irão cada vez mais realizaras tarefas rotineiras; os homens, as tarefas intelectuais e criativas. As máquinas, assim como os homens, em vez de ficarem con­centradas em fábricas gigantescas e cidades industriais, estarão espalhadas através do globo, ligadas por um sistema de comunicação, impressionantemente sensível, quase instantâneo. O trabalho humano sairá da fábrica e do escritório massificado, para a comunidade e o lar.

Alvin Toffler, O choque do futuro.



S
e você ainda não leu, certamente já ouviu falar dos li­vros Admirável mundo novo (Aldous Huxley), 1984 e A revolu­ção dos bichos (George Orwell), Fahrenheit 4~1 (Ray Bradbury) e lUalden II (Burrhus E. Skinncr). Todos desaevem sociedades futu­ras dominadas pela máquina e pela tecnologia, organizadas politi­camente sob a força de regimes totalitários, em que o homem é constantemente manipulado, condicionado e dirigido a pensar, agir e sentir como um autômato, sem vontade própria e sem liberdade.

Nesses livros os autores passam uma visão extremamente pessimista de um mundo que resultou de um processo inexorável do avanço tecnológico e é comandado e administrado por entidades abstratas e dominadoras, do tipo Big Brother (Grande Irmão), às quais os homens se submetem fanaticamente, docil­mente e zelosamente. Para exemplificar, eis um pequeno trecho do livro 1984, de George Orwell (1979: 9-10):
O Ministério da Verdade - ou Miniver. em Novilíngua - era completamente dife­rente de qualquer outro objeto visível. Era uma enorme pirâmide de ativíssimo cimen­to branco, erguendo-se, terraço sobre terraco, trezentos metros sohre o solo. De onde estava Winston conseguia ler, em letras elegantes colocadas na fachada os três lemas do partido:
GUERRA É PAZ LIBERDADE É ESCRAVIDÃO IGNORÂNCIA É FOR(;A
I...1 O D1inistério do Amor era realmente atemorizante. Não tinha janela alguma. ü'inston nunca estivera lá, nem a menos de um quilômetro daquele edifício. Era um prédio impossível de entrar, exceto em função oficial, e assim mesmo atravessando um labirinto de rolos de arame farpado, portas de aço c ninhos de metralhadoras. Até as rua.s que conduziam às suas barreiras extemas eram percorridas por guardas de cara de Gorila e fardas negras, armados de porretes articulados.
Alguns filmes de ficçào científica também veiculam uma visão sombria do mundo de amanhã. A sociedade parece ter-se tornado sucata de um tempo de opulência e de riqueza proporcionadas pela tecnologia. Esta mostra-se, no futuro, falida e desbaratada, fonte de miséria, fome, dor e mazelas para o gênero huma­no. Exemplos de tais filmes são: Blade Rumner, o caçador d~ andróides: a série Mad Max; The day, after, Apocalipse now,: O ovo da serpente: 1984: entre outros.
Por outro lado, não há como negar o fascínio que a tecnologia exerce sobre o ser humano, materializada em produtos caros e sofisticados, atualmente verdadeiros símbolos do mundo moderno. Quem, hoje, não nutre um desejo secreto de possuir um telefone celular e utilizá-lo dirigindo um veículo monitorado por um computador de bordo% Quem já não ficou sem dinheíro no final de sema­na e dirigiu-se confortavelmente à cabine de um Banco 24 Noras. aproveitando também para pagar algumas contas e efetuar aplicações financeiras? Quem não se sente bem ao passar um final de semana acampando no meio do mato e sabendo que todo e qualquer recado será registrado em sua secretária eletrônica e que seus

programas prediletos na tevê estarâo gravados no videocassete? Quem pode ne­gar a sensação prazerosa de andar pelas ruas ouvindo no walkman suas músicas preferidas? Quem pode negar a economia de tempo e de Iocomoção que se ob­tém com a utilização do Jax para enviar mensagens e documentos, especialmente em situaçôes de urgência? Quem ainda nâo experimentou a praticidade de uma agenda etetrônica e de um notebook, companheiros diários dos profissionais que atuam nas mais diferentes áreas? Esses sào apenas alguns poucos exemplos de inovações tecnológicas que fazem parte do cotidiano do homem moderno ­ampliadas a cada dia pelas novas possibilidades da informática.
No entanto. é necessário registrar o incômodo eausado nos bancos, quando se tem pressa e o sistema fica fora do ar; a dificuldade causada pelos inúmeros botões do controle remoto da televisào. do videorassete e do aparelho de som nos diferentes usuários de diferentes fai.~:as etárias: o desconforto provocado pelo uso inicial do computador, geralmente acompanhado de perdas de arquivos importantes.
E, nesse cenário no qual a tecnologia ocupa o lugar de destaque, surge a seguinte questão: a tecnologia escraviza ou liberta o ser humano? Atua contra ou a favor?

Ciência, técnica e tecnologia

Ciência, técnica e tecnologia são palavras relacionadas entre si; ao se fazer referência a uma delas, inevitavelmente as demais surgem em cena.
A ciência é uma das formas de conhecimento elaboradas pelo ser huma­no para compreender racional e objetivamente o mundo com a finalidade de nele poder intervir em seu próprio benefício. \osa tomar a natureza inteligível ao apreen­der as regularidades existentes em um conjunto de fenômenos; tais regularidades são expressas posteriormente em leis e teorias que traduzem o esforço do homem em conhecer e explicar tudo o que é - ou seja, tudo o que existe natural ou necessariamente. Técnica. assim como tecnologia. provém do grego techne, que significa "arte" ou "habilidade'. Embora procedam da mesma raiz etimológica, técnica e tecnologia têm sido empregadas em sentidos diversos.

Técnica

A parte material de uma arte ou ciência. Conjunto dos processas 21e uma arte ou ciência (Diz-se em geral do aproveitamento racional e prático dos recursos naturais, e especialmente da aplicação das leis da natureza pata satisfazer as necessidades humanas) (Caldas Aulete, 1958: 4887).

Tecnologia

Tratado das artes em geral. O conjunto dos processos especiais relativos a uma determinada arte ou indústria. Explicação dos termos próprios das artes, ofícios. Linguagem especial das ciências, indústrias, artes, etc. Ciência que trata dos méto­dos e do desenvolvimento das artes industriais (CaIdas Aulete, 1958: 4887).


Na verdade, nâo há consenso sobre o significado último de técnica e tecnologia entre os diferentes autores que tratam do assunto. Assim, toma-se opor­tuno relacionar os sentidós mais usuais de tais termos. procurando verificar as relações existentes entre os componentes da tríade ciência, técnica e ternologia.
Origem da ciéncia e da técnica
A origem remota da ciência e da técnica se encontra no medo que o ser humano sentiu no seu énfre~tamento com a natureza e no desejo de poder, a fim de submetê-la e utilizá-la a seu favor.
Aos primeiros seres humanos. diante das tempestades, dos raios e trovôes. diante do temor despertado pelos animais ferozes que os rondavam, só restava buscar poder para combater o poder maior e esmagador das forças naturais. Aos poucos, as soluçòes mágicas, as soluçôes míticas e os rituais religiosos foram substituídos por conhecimentos e hahilidades utilizados na busca do poder do homem sobre a natureza. Ironicamente. na visão de Regis de Morais (1988: 49), o maior problema que hoje o homem enfrenta é `'nâo ter poder sobre seu próprio poder: o homem perdeu o controle sobre suas possibílidades".
Para Severino, a origem da técnica também resulta da intervençâo do homem na natureza. Enquanto a adaptação dos demais seres vivos à natureza resulta de um código genético previamente determinado, o ser humano cria meios e instrumentos que prolongam. agilizam e versatilizam os seus órgãos de sentidos e os membros de seu corpo, para retirar da natureza o que é necessário à sua sobrevivência. provocando também uma adaptaçâo da natu­reza a si mesmo:
Essa é a origem da técnica. pela qual os homens criam ferramentas e instrumentos mediante os quais vâcr interferir na natureza para transfortná-la em seu benefício. Ao atuarem assim sobre a natureza. os homens vào transformando-a. fazendo com que ela se adapte. até cetto ponto. às suas necessidades. Enquanto os demais seres vivos u adaptam às condiÇ«es of~recidas pela natureza, os homens. emhora necessitem da mesma forma se aclequar a eln. vào conseguindo que ela também se adapte a eles (Severino. 1992: l ~3 ).
A ciëncia precede a técnica ou a técnica conduziu ao desenvolvimento das ciências? Para Vargas (199~: 3-12), a técnica como um simples saber-fazer manual é uma atividade humana tão antiga quanto a própria linguagem, surgindo juntamente com ela "na aurora da humanidade":
A térnica é assim uma atividade humana baseada num aprendizado simbólico; i.tto se dá quando na mente do fahricante forma-se a imagem do objeto fabricado. A paleoetnologia atual vem demonstrando euidéncias claras desse processo. Por isso é que ela pode aperfeicoar-se ao longo dos anos: pois traz consigo a propriedade dos símholos lingüísticos de. associando-se entre si. denotarem situaçòes e objetos nowos a serem im·entados (Vargas. 1990: ~).
A técnica evoluiu de um estado mítico, onde os segredos do saber-fazer instrumentos eram revelados aos homens pelos deuses, até o estado artesanal, onde o mestre. pessoa individual e autor dos processos técnicos, passou a ensiná­la aos aprendizes. de geraçào a geraçào:


categoria do saber, a térnica, à categoria do fazer. I~ào no sentido de que esta se reduza a uma pura ativ·idade mecànica, mas porque constituída de um conjunto de nomias destinadas a dirigir efiazmente a açào a uma determinada Fmalidade.
Esse sentido geral da térnica é restrito às normas que possibilitam e faéilitam o domínio do homem sobre a natureza, ou seja. às térnicas de produç~ào. Aí entram, por exemplo, as térnicas agrícolas, industriais, de automaç~ào, da cibemética, etc.
Tecnologia: ~ersão elaborada da técnica
Cabe agora um exame mais detalhado do terceiro elemento da tríade, a tecnologia, tema polêmico e recente, objeto de estudo e reflexão ndo só de cien­tistas, mas de filósofos particularmente interessados no assunto.
Quando se quer ampliar os conhecimentos relativos a um determinado tema, nada mais útil do que começar verificando como os especialistas conceituam o termo em questào.
Segundo Kneller ( 1980: 245-6):
A tecnolof;ia é essencialmente uma atividade prãtiCa, a qual consiste mais em alte­rar do que em compreender o mundo. Onde a ciéncia persegue a verdade. a ternolo­gia prega a eficiéncia. Enquanto a ciéncia procura formular as leis a que a natureza ohedece, a tecnologia utiliza essas formulaçìx~s par.~ criar implementos e aparelhos quc façam a naturezv of~edecer ao homem. Tal conw a ciéncia. entretanto. a tecnolcr gia é uma entidade imensamente complexa que consiste em fenómenos de muitas espécies - agentea. instituic8es. produtos, conhecimentos, técnicas. etc. I...] Analiso­a como uma atividade historicamente em desem~olvimento para a construcào de má­quinas e outros anefatos. im~ençào de técnicas e processos. cria~ão e transformacào de materiais e organizaçào de trahalho. dc modo a satisfazer necessidades hwnanas.
Para Medeiros e Medeiros (1993: ~-S) `a tecnologia é o conhecimento utilizado na criaçào ou aperfeiçoamento de produtos e sen,iços, ou melhor, a tecnologia é o conjunto de conhecimentos, práticos ou científicos, aplicados à obtençào. distribuiçâo e comercializaçào de bens e sen,iços".
Segundo esses autores, a tecnolo~ia está presente em todos os setores da vida humana, permeando as diversas atividades humanas, com o intuito de satisfazer desejos e necessidades, substituir, aliviar ou simplificar o esfor­ço físico e mental despendidos na realizaçào das mais diferentes tarefas, bem como liberar energias para tarefas mais criativas e interessantes. No entanto, alertam para os possíveis danos resultantes do mau uso da tecnologia, como o desemprego e a destruiÇào do meio ambiente. Técnica e.tecnologia, na visâo desses autores, não sâo sinônimos, embora mantenham entre si um certo parentesco:
A técnica está as.sociada à nopo do `fazew, isto é. habilidade ou arte inata ao homem. A tecnologia une essa habilidade natural aos conhecimentos - práticos ou científicos - que foram sendo acumulados ao longo dos anos. Os estudiosos afimaam que a técnica resolve os prohlemas fundamentais do homem. A tecnologia satisfaz tamhém seus deseios le sonhos). [...] .A tecnologia possui significado próprio. Ela nào é o estudo da técnica. mas sim sua versão mais elahorada. [...J .A tecnologia não se confunde (...] com os prcxlutos que aiuda a fahricar. Ela é maís ahstrata (ou menos palpável) e incorpora a arte, a cultura, os conhecimentos e as térnicas do país que investiu' muito tempo e dinheiro para chegar a um determinado estágio de desenvol­vimento intelectual e material (Medeiros e Medeiros, 1993: 9, 12, 32 e 33).
A ciência, por sua vez, tem sido a grande aliada do desenvolvimento tecnológico:
É o conhecimento científico que está na base da fabricação de artigos mais refina­dos e no deserivolvimento de métodos e processos avançados em áreas como saúde, agricultura e transporte. [...1 A maioria dos cientistas tem os pés solidamente fincados no chào de universidades e centros de pesquisa, onde se investem bilhões de dólares na criaçào de produtos que vào ser amplamente consumidos. A tecnologia não é mais fruto de sonhos'ou delírios individuais. como bem demonstra o exemplo dos criativos
~ japoneses: resulta de políticas defmidas e de programas de trabalho muito bem-estru­turados (Ibidem: 18).
A tecnologia é hoje um produto submetido às leis do mercado e à aprova­cão de consumidores cada vez mais exigentes. É uma mercadoria especial, nem sempre disponível nas prateleiras, e sua comercialização ou transferência, muitas vezes, é fruto de demoradas negociações e transações.
Vargas (1990: 3) faz uma séria crítica à concepção da tecnologia como mercadoria que se vende e/ou se compra. A seu ver, a tecnologia é cultura que se adquire à medida que os homens evoluem:
[A tecnologial não poderá ser entendida como mercadoria que se vende ou compra, mas sim como saber que se aprende: isto é, cultura. Note-se que cultura é constituída pelo acervo de saberes, anes e aenças de um povo, quando esse acervo é subordinado à unidade de ponto de vista que o caracteri~a como tal. Assim, a ternolog'ta é cultura quando unificada a todas as outras manifestaçì~es sapienciais e anística-s de um determinado povo. Mas, quando ela é entendida como objeto ~solado de transaçòes comerciais. não pode mais ser considerada cultura.
Para Mammana (1990: 13), "hoje há uma crença generalizada de que a tecnologia é uma espécie de poçâo mágica que pode ser engarrafada e transpor­tada de um lado para outro e, quando inàlada por uma naçào subdesenvolvida, é capaz de libertar-lhe o espírito do desenvolvimento econômico ".
Segundo esse autor, tecnologia deveria nomear a ciência que estuda a técnica. Sendó a técnica arte ou ofício, tecnologia deveria ser uma das ciências antropológicas. No entanto, hoje confunde-se a ciência com o seu objeto de estudo e tal confusão "beneficia somente aqueles que fazem, como na Idade Média se fez com as indulgências, do místico intangível um comér­cio rentável" (Mammana, 1990: 14).
Na verdade, a tecnologia em si mesma não é boa nem má. 0 uso que se faz dela, no entanto, pode trazer benefícios ou prejuízos para a humanida­de. Diversos autores concordam com a concepção da técnica como um re­curso do qual os homens se utilizam para um aproveitamento mais benéfico, eficaz e eficiente da natureza para sua sobrevivência e subsistência. Sob essa óptica, a técnica é vista como uma extensão do processo de adaptaçâo do ser humano à natureza: a relação do homem com a natureza é mediada pela técnica, relaçào essa geralmente revestida de um aspecto harmonioso, graças à intervençâo positiv a ,da técnica.

No entanto, a tecnologia tem sido alvo de críticas, por ser considerada dominação inconseqüente da natureza, a setviço de interesses comerciais, indus­ttiais, militares, entre outros, muitas vezes inescrupulosos, cujos resultados podem ser prejudiciais ao homem. A esse respeito, sào muito oportunas as afirmaçòes de Buzzi e Severino. O primeiro (1987: 84-7) escreve:
A térnica é, pois, uma modalidade de verdade, a revelaçào de aspeaos escondidos da velha natureza que vivemos. Nela se manifestam os entes que nos cercam, que andam junto a nós desde sempre no escondimento.
Conseqüentemente, a técnica nào só produz uma revelaçào fantástica da nature~a. Produz também nossa maneira de morar. Produz a nossa habitação, o nosso aconche­go na tetra, a nossa compreensào da natureza.
A modemidade, porém, está mais na tecnologia que na térnica. [...)
A tecnologia é o Leviatà da modemidade. Levtatà que comanda. Quem dirige e encomenda a pesquisa científica é hoje a tecnolog'ta. Por isso, as universidades perde­ram em grande pane o senso da ciéncia. Perdeu-o também o próprio cientista, que está encarregado de pesquisar dentro de amplos programas cuja finalidade ele desco­nhece. Quer dizer, pesquisa sem ver a finalidade da pesquisa. Hà pesquisas encomen­dadas por centros de tecnologia e feitas sem que os cientistas jamais saibam de sua finalidade.
A ternologia plasmou a sociedade modema como indus~rial. I...l
O que a tecnologia vai fazer com a energia acumulada, armazenada e controlada? Vai produzir arlefatos, máguimrs e produ~os químicos que a natureza nem sequer produz. E nesta produçào está a diferenCa maior entre a técnica e a ternologia. Esta se vale da ciéncia para inspecionar e dominar a natureza, para constrangé-la a compor­tar-se segundo o programa da vontade de dominaçào.
Severino (1992: 184), ao mesmo tempo que destaca a importância do desenvolvimento da ciência e da técnica para o progresso da humanidade, adver­te para os perigos advindos da "instrumentalizacão da razâo":
E a ciéncia, que pretendia lihertar os homens dos determinismos da natureza, das doenças. da miséria. acabou se transformando numa nova fomta de opressào para os mesmos homens! A razào que construía a ciéncia. de razào libertadora, como queriam os pensadores modemos, acabou se transformando em razào instrumental que, por meio de seu controle lógico-tecnológico. implantou uma tecnocracia: toda a vida humana é coriduzida e detemtinada pelos padròes térnicos impostos pela ciéncia. E o que é pior, o poder da ciéncia e da técnica passa a ser controlado e usado por grupos humanos na defesa de seus interesses particulares. Ele se transformou num instru­mento fone e adequado para a dominação e a exploraçào políticaa? A vida das pes­soas nào é mais referida a critérios éticos e políticos. mas a critérios puramente térni­cos! 1...] Como se tudo se submetesse às regras da produçào industrial.
No que diz respeito à tríade ciência, técnica e tecnologia, é possível perce­ber três posicionamentos distintos: otimismo e entusiasmo crescentes: pessimismo sombrio; e uma atitude de moderação, que convida à utffização das três quando 0 resultado é proveitoso; e recomenda cautela e prudência, quando prejudicial ao homem e ao meio ambiente.

A ternologia é um fenômeno recente na história da humanidade. Surge a partir da primeira revoluçào industrial, ocorüda entre o final do século XVIII e início do século ~X e seu mérito reside na substituição da força fisica do homem pela energia da máquina (inicialmente pela utilização do vapor e posteriormente pela utilizapo da eletricidade) no processo de produçâo.
Tecnologiá: um salto libertador
Atualmente se presencia a ocorrência da segunda revolução industrial, apoiada em uma 'tríade revolucionária - microeletrônica, microbiologia e ener­gia nuclear" - e que tem como característica fundamental a ampliação das capa­cidades intelectuais do homem, substituídos por autômatos, além da eliminação bem-sucedida do trabalho humano na produção e nos serviços.
Segundo Adam Schaff, pensador maraista polonês, a primeira e a segunda revoluçâo industrial se assemelham no que diz respeito à ocorrência de um "salto qualitativo operado no desenvolvimento da tecnologia da produção°. No entanto, se a primeira revolução facilitou e incrementou o rendimento do trabalho huma­no, a segunda tem como finalidade a elimina~ào total desse trabalho.
Na visâo desse autor (1993: 22-3):
Isso significa, por um lado. a liberta~ào do homem da maldiçào divina do Velho Testamento, segundo a qual ele deveria ganhar o pão de cada dia com o suor do seu rosto: por outro lado. todavia. esta nova revoluçào coloca uma série de problemas sociais ligados à necessidade de se encontrar uma instituiçào que possa substituir o trabalho humano tradicional, seja como fonte de renda que permita ao homem satis­fazer suas necessidades materiais, seja como fonte tradicional de "sentido de vida', entendido como fundamental para a saàsfaçào das suas necessidades não-materiais, isto é. das suas necessidades espirituais.
Schaff companilha com outros autores a visào otimista acerca da ternologia. Embora o desemprego estrutural (perda do emprego em decorrência da automação e da robotizaÇâo da produção e dos serviços produzidas pela revoluçào da microeletrônica) seja um fenômeno inerente à efetivaçào da segunda revoluçào industrial, ela-'conduzirá a uma sociedade em que haverá um bem-estar sem precedentes para o conjunto da populaçào (incluindo as pessoas afetadas pelo desemprego estrutural) como também alcançará um nível sem precedentes do conhecimento humano do mundo" (Schaff, 1993: 1~3).
Para os otimistas, é através da tecnologia que o homem recuperará a felicidade e a soberania sobre a natureza tal como havia antes da expulsâo do Paraíso.
Enguita f 1991: 230-1) relata de uma forma extremamente bem-humorada o entusiasmo e o afà daqueles que vëem na tecnologia um recurso quase mágico para libertar o homem moderno de tudo aquilo que é desagradável, rotineiro, estressante, em especial o trabalho:

Para os moderados, a saída está no meio-tetmo, isto é, no encontro de soluções que permitam prever e minimizar as diFculdades, os problemas e os riscos próprios de tudo aquilo que é novo, em especial do que se denomina inovaçâo tecnológica.
~ Talvez não seja possível voltar a beber das águas de um rio como 0 Tietê, em virtude da poluição: no entanto, seria bastante t'azoável se os pei~:es pudessem voltar a viver em suas águas.
v Talvez nào seja possível estancar o processo de automaçâo e robotiza­Ção das indústrias e dos escritórios: no entanto, é necessário controlar a velocida­de de introdução de novas tecnologias para que o homem se adapte a essas mudanças e sejam a\,aliados criteriosamente os impactos de tais transformaçôes sobre o meio ambiente.
~ Talvez nào seja possível evitar o "desemprego estrutural", porém, pode­se pensar na redução da jornada de trabalho como altemativa para manter grande parte da população no sistema produtivo.
~ Talvez nào seja possí\'el recuperar o que se perdeu da camada de ozônio. mas é importante e necessário encontrar saídas para a eliminaçâo dos gases poluentes.
Esses sào apenas alguns esemplos de posturas assumidas pelos modera­dos diante da tecnolol;ia. Na \'erdade, nào se trata de impedir o advento da modernidade. mas de se saber em que medida aderir às maravilhas da "terceira onda" trazidas no hojo da tecnologia. responsabilidade individual e social dos homens e das diyersas instituiçòes sociais que compartilham hoje a existência de um mundo transformado pela segunda revolução industrial:
A tecnologia alimenta a engenharia. a indústria e a agricultura. c é alimentada pelas ci~ncias aplicadas e estas pclas ciéncias hásicas. nlas nào há um contato direto entre essas várias instàncias. Entre elas há o que se ¡x~de chamar de "filtros sociais". consti­tuídos ¡~or órgàos de educacào. de gerenciamento e orientacào científicos e tecnoló~i­cos. comunidades científicav e profissionais. e. tamhém. a opiniào púhlica e os gover­nos. Sào tais "filtros- que apressam ou retrasam o desem~olvimento tecnológico e julgam a com~eniW cia ou adaptahilidade das tecnologias. Enfim. sà~ esses tamhém que atuam como instânciaç éticas para julgar o perigo ou a monlidade de uma deter­minada~açào tecnológica l\'argas, 1990: 8).
Norhert ü%iener (1970: 1~9). o "pai da cihemética". embora ciente das dificuldades e emharaços que possam advir da tecnologia. deposìta confiança e esperança na lucidez humana capaz de encaminhar o desenvolvimento tecnológico de modo a heneficiar a humanidade de forma positiva e satisfatória:
A nova rwoluçào industrial é. ¡x~is. uma espada de dois gumes. I'ode ser usada para o henefício da humanidade. mas somente se a humanidade sohreviver o hastante para ingressar num perícxlo em que tal hcnefício seja ~Ossível. I'ode ser tamhém usada para destruir a humanidade. e. se nào for empreFcida inteligentemente, pcxle avançar muito nesse caminho. Há. contudo. sinais esper.tyasos no horizonte.


No reino dos chips
A revolução microeletrõnica, a revolução da microbiologia e a revoluçâo energética, denominadas `tríade revolucionária", são os componentes básicos da segunda revolução industrial. Como tudo que faz parte do mundo, apresentam efeitos positivos e negativos.
Relógios de quartzo, calculadoras de bolso (nas suas mais variadas e incrementadas versões), agendas eletrônicas, televisão em cores, televisào a cabo, toca-discos laser, os diversos utensílios domésticos (microondas. geladeira, freezer. máquinas de lavar roupa e lou~a).,jaa. noteboo~t:s. computadores (dos mais dife­rentes portes) sào produtos da revolu~ão da microeletrônica.
As conquistas espaciais, a automação das indústrias e escritórios. a utiliza­çào de robôs nas linhas de montagem (especialmente da indústria automobilísti­ca ), a moderna tecnologia militar apoiada na energia termonuclear, tamhém resul­tam do avanco da microeletrônica.
Sào inegáveis, sem dúvida, os benefícios dessas inovações tecnológicas: economia de tempo e esforço na realização de inúmeras atividades: maior produ­tividade com mais qualidade: maior conforto e bem-estar. seja no lar ou no am­biente de trabalho: indivíduos mais esclarecidos e universalmente instruídos pela abundância de informações e acúmulo de conhecimentos à disposiÇâo de todos na moderna sociedade informatizada.
Por outro lado. o mundo e a humanidade podem ser destruídos em pou­cos segundos; o aumento desconfortável do desemprego estrutural lança milhares de seres humanos a uma situaÇào de ócio forçado e não-planejado: a possibilida­de de armazenamento de informaçves nos computadores torna o indivíduo mais vulnerável e ameaÇa sua liberdade pessoal e sua privacidade: a manipulaçào de toda uma sociedade por regimes totalitários, bem como a massificação e uniformi­zaçào de padròes de conduta, capazes de romper os limites geográficos de cada nação. transformando o mundo numa imensa `aldeia global". são riscos que ame­açam cotidianamente a eaistência do homem.
A clonagem dos seres
~o limiar do século J~, a descoberta e gradual decifraçào do código genético dos seres vivos e a possibilidade de o homem interferir e dominar a natureza orgânica em geral. e inclusive o seu próprio `eu". determinou uma revo­luçâo no campo da biologia, especialmente da microbiologia. da qua) resultou a engenharia genética.
Taís avanços permitem ao homem modifìcar o código genético inato de plantas e animais, bem como desenvolver novos códigos. Tornam possível a pro­duçào de novas variedades de plantas e animais mais resistentes às doenças, mais adaptadas às condições naturais desfavoráveis e mais ricas em componentes ne­cessários à subsistência do homem.

Dessa maneira, o combate à fome e à desnutrição encontra um grande aliado no progresso da engenharia genética, que de modo bastante eficaz também pode auxiliar o homem na luta contra as doenças congênitas. Por outro lado, a revolução microbiológica pode tomar realidade os pesadelos registrados nos li­vros e filmes de ficçào científica:
Ingeréncia na personalidade humana, produção artificial de seres humanos com diversas cancterísticas `encomendadas' com antecedéncia (imaginemos, por exem­plo, a -encomenda' de seres "obedientes" a este ou àquele regime totalitário), ou também a produçào de um ceno número de indivíduos idênticos no que se refere às caraaerísticas físicas e mentais (através da utilização da térnica do clone) (Schaff, 1993: ? W .
A revoluçào energética caracteriza-se pela descobetta de novas fontes de energia, como a energia solar, a geotérmica e a energia das marés (mares e ocea­nos), bem como pela otimização das fontes tradicionais (eletricidade e petróleo) e das fontes subaproveitadas, como a energia dos ventos e a das correntes fluviais.
Na verdade, o progresso da humanidade depende em grande parte do sucesso na busca de novos recursos energéticos, em face da insuficiência e esgo­tamento dos atuais. No entanto, a energia nuclear, a despeito de seus benefícios, não deixa de ser uma constante ameaça à sobrevivência da espécie humana e do próprio globo terrestre.
Sem dúvida. nào há como negar os efeitos positivos da tecnologia, tanto quanto é preciso atentar para seus efeitos negativos:
É estranho como tantas ìnovaçi~es bem-intencionadas acarretam conseqüéncias variáveis. Por um lado. a medicina dobrou o tempo médio de vida, eliminou numero­sas doencas. aholiu muitas formas de dor e forneceu os meios de efetivo controle da natalidade. Por outro lado, ao controlar o número de mones, criou uma explosão demográfica. a qual continua porque os meios de controle da natalidade sào larga­mente ignorados. Na agricultura, a `revolução verde" possibilita a aboliçào da fome; entretanto. os alimentos nào sào distrihuídos igualmente, e muita gente está morrendo de fome. ~os transportes, na construçào e no suprimento de energia, as invenções melhoram a qualidade de vida; contudo. a produpo energética e o motor de combus­tão intema poluem o ar e a água. A energia nuclear toma possível um holocausto nuclear: mas pode fomecer energia quando se esgotarem as reservas de combustíveis fósseis. O computador ameaça convener-se no Big Brother; no entanto, ele nos ajuda a controlar complexos processos sociais. A hiologia molecular acena com a esperança de aholir as doenças e criar um suprimento permanente de alimentos, mas existe a possihilidade de que. algum dia. seja usada para criar uma elite de génios maléficos e uma multidão de seguidores embrutecidos (Futeller, 1980: 265).
Nem todo mundo vê na tecnologia a soluçâo para as dificuldades que o homem enfrenta. Dluito pelo contrário, ela tem sido apontada como a vilã da história da humanidade que caminha para um futuro sombrio, egoísta e constan­temente ameaçado pela destruição engendrada pelas próprias inovações ternológicas.
Nesse cenário pessimista, o homem aparece como a primeira vítima de sua própria criação. A tecnologia escapa ao seu controle, cai nas mãos de gru­pos minoritários, movidos por interesses particulares, que a utilizam muitas ve­zes de forma inescrupulosa para favorecer e beneficiar apenas um número res­trito de pessoas, em detrimento de uma maioria ingênua, iludida e facilmente manipulável, seduzida por uns poucos atrativos exercidos pelos produtos da moderna tecnologia.
Fala-se atualmente na cultura do ter em substituiÇão à cultura do ser, como conseqüência direta do desenvolvimento tecnológico. As necessidades essenciais dos homens sào substituídas por desejos imediatos e efêmeros, sendo o homem avaliado não mais em função do que ele é, mas em função do que tem ou possui.
Comenta-se a respeito do "vazio existencial°, como resultado da perda do sentido da vida em conseqüência da gradual extinção de um de seus mais fortes referenciais, a saber, o trabalho. Mas quem compartilha dessa visâo desalentadora acerca da tecnologia esquece, em última instância, que ela é um produto do homem e, como tal, está nas mãos de seus criadores e operadores, e nào o inverso.
Nesse sentido, podemos concordar com Regis de Morais ( 1988: 166) quando afirma que "o grande problema da civilização científico-tecnológica não é de ciên­cia nem de técnica. É um problema filosófico".
Cabe ao homem rever e reavaliar o encaminhamento do desenvolvimento tecnológico, seguindo adiante com todas as inovaçòes que lhe possam ser úteis e examinando os riscos que ameaçam despersonalizar a si mesmo e descaraaerizar o ambiente em que vive. Essa reflexâo em busca de uma humanizaçâo da ternologia deve e pode ser mediada pela filosofia, que fornecerá ao homem os subsídios necessários para o estabelecimento de um novo modus r,,ivendi diante de um processo de transformação irreversível.
Mais do que nunca a nova sociedade tecnólogica necessita de homens críticos e criativos capazes de entender e direcionar de forma responsável o pro­cesso de mudanças que ocorrem em ritmo cada vez mais acelerado:
A ternologia do amanhà requer não milhòes de homens levemente alfabetizados, prontos para trabalhar em uní.~.sono em tarefas infinitamente rtpetitivas, nem homens que recebem ordens sem piscar. con.scientes de que o pào se consegue com a submi.s­sào mecànica à autoridade, mas sim de homens que possam fazer julgamentos críti­cos, que possam abrir caminho através dos ambientes novos, que sejam rápidos na identificaçào de novos relacionamentos numa sociedade em rápida mutaçào (Toffler, 1970: 323-4).
A despeito das dificuldades que deverâo ser superadas em função da gt~adual extinção do trabalho humano, em sua fomla tradicional. e o conseqüente desemprego estrutural, é necessário perceber nesse processo uma oportunidade de um homem com mais tempo livre para investir em si mesmo, em busca de mais

conhecimento, autonotnia e criatividade, elementos imprescindíveis na reconstru­ção de uma cultura novamente embasada no ser e não mais no ter.
Quanto à automação propriamente dita, .ela representa o f m do trabalho como necessidade de sobrevivéncia. Fecha-se. assim, um ciclo hiscórico que durou dez mil anos e se irticiou com a agricultura muscular. Com o término do trabalho finda-se, também. a alienaçào dos frutos desse trabalho. Inicia-se a Civilizaçào do Lazer. Pela primeira vez. em seu todo. a humanidade vence a carência e conquista a abundància. É o pleno domínio da natureza. Doravante todos os homens - teoricamente ­podem ter acesso à reflexào, ao mundo da cultura e à plena gratificaçâo (Muraro, 1974: 63).
A humanização da ternologia se fundamenta na ação livre e responsável do homem na tomada de decisões para o redirecionamento do seu próprio futuro. Está nas mãos de cada homem em particular, e da sociedade como um todo. o destino da humanidade e a possibilidade de uma existência pacífica e hatmoniosa:
A sociedade informática proporcionar.í os pressupostos para uma vida humana mais feliz: eliminaní aquilo que tem sido a principal fonte da má qualidade de vida das massas na ordenaçào do cotidiano: a miséria ou. pelo menos. a privaçào. Ahrird possibilidades pact a plena auto-realizaçào da personalidade humana. seja liberando o homem do árduo trabalho manual e do monótono e repetitivo trahalho intelectual. seja lhe oferecendo tempo livre necessário e um imenso progresso do conhecimento disponível. suficientes para garantìr seu desenvolvimento. Desse modo. o homem receberá tudo o que constitui o fundamento de uma vida mais feliz. Todo o restante dependerá dele. de sua atividade individual e social (Schaff. 199.i: l~-t-~).
1. [Tecnologia: um risco inevitávef]
A seguir. um texto didático de George üneller, que mostra a interdependéncia entre ciëncia e tecnologia.
Hoje. ciência e tecnologia sào interdependentes. Da ciência. a tecnologia deriva conhecimentos básicos. instrumentais e técnicas. Da tecnologia a ciência' recebe instrumentos e problemas para soluçâo. A ciência e a tecnologia interatuam no domínio da ciência aplicada que é a investigaçào de problemas cujas soluções se espera sejam tecnologicamente aplicáveis.
A tecnologia expressa e desenvolve os i·alores culturais existentes. Pa­droniza até as vidas e os valores de seus usuários, como no caso do relógio. da máquina a vapor. da linha de montagem e do computador. Através de sua dinâ­mica interna. a tecnologia faz exigências aos que a desenvolvem. Para a organi­zaçào de seus maiores projetos cria burocracias. A tecnologia habilita as pessoas a fazerem coisas que elas não poderiam ter feito de outro modo. embora certas escolhas tecnológicas excluam inevitavelmente outras. (Uma sociedade que pre­feriu o automóvel particular ao transporte público terá dificuldade em voltar atrás.) I~ào obstante, a tecnologia como tal não é autônoma: ela é criada por seres humanos e está suhordinada essencialmente aos valores culturais e deci­sões govemamentais. [...]


O caminho mais sensato é almejar um progresso limitado e manter seus inevitáveis custos em nível mínimo.
Alguma inovação tecnológica é essencial e desejável. Ela tem sido neces­sária à modernização de todas as sociedades, e habilitará a nossa a sobreviver e melhorar. O desenvolvimento de novas ternologias deve ser encorajado e o trei­namento de tecnólogos imaginativos, promovido. (...]
A tecnologia não ficará sob controle social enquanto os partidos po­líticos nâo propuserem diretrizes específicas para tal. Com vistas à acelera­çâo desse processo, deverá haver o debate mais amplo possível e a difusào de informa~ões.
Toda e qualquer faculdade humana pode ser mal usada. O homem pode usar sua inteligência para escravizar um outro, sua imaginação para ludibriar, sua eloqüência para trair. Mas, se nào usasse essas faculdades, onde estaria% Usando seus poderes, o homem amplia continuamente o âmbito de suas realiza~òes. A tecnologia aumenta sua capacidade para fazê-lo.
A tecnologia pode criar ou destruir, tornar o homem mais humano ou menos. Mas as civilizaçôes. como os indivíduos, devem correr riscos se quise­rem progredir. Se exercermos prudência para minimizar os danos da tecnologia e incentivar ao máximo seus benefícios, certamente valerá a pena aceitar o risco.
I:x~a, G.F. A ciência como atir~idade humana. TraduÇào de Antonio José de Souzt. Rio de laneiro.~São Paulo: Zahar;'Edusp, 1980. p. 269-'0.
2. [Conversando com as máquinas]
Para Schaff. há necessidade de uma renovaCão da `filosofia do homem- ante os desafios da crise econômica e do desenvolvimento tecnológico. Os meios de comunicação. videotea-tos. computadores, hanco de dados, informações via satélite ou fibra óptica. etc.. estão a serviço do homem, e não o contrário.
Ao falar de influência da sociedade informática sobre o desenvolvimento da cultura, referimo-nos principalmente às novas possibilidades criadas para sua difusão.
É óbvio que o advento das novas técnicas de transmissão de informações ­que é o traço mais característico da sociedade informática - terá repercussões sobre a cultura. entendida no sentido mais amplo do terma. A invençào do rádio promoveu a cultura porque tornou possível - em especial com o advento dos transístores - chegar aos lugares mais remotos e praticamente inacessíveis. nào apenas com a difusão de notícia.s da atualidade. mas também com programaç cultu­rais de literatura. música e teatro. A televisão uouxe uma mudanÇa ainda mais profunda a esse respeito; as palavnas sâo acompanhadas de imagens, o que não apenas amplia os efeitos da palavra falada. como, além disso. permite a transmissão de outros efeitos estéticos não-verbais (obras de arte, paisagens de outros países. dança. etcJ e de novos valore.s educativos (filmes científicos, culturais. etc.).


Essas duas fontes de informação (denominadas corretamente de meios de comunicação de massa) viram-se recentemente completadas por uma invenção nova e muito surpreendente, que certamente revolucionará o ensino, em especial o autodidatismo. Refiro-me à didática propiciada pelos "autômatos falantes" que transmitem conhecimentos em diversos campos e estão programados de forma a estabelecer um "diálogo" com o estudante, fazendo-lhe perguntas e corrigindo as respostas equivocadas. [...J
Se a educação contínua há de ser um dos métodos (talvez o principal) capazes de garantir ocupações criativas às pessoas estruturalmente desemprega­das, então é fácil compreender a extraordinária importância da difusão do conhe­cimento (que constitui a base do processo social de aculturamento) por meio de novas técnicas de ensino. Atualmente, todavia, tais técnicas ainda estão no primei­ro estágio de desenvolvimento, mas já é possível intuir suas possibilidades futuras.
Apesar disso, esses professores autômatos são apenas um produto se­cundário de algo que é muito mais importante nesse campo: a tecnologia da informática. [...]
O computador é um produto do homem, portanto é parte da sua cultura. Essa tecnologia está destinada a revolucionar o processo de formação de cultura e hoje já testemunhamos o início dessa revoluçâo. O computador servirá a muitos fins: como supermemória artificial que aliviará bastante a carga de memória huma­na hoje necessária, tomando assim muito mais fácil o processo de ensino; como executor, com uma rapidez surpreendente, de operaçôes combinatórias; como idealizador de novos métodos de conhecimento humano em muitas disciplinas, incluindo aquelas que no início se acreditava estarem fechadas às técnicas informáticas (investigação histórica, jurisprudência, etc.); como fator de um pro­cesso mais ágil de aprendizado e de verificação dos conhecimentos do aluno
, também por meio do método da "conversação" com a máquina, etc.
ScruFr, Adam. A sociedade injorn~ática; as conseqüências sociais da segunda revoluçào indus­trial. Traduçào de Carlos Eduardo )ordào Machado e Luiz Arturo Obojes. 4. ed. São Paulo: Bcasiliense/Unesp, 1993. p. 72-4.
3. Do Japão
O poeta Gilberto Gil mos~tra aqui uma visào romántica da ternolog'ta.
Do Japão
quero uma câmera de filmar sonhos pra registrar nas noites de verão meu corpo astral, leve, feliz, risonho voando alto como um gavião;
que filme dentro da minha cabeça todo pensamento raro que eu mereça, toda ilusão a cores que apareça,
toda beleza de sonhar em vão.


Do Japão
quero também um trem-bala de coco pra atravessar túneis do dissabor; quero um microcomputador barroco que seja louco e desprograme a dor; visitar um templo zen-disbundista, conversar com um samurai futurista que me dê pistas sobre o sol-nascente, que me oriente sobre o novo amor.
Do Japão
quero uma gueixa que em poucos minutos da minha queixa faça uma paixão, descubra novos sentimentos brutos
e enfeiti~ada tome um avião
e a gente vá viver num oütro mundo,
pra lá do terceiro ou quano ou quinto mundo, onde a rainha seja uma açucena
e a divindade a pena do pavâo.
Gn, Gilbeno. "Do )apão.' In: Ga. Gilberto. O etenw Deus. .Nludança. Sào Yaulo: ~'EA, 1989.

PARA REFLETIR E RESPONDER
1. Comente a epígrafe do capítulo.
2. Estabeteça as possíveis relações entre ciência, técnica e tecnologia.
3. A ciência, a térnica e a tecnologia, com suas armadilhas, vão deswir o homèm~ O qüe você pensa sòbiè o tema.~ Faça uma redação a respeito. 4. Identifique em seu grupó de trabalho.a tendêncìa predominante: a fa­
vor; còntcá oti yin ressaivás ém fetàçà~'ao piog,resso ternológico: Faça uma síntese dos diferentes pontos de vista. Utílize também as idéias do capítúlo e das Leituras Complementares.
5. Discuta: "No futuro, o professor será substituído por um engenho auto­mato .
6. Homem ou computador: quem vence a partida de xadrez.? Discuta as possibilidades.
7. É possível humanizar a ternologia? EXplique.
8. Numa sociedade como a de hoje, dominada pela tecnologia e pela sofisticação dos inswmentos à disposiçâo do homem, ainda há lugar para a filosofia? Justifique sua resposta.

SUGESTÕES DE ATIVIDADES

l. A classe se divide em três grupos: o primeiro elaborará argumentos que reforçam a visão otimista em relaÇào à tecnologia; o segundo faz o mesmo em relaçàe à visào pessimísta: e o terceiro. o mesmo com a visâo moderada. O professor atuará como mediador do debate.
2. Recorte fotos de jornais e revistas e ilustre as principais idéias evpostas no texto de hneller (Leituras Complementares>.
3. Discuta com os colegas o tema: "Tecno(ogia como sinónimo de cultu­ra". L'til'sze como apoio o texto de Vargas citado ao longo do capitulo e o texto de Schaff (Leìturas Complementares ).
y. Assista ao filme Invasão de privacidade (Philip T~ovce, 1994 > e discuta-o em classe. consìderando o que foi exposto no capítulo.
~. .Analise e comente a composiçâo Do,Japàv. de Gilberto Gil.
(. Selecione em um jornal ou revista a notícia sobre algum avanço tecno­lógico. Depois. comente os benefícios e riscos dessa inovaçào.
". Em um livro lancado em 1990, ~fegateüdências 2000. os analistas norte­americanos Iohn \aisbitt e Patricia Aburdene enfocam as tendências de mudanÇa. Existe um daro tom otimista apontando para o início de uma nova conscientizaçâo em que as pessoas se preocuparào mais com a qualidade de vida. Discuta isso com seus colegas.


(*) SOUZA, Sonia Maria Ribeiro de. Um outro olhar: filosofia. São Paulo, FTD, 1995.


FACED/UFBA
Educação e Tecnologias
Contemporâneas
Prof. Menandro Ramos